domingo, 21 de julho de 2013

Capítulo 18 - Por mais distantes que estejam, ainda continuam perto...

O número dos dias do calendário era riscado sucessivamente, fazendo girar as folhas que praticamente de um modo imperceptível, a passagem do tempo fazia voar, e apesar de uma nova estação do ano já ter sido recebida há coisa de dois ou três dias, as temperaturas rigorosas do Verão ainda não tinham baixado, fazendo as delícias aos amantes de praia.
As aulas já levavam quase um mês de avanço, fazendo-me andar a um ritmo alucinante entre carradas de livros que tinha para estudar e trabalhos que faziam um peso extra na minha nota sumativa do semestre. Apesar de nos primeiros tempos ter sido difícil e um quanto doloroso tentar tirar Ruben da minha cabeça e principalmente do meu coração, agora poderia dizer que já não o lembrava com tanta frequência como dantes, e por isso também o poderia agradecer a William, que a passar umas férias em Lisboa, estava em minha casa há já alguns dias, e o seu apoio a mim tinha sido fundamental para fazer-me esquecer a tristeza e enfrentar a mágoa da perda com um sorriso, que me abria espaço a novos caminhos a percorrer no dia-a-dia.

- A sério que se eu estivesse mais cinco minutos dentro daquela sala, dava-me alguma coisinha má! – rabujou Bruna, minha colega de curso e amiga, aquando saíamos da faculdade

Vinha acompanhada não só por Bruna mas também por Madalena e Bárbara, que depois da última e única aula da tarde, nos dirigimos ao estacionamento para junto dos nossos carros, num ambiente divertido e descontraído de sempre, que entre o nosso grupinho era já bastante habitual. 

- Oh, não sejas assim… Eu até gosto de o ouvir falar… Ok, é um bocado chato, isso é, mas temos que lhe dar um desconto, como ele diz… Entusiasma-se a dar a matéria! – o meu reparo em relação ao professor que leccionava a cadeira de Direito e Processo Penal, fê-las perderem-se em gargalhas devido à expressão teatral a que dei uso

- E então, meninas… Têm planos para esta tarde? – perguntou Madalena, depois de acalmados os ânimos e fazendo-nos abrandar os passos antes de cada uma se dirigir ao respectivo carro

- Hum, hum, eu tenho! Vou dar um passeio com o Simão e depois ele vai levar-me a jantar…

- Ui, ui, estou a gostar de ver… Estamos tão apaixonadas, Bruninha! - Bárbara metera-se com ela levemente, espelhando a felicidade de um coração preenchido como era o de Bruna – Então e tu, Joana… O que tens pensado fazer esta tarde?

- A minha tarde vai ser passada com o nariz enfiado nos livros… Ainda tenho resumos para fazer e muito que estudar!

- Oh, a sério! Nós estávamos a pensar em ir dar uma voltinha juntas… - esclareceu Madalena, uma provável conversa anterior que havia partilhado com Bárbara

 - Não meninas, desculpem mas não vai dar… Tenho mesmo que estudar, já que este fim-de-semana não estou cá, tenho que aproveitar o máximo de tempo disponível… - esclareci calmamente, estabelecendo as minhas prioridades

- Ah pois é… Vais para Paris! Gente com sorte é assim!

- Muito engraçadinha, menina Bá… Mas para sua informação eu vou em trabalho! Por isso que tenho de estudar agora, não se esqueçam que temos frequência já para a semana, e além disso não quero deixar o William outra vez sozinho…

- O William? É aquele rapaz que está em tua casa, não é? Bem giro, digo-te já então!

- E bem comprometido também… Ele tem namorada, Madalena, por isso podes ir tirando o cavalinho da chuva!

- Eu só estava a dizer que ele era giro, não me quero casar com ele… - esclareceu atempadamente, fazendo suscitar novos risos – Mas então ele que venha também… Vá lá, Joana, não nos podes fazer uma desfeita dessas, para cortes já basta a Bruna que nos vai trocar pelo namoradinho… Anda lá!

- Pronto, ok… Ganharam! Mas não me quero demorar muito tempo por lá, combinado? – por tanta insistência delas, eu não teve outra solução em vista senão a de ceder, e no mesmo instante em que aceitei, o histerismo de alegria entre elas foi absurdamente cómico de se ver – E onde querem ir?

