quinta-feira, 25 de julho de 2013

Capítulo 19 - Como dói a dor da saudade...

(Ruben)

Pensei no que poderia fazer para me aproximar, que estratégia usar para entrar de mansinho no mundo deles, e de repente uma ideia surgiu… Nada de especial, apenas uma mera casualidade, mas com certeza que seria eficaz.
Jornadeei entre outras tantas mesas que permaneciam ocupadas, e passei de propósito nas costas da Joana, e foi aí que a minha jogada foi lançada… simples e incontornável.

- Desculpa, podes chegar a cadeira um pouco para a frente, para eu passar? – inquiri-lhe sem deixar que ela me tivesse visto antes, mantendo-me retido num curto espaço que separava duas mesas, espaço o qual eu não tinha como passar se ela não fizesse o que lhe pedira

- Ruben… - deve-me ter reconhecido pela voz, essa de certo que fora a única razão para ela olhar para trás e me encontrar tão facilmente como eu desejava

Joana olhou para mim e sorriu timidamente, não sei se pela surpresa de me ver ou pelo constrangimento que lhe poderia causar à frente do seu novo namorado, que por educação e tal como ela, se levantou a seguir.

- Joana…! Olá… - fingindo que só naquela altura a estava a ver, também os meus lábios se contraíram num sorriso, somente oferecido a ela, pois este foi-se desvanecendo tenuemente ao olhar para ele – Por aqui? Que coincidência… - “Que coincidência? Que coincidência!? Uau, Ruben, que inteligente… não sabias ter dito nada melhor?” – Já há algum tempo que não nos víamos… Vieste passear, foi? – perguntei, tentando formar assunto que prolongasse a conversa, e não evitei lançar um olhar despojado na cara dele

- Ah… Sim, vim… Agora com a faculdade tenho que aproveitar todos os furinhos que tenho para relaxar um pouco.

- Fazes bem… É bom ver-te! – “e é bom que comeces a dizer alguma coisa de jeito e tires esse sorriso parvo da cara, antes que ela desconfie da ‘coincidência’ ” – Ah… Eu estou cá com a Inês, ela quis vir às compras e eu vim tomar um café a fazer tempo para ela chegar. – a segurar o tabuleiro apenas com uma mão, a outra remexeu nervosamente os cabelos do topo da cabeça… não que tivesse que justificar a minha ida ali, mas continuava a querer prolongar aquele momento o mais que pudesse

- Hum… E como é que estás…? Estás bem? – perguntou-me afavelmente, na sua educação e simpatia do costume, fazendo-me querer que a última vez que estivéramos juntos era já passado para si e não havia mais ressentimentos, um episódio que por ela já tinha sido esquecido, morto e enterrado, e que por nós era o assunto proibido que não voltaria a ser tocado

- Sim, estou… E tu? – parece que agora os papéis tinham sido invertidos… ela parecia estar bem melhor do que eu, rejuvenescida da maior desilusão que lhe poderia ter dado, e eu estava lá em baixo, bem no fundinho a pagar a minha própria factura

- Estou bem também… Muito atarefada com as aulas e com alguns trabalhos que entretanto vão surgindo, mas sim, estou bem. – falou calmamente e sem deixar que a voz lhe quebrasse uma única vez, mas eu conhecia-a tão bem que consegui vê-la tentar alçar uma fortaleza em redor da sua postura de mulher inquebrável que já não era a primeira vez que lha distinguia pelas situações em que se sentia menos confortável, como imaginava ser aquela, e aquela situação encobriu-se por uma ténue névoa de silêncio, que felizmente foi soprada e arrastada para longe alguns instantes depois – Queres sentar-te connosco enquanto esperas pela Inês ou…? – sim, era mesmo aquilo que eu esperava e queria… “yes!”

- Eu não quero incomodar… - induzi logo depois, para proteger o meu pequeno disfarce, não querendo parecer intrometido   

- Não, nada disso… Não incomodas nada. Senta-te e bebe o teu café antes que fique frio. – pediu-me e eu apenas lhe agradeci num aceno cordial da cabeça encimado por um novo sorriso, mas antes de me sentar e juntar-me a eles, uma outra coisa teria de ser feita primeiro

- E… Não nos vais apresentar? – sugeri ingenuamente, referindo-me ao seu companheiro que ainda não se havia pronunciado uma única vez

- Ah… Claro que vou, claro… Desculpem! – ficando visivelmente atrapalhada, Joana seguiu com as apresentações – William, é o Ruben… Ruben, é o William, um amigo meu de Nova Iorque que está cá a passar uns dias. – um amigo, dizia ela… um amigo! 

- Prazer, eu sou… Eu sou um amigo e o futuro afilhado de casamento da Joana. – não lhe ia dizer que era o ex-namorado dela, essas eram águas passadas que não voltariam a dobrar pelos mesmos moinhos, e causar desconforto e criar um ambiente pesado entre nós, era algo que eu não queria fazer

- Eu sei quem és… Prazer em conhecer-te pessoalmente. – as nossas mãos cumprimentaram-se num abano breve no ar, sentindo-o apertar-ma com uma firmeza correcta que apoiava a sua insinuação, o que me levou a crer que eu estava em desvantagem ali… ele sabia mais de mim do que eu sabia dele

Mas… Claro! Como é possível eu não me ter lembrado antes? Era natural a cara dele não me ser estranha, e não só daquelas paragens… Eu já o tinha visto antes, há uns meses atrás, em São Francisco! Era de lá que o conhecia. Recordo-me de o ver no corredor do hotel ao pé da Joana, e daí eu ter-lhe perguntado mais tarde por ele. William era o ex-namoradinho de Nova Iorque, aquele que ela dizia ser agora “um grande amigo”… Sim, amigo, claro… está-se mesmo a ver!
O facto de lembrar que eles já tinham partilhado muito mais que a amizade, e que agora estavam ali, de volta juntos, despertou-me para uma sensação que eu já não sentia há algum tempo… Algo fez crescer em mim uma cólera ténue e quase inexpressiva que me fez sentir ameaçado… E eu conhecia aquela sensação, conhecia muito bem até… Ciúmes? Não. Não. Ah… Talvez. Ok, não queria ter de admiti-lo, mas o que estava a sentir eram definitivamente ciúmes… muitos ciúmes.

- Então, William… Estás cá a passar uns dias, é? – apelando à descontracção e informalidade entre nós, meti conversa com ele enquanto bebericava o meu café

- Sim… Já há alguns anos que não vinha cá e resolvi tirar umas férias para matar saudades de casa, e da Joana também… - ele olhou-a cúmplice, o que só me deu vontade de… nem sei de quê

- Mas és de cá? Como é que foste para Nova Iorque?

- Foi há pouco mais de cinco anos… A sede de advogados do meu pai mudou-se para lá e eu e a minha mãe fomos com ele, entretanto fizemos vida lá e deixámos de vir a Portugal com tanta frequência. – pois, mas agora ele tinha uma boa razão para vir cá mais vezes, um motivo perfeito que preferia mil vezes que ele não tivesse

- E posso perguntar como é que vocês se conheceram? – sabia que já estava a entrar em terreno perigoso de areias movediças, e só esperava não me afundar nelas pelo rumo da conversa que eu mesmo estava a dirigir, porém William não mostrou problemas em me responder

- A mãe da Joana e o meu pai eram colegas, e foi através deles que nos conhecemos… Para além disso frequentámos a mesma faculdade.

- Hum… E a partir daí ficaram muito próximos, dá para ver… - insinuei num tom leve de ironia, que penso ter sido discreto o suficiente para eles não terem notado

- É… Acho que simpatizámos logo um com o outro na nossa primeira conversa, então…

- E essa amizade chegou alguma vez a evoluir?

- E que tal se falasses agora de ti, Ruben? – impedindo-o de responder à última questão que coloquei, a Joana apanhou-me totalmente desprevenido na sua intervenção, que me deixou sem saber o que dizer

- Falar… de mim? – engoli a seco, quando notei que a minha própria jogada de repente tinha sido virada contra mim

- Sim. – ela sorriu num jeito de claro desafio e sobre a mesa vi-a cruzar os braços – O Will já te falou um pouco sobre ele, porque é que não lhe contas alguma coisa sobre ti? Tenho a certeza que ele também gostava de saber…

- Pois, eu… Bem, eu… - na procura de palavras que acabariam por nunca chegar, dei graças a Deus por o meu telemóvel ter vibrado no bolso naquele exacto momento, indicando-me uma chamada recebida que me fez fugir à situação que eu não tinha como enfrentar, por uma unha negra… pedi-lhes licença e atendi ali mesmo – Diz, amor… - falei quando vi que era Inês, e não evitei olhar de relance Joana, que tive a plena certeza pela sua expressão facial, ela ter ficado incomodada pela maneira como atendi o telefonema

- Já fiz as compras, amor… Onde estás?

- Estou numa mesa junto ao café, consegues ver-me mal entrares na restauração… - informei, não tirando os olhos dela, que mesmo estando a fixar outro ponto que não era o meu rosto, eu sabia estar atenta à conversa – … Se for preciso eu faço-te sinal.

- Está bem, então eu vou já ter contigo… Até já, beijinho. – após uma troca rápida de palavras ela despediu-se e eu fiz o mesmo

- Até já. – desliguei a chamada com um sorriso que acolhi apenas no intuito de a fazer vê-lo, e voltei a guardar o telemóvel no bolso

- Era a Inês? – embora soubesse muito bem que se tratava da Inês, ela não se conteve em perguntar, o que de certo modo até me deu algum gozo pois afinal, nem tudo entre nós eram águas passadas, como eu chegara a pensar

- Sim, era… Ela já vem aí.

Desde então o tempo que correu pela espera da Inês, foi nada mais do que preenchido pelo silêncio. Nem um nem o outro voltaram a pronunciar-se para dizer o que fosse, e sem eu também saber o que dizer, acabei de beber o meu café e arremeti-me ao conforto do silêncio que tapou as nossas vozes mas não os nossos olhares, e o meu perdeu-se por minutos pelo mais belo rosto que eu alguma vez vira, recordando-me da delicadeza e perfeição de cada traço adornado.
Meu Deus, como ela era linda, e mesmo ali tão perto, sentada bem na minha frente, obriguei-me a esconder a tentação de voltar a tocar-lhe… As suas mãos, o seu rosto, o cabelo, os lábios, o corpo… Quanto mais a olhava, mais o desejo de querê-la para mim, aumentava, e maior era o meu esforço em resistir-lhe.

- Aqui estou eu! – a chegada da Inês nas minhas costas, fez-me desviar repentinamente o olhar que mantinha discretamente preso a cada gesto e movimento de Joana, para depois remontá-lo sob a figura da minha futura mulher – Não sabia que estavas com a Joana, amor…

- É… Nós encontrámo-nos aqui e ela convidou-me para sentar…. – vi-as sorrirem uma à outra e a cumprimentarem-se seguidamente com dois beijos no rosto, e apesar de terem tentado disfarçar, deu para sentir alguma tensão entre elas

- Eu a ti acho que não conheço… - completamente alheia à timidez que não tinha, Inês dirigiu-se a William, a fim de também o cumprimentar e estabelecer ela mesma um apresentação entre os dois – Eu sou a Inês, a noiva do Ruben…

- Prazer em conhecer, sou o William, sou…

- É o namorado da Joana! – enunciei numa só expiração, sem pensar duas vezes e sem saber bem porque o fiz

- O quê? Não, nós não… - a Joana tentou interpor-se mas foi Inês, que apoiada pelo meu dito, roubou para ela a sua vez de falar

- Namorado? Que bom… Porque não o levas ao casamento? Gostava que nos conhecêssemos melhor.

- Não, mas o William não é o meu namorado, ele é só meu amigo e está cá de passagem… Este fim-de-semana ele vai voltar para Nova Iorque. – explicou tão claramente quanto conseguiu, desfazendo o mal entendido que eu próprio tinha suscitado… precipitadamente

Não era namorado… Eu ouvi bem, não ouvi? Eles não namoravam? Então ela não tinha ninguém, ela não tinha seguido em frente, não se voltara a apaixonar por outro homem…
Não sei como consegui engolir um sorriso que queria tanto mostrar, é verdade que se estávamos separados a culpa era única e exclusivamente minha, e que eu queria apenas a felicidade dela independentemente da longevidade que esta estivesse da minha, mas fiquei tão contente por saber que ela ainda não tinha encontrado ninguém, que por instante até me senti um pouco egoísta mas incrivelmente bem.