- Não sei… Podíamos ir talvez dar uma voltinha pelo Colombo, lanchávamos por lá e tal…

- Olha a mim parece-me uma boa ideia… - concordou logo Bárbara

- A mim também… Vou só a casa tomar um duche e pegar o William, e encontra-nos… Está bem para vocês?

- Sim, por mim tudo bem… - apoiou Madalena que foi acompanhada pelo aceno positivo de Bárbara – Daqui a mais ou menos duas horas?

- Hum, feito! – um sorriso intocável surgiu nos meus lábios no mesmo instante – Então meninas até já, e até amanhã pra ti, Bruninha! – despedi-me de todas com um beijinho que desprendi na palma da mão e depois soprei para o ar, começando a  afastar-me na direcção do seu jeep

Coloquei os óculos de sol na cara e entrei no carro, pronta para vinte minutos de condução, isto na melhor das hipóteses, pois se encontrasse o típico trânsito nas ruas de Lisboa, o tempo de estrada prolongar-se-ia muito mais.
Aquando de mãos ao volante, e a preencher a solidão de uma simples viagem, ocupei-me inteiramente dos meus pensamentos que me arrastaram para o enredo desfechado do meu mais recente desgosto de amor, que partilhara com – o agora já não meu – Ruben… E foi acompanha por eles que eu completei o  regresso a casa. 
Parece que foi um acaso da vida que nos juntou e foi o destino a separar-nos, talvez para nos mostrar que não fomos feitos para ficarmos juntos, foi bom enquanto durou, mas nada mais que isso. Se o amei? Sim, muito, e ainda continuava a amá-lo, todos os dias, mas todos os dias era um esforço que eu fazia para amá-lo um pouquinho menos.

- Will, já cheguei… Estás em casa? – assim que entrei em casa e enquanto retirava as chaves da fechadura, a minha voz avultada percorreu praticamente todas as divisões, procurando pela presença de uma única pessoa, que primeiramente não deu sinais de si

Pousei a mala juntamente com livros e um caderno de apontamentos, sob do aparador de entrada, e percorrendo o piso inferior procurei pelo meu amigo, que depois equacionara poder estar só mesmo no interior da vivenda, pela carteira e telemóvel dele que vi ao pousar os meus pertences no móvel.

- Will? – voltei a chamar por ele ao transpor o lado de dentro da sala de estar, que tinha as portas corrediças de acesso ao jardim, abertas

- Aqui fora! – respondeu ele num tom igualmente elevado, vindo do exterior que  acabei por enveredar, guiada pelo prenúncio daquela voz

- Ah muito bem… Estás aqui ao solinho! – disse-lhe eu com um sorriso nos lábios, ao vê-lo sair da piscina do jardim onde dera alguns mergulhos para fugir às temperaturas elevadas que se faziam sentir - Que rica vidinha! – brinquei, pegando na toalha estendida na relva para lhe dar

- Claro, aqui é que se está bem! – um sorriso de orelha a orelha foi exibido no rosto dele, abrindo já os braços pronto para me abraçar

- Não, nem penses… Estás todo encharcado! – impedi-o mesmo antes de ele conseguir chegar perto de mim,  e no lugar de um abraço, ficou um beijo que William me deu carinhosamente na bochecha – Hum… Assim está melhor. E como foi o teu dia? Sais-te?

- Sim, fui dar uma voltinha por aí, estive com velhos amigos… Foi bom. – proferiu sempre sorridente, os seus planos de tarde que terminaram aquando voltou a casa, falando enquanto enxugava o seu corpo à toalha – E o teu dia como foi? Aposto que foi bem mais entusiasmante e divertido que o meu…

- Sim, foi super divertido, nem imaginas! - não evitei em ironizar suavemente num simples e sofisticado revirar de olhos, que mostrou o desânimo e cansaço em cima dos meus ombros pelas horas e horas que passara na faculdade – Olha, tens alguma coisa para fazer esta tarde? Algo combinado?

- Hum… Não, não tenho. Já não estava a pensar voltar a sair de casa hoje… Mas porquê?