- Oh, que pena… - manifestou-se Inês ao tomar o lugar do meu lado

- Desculpem, eu pensei que… - apresentando-me redimido pelo desconforto que ali poderia ter causado, apressei-me a perdoar a minha imprudência, que no final de contas me oferecera um alívio enorme por estar errada – Bem, não são namorados mas já foram…

- A sério?

- Sim, mas agora somos só grandes amigos. – respondeu William a Inês, afastando todas as dúvidas que pudessem ainda existir quanto à relação actual deles

- E o que é que aconteceu?

- Ruben… - pela minha intromissão e curiosidade inconveniente, Joana advertiu-me, esperando que eu acabasse com aquela conversa o quanto antes por esta estar certamente a incomodá-la

- Joana, está tudo bem… Estamos só a conversar. – mostrando-se mais calmo e disponível para continuar a responder, ele esclareceu-me quanto àquilo que eu mais procurava saber…  embora continuasse a ter noção de que aquele assunto não tinha mais nada a ver comigo, a partir do momento em que decidi fazer a maior asneira da minha vida, e deixá-la – Nós chegámos a namorar durante algum tempo mas depois apercebemo-nos que não era aquilo que queríamos. Tínhamos uma amizade bonita e forte, tal como temos agora, somos como irmãos e percebemos que ao entrarmos noutra relação só estávamos a misturar as coisas…

- O que não é para ser, não será… Não é? – inquiri, abrindo a garrafa de água que tinha trazido juntamente com o café, e sorri-lhes mesmo antes de dar o primeiro gole

- E com isto tudo, ainda bem que te vejo, Joana. – talvez para dissipar o segundo sentido e a ideia que involuntariamente eu atribuíra à minha última interjeição, e que me esforcei para que ninguém para além de mim, entendesse, ouvi a Inês mudar de assunto

- Ai sim? – mostrando-se mais surpreendia do que eu pelo comentário, a Joana entrou prudentemente na conversa dela

- Sim. Queria tratar contigo alguns pormenores do casamento… Como madrinha do noivo tens de estar a par de algumas coisas. – falou no seu entusiasmo do costume, sempre que se referia ao nosso “grande dia” – Já tens o teu vestido?

- Não, ainda não está pronto, tenho-o num estilista mas em princípio para a semana já posso ir buscá-lo.

- Óptimo, depois se não te importares gostava de vê-lo… Tenho que me redigir pela paleta de cores que vamos usar e gostava que me desses uma pequena ajuda na decoração, sei que tens jeito para isso, e já que com o Ruben eu não posso decidir nada porque ele não tem o mínimo de gosto para estas coisas.

- Claro, é quando tu quiseres… - ao contrário do que eu cheguei a pensar, ela disponibilizou-se inteiramente para a ajudar, o que significava que provavelmente tínhamos um novo encontro marcado para bem mais cedo do que esperávamos

- Então talvez seja melhor um dia destes passares lá por casa, almoçavas ou jantavas connosco e davas-me uma mãozinha, se não te importares.

- Vocês já estão a viver juntos? – impondo ali uma pergunta que não estava planeada ser feita, a Joana conseguiu recolher toda a minha atenção para ela, quando me desprendi um pouco da conversa delas e me concentrei nas mensagens que começara a trocar pelo telemóvel com o meu irmão

- Sim, estamos no apartamento do Ruben, mas só por enquanto… Quando voltarmos da lua-de-mel começamos a procurar casa.

- Que bom. – ela mostrou um sorriso sem qualquer cor, e eu vi no olhar dela que tinha ficado desconcertantemente entristecida, conhecê-la como a palma da minha mão, tal como ela me conhecia tão bem a mim, permitia-me distinguir-lhe em pequeninos detalhes e expressões que ela fazia e que ninguém era capaz de descodificar, a não ser eu, e deu para ver muito bem que na contracção dos seus ombros e cerrar ligeiro de pálpebras, que ela tinha ficado ligeiramente ciumenta

Na nossa relação, fui sempre eu quem teve mais ciúmes… Era o mais ciumento de nós os dois e ai de outro homem que ousasse aproximar-se com segundas intenções ou olhar com outros olhos, a minha menina. Até quando não tinha motivos suficientes que o justificassem eu era ciumento com ela, o que posso dizer? Era mais forte do que eu.
Lembrei-me de algumas discussões palermas que tivemos à custa disso e da melhor forma como elas acabavam, de todas as zangas que nos faziam voltar costas e da maneira como esquecíamos o orgulho e lhes púnhamos um fim… Discutirmos recompensava com algo maior: as pazes. Era sempre tão bom quando fazíamos as pazes, e só por isso já valia um pouquinho a pena arreliarmo-nos de vez em quando um com o outro. Tudo era pretexto para nos conhecermos melhor… Os momentos mais felizes, os menos felizes, as brincadeiras, as confissões que não partilhávamos com mais ninguém, os pequenos defeitos que só eu lhe conhecia e faziam dela a minha namorada.

- Do que é que te estás a rir, amor?

- Ãh? Nada… - apanhando-me a sorrir por aqueles pensamentos que ainda vagueavam na minha cabeça, tentei disfarçar – … estava só a pensar numas coisas.

- E nós? Vamos embora? – promulgou Joana, numa pergunta unicamente dirigida a William

- Se quiseres ir…

- Já vão? – entrevi numa só vez enquanto já os vi-a levantarem-se, não queria ter que deixar de vê-la agora... tão rápido

- Sim, ainda tenho umas coisas da faculdade para fazer e já está a ficar tarde…

- Foi um prazer conhecer-vos… Até a um dia destes. – William despediu-se de nós, sem ter como antever um novo reencontro

- Prazer em conhecer-te também… William, não é?

- É sim.

- Se no final do ano voltares cá a Portugal, fala com a Joana e vai também ao casamento, gostávamos de te voltar a ver. – gostávamos? que não falasse por mim, o meu gosto em voltar a vê-lo não era nada acrescido, muito menos se fosse ao lado da Joana

- Muito obrigado, se vier lá estarei… Boa tarde. – tal como ele a Joana também se despediu em palavras e com um leve sorriso que eu pude jurar ser quebradiço

Quando contornaram caminho para a saída, vi-o chegá-la mais para si, contornar os ombros dela com um braço e beijar-lhe cuidadosamente o topo da cabeça. Ele tinha-a segura na sua alçada e eu invejei-o por não ser eu a estar no seu lugar… um lugar privilegiado que eu jamais voltaria a ter.




***



(Joana)

Voltar a ver o Ruben apenas serviu para duas coisas: recordar a dor e a mágoa que ainda sentia por tê-lo perdido, e ter a mais plena certeza de que ainda o amava.
Se ele me tivesse encontrado sozinha, estou certa de que não aguentaria, a muralha que andara a construir em redor dos sentimentos que tinham gravado o nome dele, depressa se desmoronaria com uma palavra sua, com um olhar seu… Mas felizmente William estava a meu lado não me permitindo vacilar por um momento que fosse. Se magoou voltar a estar com ele e ter de manter aquela distância entre nós? Claro que magoou, mas mais nada poderia fazer-me sentir pior, e dali para a frente a minha vida só poderia melhorar, o tempo constituía uma ajuda preciosa que aos poucos me mostrava o outro lado de viver… Sem o Ruben.

- Estás bem? – procurou assegurar-se William, ao entrarmos no elevador para descermos até às garagens

- Sim, estou… Obrigada. – consenti com um sorriso ameno, benfeitor do momento anteriormente vivido e ultrapassado… quase

- Não estavas à espera de o ver, pois não?

- Não, não estava nada à espera… Sabia que mais tarde ou mais cedo um reencontro seria inevitável, mas não agora… Ainda não estava preparada.

- Eu sei, basta olhar para ti para perceber que esta situação te deixou em baixo… Ainda o amas, não amas?

- Amo, amo-o muito. – a minha voz proferiu o que o meu coração temia tanto em demonstrar, sabendo ele que guardava um sentimento que tinha tanto de grandioso como de errado – Nunca pensei que doesse e custasse tanto, esquecer uma pessoa.

- Não é uma pessoa qualquer… Custa sempre esquecer quem amamos. – ele puxou-me mais para si, mantendo-me sobre o amparo do seu braço que me acolhia, abonando o seu apoio incondicional enquanto estivesse perto de mim e me pudesse proteger – Reparaste no clima que ia entre vocês antes da Inês chegar?

- Que clima? – perquiri, quando saímos do elevador e tomámos caminho no piso das garagens

- Joana, por favor, não me digas que não reparaste! – ele travou repentinamente a nossa marcha e colocou-se à minha frente – Ele não tirava os olhos de ti!

- Ai sim? E então? – tal como devia fazer, não quis dar importância ao que ele tinha dito, até porque era um tremendo disparate

- E então?! Isso significa alguma coisa, não achas?

- Não, não significa absolutamente nada… O que eu acho é que interpretaste muito mal o que viste, Will!

- Será? – as suas sobrancelhas contraíram-se num único movimento desdenhoso que só serviu para causar mais incertezas em mim – Eu vi muito bem a maneira como ele olhava para ti, como te observava cuidadosamente, aliás, só um cego é que não vi-a! Já para não falar do ataque de ciúmes…

- O quê? Mas que disparate estás para aí a dizer? – achando-o completamente senil pelas evidências excessivas a que se referia, mostrei despreocupadamente a minha indignação por estar a ouvir aquele discurso… um absurdo

- Joana, não é nenhum disparate, e desculpa se com isto te estou a dar algum tipo de esperanças, mas a verdade é que o Ruben marcou muito bem a sua posição, deixou bem claro aquilo que sentia em relação a ti e à vossa situação…

- E que é…? – perscrutei, dando-lhe permissão para se esclarecer devidamente, apenas para não deixar o assunto que ele próprio iniciara, em pontas soltas

- Tu viste! A enxurrada de perguntas que ele fez sobre nós, meu Deus, ele fez-nos o interrogatório todo… Como nos tínhamos conhecido, o estado da nossa relação, tudo! E a expressão dele, bem… Podia ler-lhe nos olhos e nos punhos uma vontade nítida de me pegar pelo colarinho e me atirar contra uma parede!

- Ok, agora estás a exagerar! – era o que eu queria acreditar, que o que ele dizia era de facto um exagero, pois se entrasse na conversa dele e lhe desse ouvidos, facilmente ele me persuadiria e faria vacilar perante um amor que eu queria tanto mas tanto esquecer

- Achas? Achas mesmo que estou a exagerar? Tu conhece-lo melhor do que eu…

- Pois, exactamente, eu conheço o Ruben melhor do que tu e… - antes que contradissesse as clarividências que ele insistia e que eu mesmo sabendo que tinham um fundo de verdade, ignorava a todo o custo, ele quebrou o meu discurso

- Então, Joana… Não preciso de dizer mais nada! Lá no fundo tu sabes que o que eu digo é verdade, apenas queres fechar os olhos a isso, e sinceramente eu não te censuro porque só estás a evitar sofrer mais, mas a mim pareceu-me que ele ainda não te esqueceu…

E eu não o tinha esquecido a ele, e para falar a verdade temia a porção de tempo que levaria para fazê-lo, isto para não por em causa a incerteza se algum dia o esqueceria completamente.
A minha cabeça começou à roda e em milionésimas de segundo senti-me totalmente perdida ali como uma pequena agulha num palheiro. Quando retomei o andamento e passei na frente de William, senti uma lágrima ameaçar a linha de água do meu olho, mas impedi rapidamente de se precipitar, limpando-a com a falange do meu indicador, e de repente aquela vulnerabilidade e nostalgia de que eu andara a fugir, regressou com toda a força e fúria.