- Porque a Bá e a Madalena insistiram para que fossemos lanchar com elas ao Colombo, pensei que pudesses vir…

- Essas não são as tuas amigas que estiveram cá no outro dia a fazerem contigo um trabalho?

- Sim, são elas mesmo! – afirmei, relembrando sucintamente o encontro que eles já tinham tido, e por isso já se conheciam minimamente – Eu é só tomar um duche e já vou… E tu o que dizes? Vens também?

- Sim, pode ser, mas não vou já… Ainda quero descansar um bocadinho, depois prometo que vou lá ter com vocês.

- Pronto, tu é que sabes! Mas então não demores muito que eu não quero vir tarde para casa…

- Sim, não te preocupes… Podes ficar descansada. – William voltou a beijar-me desta vez na testa, e voltando a desprender-se da toalha que atirou de novo ao chão, desapareceu entre um novo mergulho que o fez afundar nas águas límpidas da piscina

Com um sorriso rejuvenescedor e acarinhado por ter ali consigo um dos meus melhores amigos, que me prestava um carinho e apoio condicional bem como apagava os meus momentos de maior solidão, voltei a recolher-me aos interiores da casa para me arranjar e sair o mais atempadamente que conseguisse.
Subi até ao meu quarto e foi na casa de banho que me desprendi em dez rápidos minutos de um duche fresco. Vesti uma roupa simples e igualmente fresca que seleccionei directamente do roupeiro e retoquei a maquilhagem em tons muito leves e discretos.
Quando voltei a descer encontrei William na sala ao telemóvel, e pela despedida que ainda ouvi de raspão antes de ele desligar, foi o suficiente para lhe desmistificar o sorriso imensamente belo que se apoderou totalmente das feições do seu rosto de homem feito.

- Ai, o amor, o amor… - suspirei ao sentar-me no sofá e ocupar o lugar vago ao lado dele

- Já estou cheio de saudades dela…

- Podias tê-la trazido…

- Oh, eu queria que ela viesse comigo, mas era chato ter de faltar às aulas logo no primeiro mês de faculdade...

- Pois, tens razão… Mas este fim-de-semana já estás de volta a Nova Iorque e vais poder matar as saudades todas! – disse animadamente de forma a despoletar-lhe outro sorriso, pela proximidade de tempo que ele tinha para voltar a correr para os braços da sua namorada

- É verdade! E tu sempre vais a Paris?

- Sim… Abalo quinta-feira depois das aulas e regresso no voo de domingo de manhã. – proferi, recordando o preenchimento da minha agenda de trabalho naquele fim-de-semana, que me faria conhecer a bendita cidade do amor pela primeira vez – Mas bem, é melhor eu ir andando antes que elas me chateiem o juízo por chegar tarde. Como é que vais para lá?

- Apanho o metro E onde é que nos encontramos?

- Quando chegares ligas-me que eu depois digo-te onde estamos.

- Topadíssimo!

- Vá, mas toma atenção e não e te deixes dormir a sério, senão estou mesmo haver que já não apareces lá…

- Já disse para ficares descansada que eu vou… Vou só passar um bocadinho pelas brasas.

- Hum, está bem… Até já, grandalhão! – levantei-me, coloquei a mala na dobra do braço e com um rápido passar de dedos no topo da cabeça dele, despenteei-lhe levemente o cabelo

- Até já, minorca! – ripostou em contraste, numa brincadeira amena que só serviu para nos rirmos mesmo antes de eu me dirigir a saída, pronta para rumar a um lugar que eu mal sabia ter algumas surpresas reservadas para mim



***



- Não vais comer mais? – perguntou Madalena ao ver-me arrastar o tabuleiro do meu crepe que mal tinha provado, para um canto da mesa, dando a breve indicação de que não pretendia voltar a tocar-lhe

Estávamos as três sentadas numa mesa redonda junto à casa de crepes, que tinhamos escolhido unanimemente para fazermos a compra do nosso lanche, que até então elas até estavam a desfrutar entre uma conversa ligeira e animada, menos eu, que só em pensar no simples facto de que a última vez que estivera ali fora com Ruben e Sofia, perdi a vontade de comer.