- Já não sei onde deixei a porcaria do carro! – praguejei num tom de voz incrivelmente austero, enquanto deixava embater pesadamente os saltos altos contra o piso, olhando em todas as direcções

- Joana, espera… Tem um pouco de calma. – dando uma leve corridinha para me apanhar, voltei a dar pela presença de Will que seguia nas minhas costas e entretanto se juntou a mim lado a lado – Queres que leve eu o carro? – apercebendo-se de que eu estava demasiado nervosa para conseguir pegar no volante, ele ofereceu-se para conduzir e levar-nos a casa, o que não tinha como lhe recusar… se pudesse não lhe daria essa tarefa, mas sentia-me tão sem forças que não consegui dar-lhe um não

- Por favor… - concordei num fio de voz, voltando a abrandar o passo para começar então a procurar pelas chaves e pelo ticket do parquímetro, dentro da minha mala

- Bolas, tenho que voltar lá dentro… - inesperadamente, e enquanto ainda remexia o interior da mala, a voz inconfundível de Inês perfurou a atmosfera que eu era ainda envolvida e com a deslocação do meu queixo que se ergueu, o meu olhar embateu na figura de um veículo posicionado somente a uns metros de mim, o qual eu fazia a distinção perfeitamente bem e que pertencia a Ruben… conheci-o pela matrícula

- Então? – depois foi a voz dele que ouvi e toda eu petrifiquei, ao perceber que eles caminhavam nas nossas costas e se aproximavam cada vez mais

- Esqueci-me de trazer uma coisa que a minha mãe me pediu para lhe levar, tenho que ir comprá-la num instante…

- Queres que eu vá contigo?

- Não, não é preciso… Espera-me no carro, eu não demoro. – quando acabei de ouvi-la e sem mesmo olhar para trás, dei conta de ela se voltar a afastar para retomar aos interiores do Centro Comercial, e aí aumentei o ritmo da minha procura, pois o meu coração ressentiu a aproximação perigosa do seu verdadeiro dono, que continuou a caminhar na direcção do seu carro que me tinha por demasiado perto

- Joana? – oh não… oh não, ele reconheceu-me até de costas e chamou por mim, o que é que ainda queria? as minhas mãos começaram a tremer exasperadamente mas pude suspirar de alívio ao encontrar finalmente o que procurava para poder sair dali

- Eu vou pagar o parquímetro! – retirando-me o ticket da mão, vi William a lançar uma rápida olhadela que imaginei atingir o perfil de Ruben e preparou-se para me deixar sozinha

- Não, Will, não te vás embora… – implorei-lhe num sussurro desesperador, ao colocar a hipótese de travar mais um momento com Ruben, agora só nós dois e desta vez sem ninguém a apoiar-me – Não me deixes aqui, por favor!

- Joana! – ele voltou a chamar por mim e senti-o cada vez mais perto, mas não consegui rodar o pescoço para trás e olhá-lo, simplesmente não consegui

- Vou dar uma volta para encontrar o carro e espero-te lá… Até já! – com um sorriso ele deu-me um beijo na face e iniciou de novo uma corrida que o fez desaparecer entre outros carros… eu sabia porque é que ele estava a fazer aquilo, eu sabia, mas preferia que não o tivesse feito, deixar-me ali à mercê da confusão dos meus sentimentos bem como daquele por quem eu os detinha, poderia ser fatal

- Não me ouviste chamar-te…? – e lá estava ele, de novo perto de mim, como se um enorme íman nos obrigasse a manter-nos perto um do outro

- Ah… Sim, ouvi, desculpa… - sem saber o que mais podia dizer, mostrei um sorriso frouxo que rapidamente me denunciou a falta de atitude

- Tenho uma coisa para te dizer que me esqueci de te contar há pouco… - também nos seus lábios um sorriso surgiu, e tomando manobra de visão total sobre o corpo dele, vi-o recolher ambas as mãos nos bolsos traseiros das suas jeans, que devo dizer, lhe assentavam nas pernas perfeitamente bem

- Diz, então… - permiti, contudo receando no meu âmago o que poderia ouvir  

- O meu sobrinho, o Gabriel… Ele já nasceu. – anunciou, alargando a curva dos lábios para uma amostra de felicidade maior

- A sério? O Gabriel já nasceu? – aquela onda de alegria pela então boa-nova, arrastou-me a mim também, deixando-me os olhos a brilhar pela enorme felicidade que os recentes pais e a restante família deveriam estar a sentir

- Hum, hum! Nasceu na semana passada…

- E correu tudo bem? A Paula e o bebé estão bem?

- Estão óptimos… Felizmente correu tudo bem, sem complicações. – muito naturalmente ele começou a caminhar na direcção do seu carro, e não sei bem porquê eu acompanhei-o, enquanto ladeados um pelo outro dávamos prosseguimento à conversa que então iniciáramos, e pelo meio não evitávamos em olhar-nos brevemente

- Que bom, parabéns! – não pude deixar de felicitá-lo, afinal tratava-se do seu sobrinho… aquele que deveria ser nosso, mas o destino não o quis assim

- Devias vê-lo, é um rapagão lindo… E tem traços meus, indiscutivelmente!

- Estou a ver que estás um tio babado…

- Nota-se muito?

- Hum… Só um bocadinho. – não sei como tive a capacidade de fazê-lo, mas brinquei com a situação, e ambos nos deixámos rir

Devagar devagarinho, estávamos a conseguir ter uma conversa apazigua, sem mágoas nem ressentimentos, apenas nós a comportarmo-nos como dois adultos que tinham um passado muito forte em comum e que agora confrontados, aprendiam a lidar com ele da melhor forma possível.
Quando chegámos junto do carro dele, deixámo-nos ficar, a razão dizia-me para me despedir e ir embora, mas o coração pedia-me para ficar só mais um pouco. Um silêncio mórbido meteu-se no meio de nós, e ainda que tivéssemos tentado esconder, a falta de assunto estava a deixar-nos ligeiramente envergonhados… Como se nos tivéssemos acabado de conhecer e não havia nenhum tema em trivial que sustentasse aquele nosso contacto, mas este acabou por chegar ao fim de algum tempo, e por parte dele.

- Joana… - notei alguma hesitação na sua voz, algo que me queria dizer mas faltava-lhe a coragem, penso eu

- Sim? – tentando dar-lhe o impulso que provavelmente ele estaria a precisar para continuar, mostrei-me disposta a ouvi-lo

- Ah… Sobre aquela noite, eu queria pedir-te muita desculpa por…

- Ruben, não… - ali estava a parte difícil, aquela pela qual eu temia por eventualmente poder ser recolhida a um diálogo e a uma posterior discussão, mas ela acabou por chegar e eu não queria ter que alongá-la por muito, pelas razões óbvias – Esquece, não te preocupes com isso, a sério…

- Mas eu não agi bem contigo e eu sei que voltei a magoar-te…

- Se eu me voltei a magoar, foi porque eu deixei. – e pronto, foi daquela maneira que principiamos a conversa mais difícil da minha vida

- Eu não tinha o direito de fazer uma coisa daquelas, e eu juro-te que não foi com a intenção de nos envolvermos, que te procurei… - eu acreditava nele, tinha a sinceridade escrita nos seus olhos – Tudo o que eu te disse naquele bilhete, eu queria tê-lo dito olhos nos olhos, foi por essa razão que eu fui a tua casa, mas quando te vi…

- Temos mesmo que falar sobre isto, Ruben? – intervim numa inquirição de puro desalento, apenas para evitar a suscitação de novas amarguras entre nós

- Temos… Se não falarmos sobre isto eu acho que vou sufocar.

- Mas… - o seu toque arrepiou-me da cabeça aos pés, impedindo-me de continuar a falar, a sua mão tocou suavemente a minha face e toda uma mescla de sentires enrolou-me numa onda enorme deixando que quase me afogasse nela

- Olha para mim, Joana… Olha para mim… - ele aproximou-se devagarinho, e vi-lhe um olhar tão triste que ilustrava claramente o seu estado de espírito – Odeias-me?

- Ruben, não digas isso… - tentei desviar o meu olhar do seu, mas novamente o seu toque não mo permitiu

- Eu preciso de saber… Odeias-me pelo que te fiz? Pelo idiota que fui?

- Já passou, vamos deixar as coisas assim.

- Eu não consigo… - um tom profundo e sentido arrastou-se até aos meus ouvidos, enquanto os nossos corpos se rendiam inconscientemente a uma aproximação demasiado arriscada - Eu fecho os olhos e oiço a tua voz, vejo-te a ti, vejo a maneira como te magoei… Eu não merecia o teu amor e tu não merecias estar a passar por isto.

- As coisas são como são, não há nada que agora possamos fazer senão seguir cada um com a sua vida e recordarmos apenas o que de bom ficou entre nós…

- Recordar as coisas boas magoa mais…

- E recordar as más vai acabar por corroer a felicidade que vivemos. – proferi numa certeza inconveniente, fazendo o meu olhar viandar pelas garagens que se encontravam praticamente desabitadas pela presença humana – Tu agora estás a construir uma nova felicidade e eu só quero o teu bem.

- Tu eras o meu bem… O mais preciso de todos.

- Mas deixei de ser…

- Por minha culpa, eu sei… - por um impulso que eu tomei, os nossos olhares voltaram a tocar-se e de repente, bem ali na minha frente, eu vi o Ruben… o meu Ruben que finalmente estava de volta, o Ruben por quem me apaixonei desde o primeiro momento – Desde o início que nós merecíamos ficar juntos…

- A vida não quis assim…

A vida não quis assim e restava-nos saber lidar com isso. Se havia algo que não poderia ser mudado, era o passado, que ilícito por um enorme pedregulho impedia-nos de demovê-lo ou alterá-lo para edificarmos um novo presente, um presente melhor, onde nós juntos pudéssemos construir os nossos planos que perfilhámos para uma vida a dois.
E tal como o passado não podia ser remexido, as palavras que foram ditas não podiam ser mudadas, os actos e os discursos de rompimento não podiam ser esquecidos, as lágrimas derramadas não podiam cursar os seus caminhos de retorno e o nosso amor já não podia ser vivido.

- Pede-me para deixar a Inês e eu deixo… - com o rosto bem perto do meu, ele apanhou-me completamente desarmada, pronunciando algo que nunca deveria ter dito em voz alta e muito menos a deveria ter equacionado em pensamentos, um pedido que tinha em vista uma recusa incontornável – Basta que me peças…

- Não, não… Ruben, não faças isso, por favor. – num sussurro trémulo, impedi-o imediatamente de dar continuação àquele tema totalmente descabido e desproporcional, remoto a uma conversa secreta, só nossa, que mais ninguém deveria ouvir – Nem tu, nem a Inês, nem as pessoas que apoiam o vosso relacionamento merecem aquilo que me estás a pedir… Eu não vou fazê-lo.

- Mas o meu coração está com outra pessoa… Ele está contigo, Joana, esteve sempre!

- Percebeste isso tarde demais, agora é tarde demais para nós… Vais ter de dar o teu coração à Inês, é ela a tua noiva, é ela a tua futura mulher!

- A minha mulher eras tu! Tu já eras a minha mulher… - pronunciou também num murmuro que nos obrigava a manter-nos muito perto para nos conseguirmos ouvir, e não sei dizer se aquela sua declaração me enalteceu o coração por ouvir o que eu mais queria, ou se o magoou ainda mais por ter a certeza que aquela frase foi conjugada no tempo certo: o passado que ficava lá atrás… bem longe e quase intocável

- Não digas isso, as coisas entre nós já estão difíceis de lidar que chegue… Ao dizeres isso só as pioras ainda mais.

- Mas eu só estou a dizer a verdade, Joana…

- Acho que devias guardar a verdade para ti, eu não tenho que ouvi-la… Já foi tempo, agora não é mais.

- Então o que é que eu faço? – o desespero de estar sem rumo começou a tomar conta dele, e implorava-me para que dissesse alguma coisa, para que fizesse alguma coisa, mas duvidei de ser eu a puder ajudá-lo

As lágrimas retomaram à nascente dos meus olhos, fazendo-me descair escassamente a cabeça e cerrar as pálpebras naquele instante, para obrigá-las a recuar e não cair. Eu já imaginava que aquela conversa não iria ser fácil de se ter, mas nunca àquele ponto, mesmo sem se aperceber, mesmo sem intenção, Ruben estava a colocar-me entre a espada e a parede e quanto mais ele falava mais o meu espaço de segurança se encurtava, deixando-me à margem de descambar por completo… Mas sabia que não podia descambar para braços dele pois estes acolhiam outra pessoa, e eu não podia reclamar o lugar que já não me pertencia, mas que Ruben me queria voltar dar e dizia ser meu por direito.
Mas não, eu estava decidida que nada mais entre nós iria acontecer, tudo iria ficar exactamente como fora deixado e como ele mesmo decidira ao destinar o seu futuro ao lado de outra mulher, mulher essa que ele já não tinha tanta certeza de o fazer feliz e por isso, e só por isso, prestei-lhe o conselho mais sincero que lhe poderia dar, embora que este pudesse vir a magoar outras pessoas.

- Se afinal chegares à conclusão que não é isto que queres, se a tua única opção é deixares a Inês, se não és feliz com ela, então deixa-a… Mas se isso acontecer, eu peço-te uma coisa… Não a deixes por minha causa.

- Mas porquê? Tu és a única razão… - a sua expressão suplicante fez-me contorcer de melancolia pelas adversidades que tínhamos sido obrigados a viver, e as quais não nos queriam ver juntos – Eu sei, eu sei que cometi contigo um erro tremendo… cometi connosco, eu sei disso, mas será que vou ter que pagar por ele durante toda a vida?

- Eu não te estou a pedir que sejas infeliz, Ruben, apenas não podes ser feliz comigo, só isso… Não podemos ser felizes juntos!

- Quem disse?! Já não há lugar para segundas oportunidades, é isso?

- Nós tivemos uma segunda, uma terceira oportunidade e para quê? Já olhaste bem para nós? Já viste onde essas oportunidades nos levaram? Olha onde estamos agora… - os meus braços condolentes de desânimo, ergueram-se ao lado do meu corpo para evidenciar a pleonasmo da nossa história, que trazia sempre o mesmo desfecho

Ele ficou ainda mais desconcertado do que já estava e com as mãos irrequietas a desembrenhar-lhe o cabelo, começou a andar em pequenos círculos, num vai e vem apoquentado pelo que fazer a seguir.   
Aquela conversa tinha uma única finalidade e finalmente percebi… Ruben queria voltar para mim, ele estava disposto a deixar tudo para trás, estava disposto a deixar a Inês para ficar comigo, procurava pelo meu perdão e pelo amor que ainda lhe tinha para começarmos de novo, e é claro que era aquilo que eu mais queria, era claro que eu queria voltar para junto do homem que mais amava no mundo, mas o querer tornou-se numa coisa tão banal que não era mais o suficiente para me fazer tomar uma decisão tão importante como era aquela. Por mais que difícil e custoso que fosse estar a abdicar daquele amor, agora era eu que não estava mais disposta a lutar por ele, já tinha doído que chegasse e o medo de me voltar a magoar era muito superior… Agora era tarde para nós, a nossa vez já tinha passado, e foi pena que não tivéssemos olhado para ela com mais atenção ao ponto de a agarrar-mos e nunca mais a deixarmos ir.

- Posso ao menos continuar a ver-te? – quando ficou mais calmo, ele voltou a aproximar-se a mim e segurou as minhas mãos nas suas, a fazer-me um novo pedido para o qual eu dei o meu silêncio profundo, de olhar estacado no chão – Joana, responde-me… Posso continuar a ver-te?  

- Eu não posso… Se te continuar a ver nunca irei conseguir refazer a minha vida.

- E eu nunca te deixarei… - um novo múrmuro dolente foi disperso entre os seus lábios, e num impulso por ele tomado o seu rosto achegou-se tanto ao meu que os nossos narizes e as nossas testas se tocaram, obrigando-nos a manter o tom baixo de voz e a fechar os olhos, enquanto a troca de palavras continuava

- E o que é que acontece se eu encontrar outra pessoa?

- Fico ciumento. – respondeu seguramente, permitindo que um rasgo de orvalho preenchesse os seus olhos quando os voltou a abrir, que então e tal como os meus, se encheram de lágrimas – Se eu pudesse mudava tanta coisa, tanta asneira que fiz…

- O passado não podes mudar… - referi em concordância com a mais pura realidade, e essa prendia-nos ali

As nossas testas não voltaram a separar-se e para prolongar ainda mais o momento, os nossos olhos tornaram cerrar-se numa palpitação conjunta dos nossos corações. O desejo de unirmos os nossos lábios era tão grande que conseguíamos até tocar-lhe, mas um beijo nosso não voltaria a ser colmatado, sabíamos que era errado fazê-lo, embora fosse o que mais queríamos.

- Amas-me? – perguntei-lhe num sopro conturbado que se deixou embater na superfície dos seus lábios, que não voltariam a conhecer o caminho até aos meus

- Irei amar-te sempre. – aquela resposta fez-me cair em mim, fez-me despertar novas comoções e deixar à mostra o meu lado apaixonado que ele detinha totalmente – Não chores, não aguento ver-te chorar… - solicitou quando nos voltámos a olhar, e os seus dedos recorreram ao instinto de me enxugar o rosto pelas lágrimas que o contornavam

- Tu também estás a chorar… - evidenciei vendo que não era apenas eu que me estava a deixar levar pela emoção… os olhos de Ruben também choravam, ele todo chorava, tanto por dentro como por fora, e quando caí na tentação de lhe tocar as faces, os seus lábios caíram na tentação de beijar os meus dedos quando estes se detiveram nos contornos da sua boca

- Estou a perder o amor da minha vida para sempre, é natural que chore por ele…

- Ai, Ruben… Abraça-me, abraça-me… - pedi quando não consegui aguentar mais e as lágrimas se intensificaram, caindo numa catadupa irreversível 

Os seus braços contornaram o meu corpo mal ele ouviu o meu pedido, puxou-me para si com uma veracidade tremenda, fazendo-nos abraçar num aperto tão forte e desmedido que tinha deixado de ser possível distinguir-se o começo e o fim dos nossos corpos de tão unidos que estavam.
A minha face acostou-se ao seu peito enquanto a sua cabeça ficou afundada na dobra do meu pescoço. Precisávamos daquilo tanto quanto precisávamos de respirar, e voltarmo-nos a separar era uma vontade que nenhum de nós partilhava.

- Detesto magoar-te… - a sua voz saiu abafada, e um arrepio percorreu-me a nuca por sentir a sua respiração forçada embater na minha pele

- Então porque é que o fizeste?

- Porque fui egoísta. Pensei que fosse ser mais feliz com ela…

- Mas não vais ser… Vais sentir a minha falta. Nenhuma outra mulher te amará tanto como eu te amo.

- Eu sei… - ele apertou-me com mais força para si, e senti toda a sua frustração por ter-me perdido, domar-lhe todo o corpo – Porque é que o amor só não chega?

Eu não tive que responder-lhe à pergunta, ele sabia a resposta.
O silêncio tomou as rédeas e apoderou-se então dos alicerces que sustinham a conversa e esta findou-se simplesmente, onde mais nada havia para ser acrescentado… Poderia não ter sido tudo dito, mas nenhumas mais palavras tinham a capacidade de enxergar no que ia nos nossos corações se não meros actos e gestos como aquele, que se deixavam falar por si. Senti-lo tão perto, sentir o calor do seu corpo, sentir o cheiro do seu perfume, quase me fez render aos caprichos do amor, mas fui mais forte que isso.
Mantendo-me amarrada em si, o peito dele sacudia-se em soluços do choro que não cessara e ao mesmo tempo que uma das suas mãos tomou o carinho de me afagar os cabelos, as minhas lágrimas mais controladas que as dele, continuaram a cair e a molhar-lhe o peito onde eu permanecia a escutar a arritmia descontrolada do seu coração padecente, até ter algo mais para escutar.

- Ruben… - a voz despertadora de Inês, soou a alguns metros de nós, fazendo o nosso sonho ser perfurado pela realidade

Ao contrário do que seria esperado, a presença dela não nos sobressaltou por demasia e a prova disso foi que levámos ainda alguns segundos para correspondermos à obrigação de nos soltarmos. Os nossos corpos afastaram-se, lentamente como não o querendo fazer e ambos a olhámos, estatuada também ela a olhar para nós, com a clara expressão de que alguém lhe devia explicar o que estava acontecer ali… E o que estava a acontecer era uma coisa simples de ser explicada, até… Nada mais do que uma história de amor a conhecer o seu final menos feliz.





Minhas queridas, mais um capítulo! :)
Espero que gostem e deixem-me as vossas opiniões, são muito importantes!

Um grande beijinho,
Joana


13 comentários:

  1. Tou sem reação com este capitulo....

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  2. AI... Tantas emoções!!
    isto cada vez está melhor, adorei a ciumeira do Ruben, mas AMEI a conversa no estacionamento! Amei.
    O Ruben vai desistir do casamento, eu sei que vai!! Ele tem de desistir!
    A Inês bem que pode perceber que está a mais depois do que viu.

    Gostei que o Will tivesse os deixado sozinhos :) Esperto!!

    Beijinhos

    Lisandra

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  3. Agora é que me matas-te... está de cortar...
    Já chorei... valhe-me o santo... tinhas de acabar o capitulo???
    Publica mais por favor.
    Adoro, adoro.
    Beijos.

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  4. Céus está demais... impossivel não ficar viciada.
    Publica rápido por favor.
    Beijo

    Adriana

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  5. Adorei este capítulo... o que será que acontece agora :O
    esperando ansiosamente pelo próximo!!!

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  6. Mas quando é que o Rúben tem uma atitude de homem e assume as coisas por ele, sem desculpas? Dizer à Joana que se ela lhe pedir ele deixa a outra? É preciso ter lata, fez a burrada que fez e agora precisa de uma desculpa? Não consegue simplesmente chegar ao pé da Inês e dizer-lhe " não posso casar contigo porque não é de ti que eu gosto, eu amo outra pessoa e tu mereces alguém que te faça feliz e essa pessoa não sou eu", isso sim era de homem.
    A conversa deles no estacionamento foi repleta de emoções, o William teve bem quando deixou a Joana sozinha com o Ruben, bendita a hora em que a Inês teve que voltar atrás. Estes dois se não fossem tão casmurros podiam estar juntos, mas não eles gostam de ir sempre pelo caminho mais difícil. Não acredito na última frase do capítulo, porque para mim a história de amor deles tá muito longe de conhecer o fim.
    Adorei, claro que gostava de os ver juntos, mas para isso preciso de mais capítulos, porque isto é viciante.

    Beijocas

    Fernanda

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  7. Espero que publiques rapido. Estou cheiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiia de saudades

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  8. Olha tenho muita coisa a dizer, primeiro, não há palavras para este capitulo. Venho todos os dias de manhã ver se publicaste.
    Não sabes a alegria que me dá quando escreves, porque consegues-me envolver na história de uma maneira que apenas nos meus livros favoritos acontece, choro com as personagens, sorrio com eles, tudo com elas.
    Obrigada por escreveres e espero que nunca desistas, teria um desgosto porque a tua forma de escrever é arte. Espero que tenhas percebido o quanto adoro os teus capitulos e te tenha motivado.
    Beijos,
    Alexandra (e Rute)

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  9. SOCORRO!!!!!
    Ai, meu coração. É muito pra ele...
    Comecei lendo o capítulo rindo, sim rindo do Ruben, do que ele fez para se aproximar e dos seus ciúmes - muito fofinho haha *-* - O episódio na mesa foi quase cômico, tirando a parte em que ele atendeu a Inês ''Diz, amor''?? Bleeeeeeeh -,-
    Mas o estacionamento... meu Deus... quando acho que você não pode mais me surpreender... se não existe perfeição isso aqui está muito perto dela. Chorei, ai como chorei. lool
    Mas agora quero saber como esse dia vai terminar... a Inês poderia se tocar de uma vez, não? Pelo amor -.- hahaha, continua, please!!

    Beijinhos :*

    Gabi

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  10. Continua, sim? Ansiosa pelo próximo... xD

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  11. OHH MEU DEUSSS!!!!
    perfeitoooooooo *.*
    continua!
    beijos

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  12. Para quando o proximo capitulo?? Isto está bom demais!!

    Beijinhos

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  13. magnífico!!! omg!!! ta emocionantd!!!! vi o teu site hj num blog d uma mga e agra smplesmente devorei tds os teus capitlos! e ja li o novo e pocha vida, sou tua nova fã!
    bj
    ju

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