- Não… Este chocolate todo está a enjoar-me! – referi numa pequena careta agonizada pela reviravolta que tinha sentido no meu estômago, e dei dois goles do meu ice tea que trouxera a acompanhar

- Ultimamente não tens andado a comer nada de jeito, amor… - constatou Bárbara sentindo em si a preocupação evidente pelo meu estado de bem-estar físico e mental – Qualquer dia desapareces de tão magrinha que estás!

- Oh, não é nada disso… Simplesmente não ando com grande apetite, só isso. – eu descentralizei a atenção que fora desviada para mim e para a minha saúde, desvalorizando a importância que lhe estava a ser dada

- Sabes o que isso é? Falta de namorado…

- Oh Madalena não comeces…

- O que foi? É verdade… Que eu saiba a nossa Joaninha anda livre que nem um passarinho, e o que não faltam por aí são pardalitos jeitosos à procura de ninho! E eu até conheço alguns, se quiseres até tos apresento… - ela falou muito naturalmente, forçando a piada à conversa que fez Bárbara, e até a mim que preferi manter-se à margem da conversa, rirmo-nos discretamente

- Oh minha querida Madalena, isso não é muito da Joana, sabes? Encontros às cegas não faz o género dela… - proferiu com a máxima certeza e rectidão, ou não fosse ela conhecer-me tão bem pela nossa amizade que já perdurava há mais de seis anos, ainda dos tempos do nosso secundário

- Oh, está bem… Só estava a tentar ajudar. – cruzando os braços na frente do seu peito, ela deixou-se retaliar tombando levemente o corpo na cadeira

- E ajudaste, não te preocupes… Pelo menos fiquei a saber onde posso procurar se quiser fazer novas amizades! – tentando reconfortá-la da melhor maneira possível,  mostrei-lhe um sorriso agradecido e um piscar de olho promissor, pela tentativa de esforço que ela fizera para me ver um pouquinho mais feliz

Quando terminámos o lanche, saímos da restauração e posso dizer que fui praticamente arrastada com elas para a zona das lojas, onde em mais de uma hora nos perdemos em compras e mais compras, que felizmente para mim e para os meus pezinhos que já sofriam em cima dos saltos altos, tiveram vista a um cessar. Já passava das seis horas da tarde e William ainda não tinha aparecido para desânimo meu, e como começava a ficar tarde, nem a Bárbara nem a Madalena tinham mais razão para prolongar a sua estadia ali, por outros compromissos e responsabilidades ainda marcadas para o fecho daquele dia.

- Joana, ainda ficas? Nós já temos de ir embora… - asseverou Madalena em pleno corredor quando saímos de uma loja

- Não sei se o William ainda vai aparecer… Acho que vou ficar mais um bocadinho por aqui e ver se ele vem… - proferi meio desalentada, olhando em meu redor para procurar pela figura que encaixasse o semblante dele na perfeição

- Talvez seja melhor ligares-lhe…

- Sim, se entretanto ele continuar sem dar sinais de vida, é o que vou fazer.

Despedimo-nos todas com beijinhos partilhados no rosto de cada uma e um abraço, na promessa de nos voltarmos a encontrar no dia seguinte na faculdade.
E assim do nada ali tinha ficado eu… Sozinha à espera que alguém me encontrasse. Foi então que não tendo em vista outra solução, alcancei o meu telemóvel do interior da mala e marquei o número do Will, pronta para ligar-lhe e demandar-lhe uma reprimenda pelo compromisso a que ele tinha faltado.

- Sim, Will, sou eu… Onde estás? – perquiri logo assim que do outro lado da linha o ouvi responder

- Desculpa, adormeci e perdi a noção do tempo…

- Estou à tua espero há horas! – falei, mas atrás dele ouvi-a imenso barulho, várias vozes a falarem ao mesmo tempo, que me fez lembrar um aeroporto ou até mesmo aquele lugar, que se encontrava num autêntico frenesim 

- Eu sei, desculpa… - ele perdoou-se imediatamente, mas continuava difícil conseguir ouvi-lo, o ambiente à minha volta também não era o mais propício pois uma amálgama de pessoas enchia o corredor onde me encontrava, fazendo do centro comercial uma animação viva pela sua fluente agitação

- Sim, tudo bem, mas onde é que estás? – Will levou algum tempo a responder mas quando o fez a sua voz não ressoou ao telefone como seria de esperar, rodei ligeiramente a cabeça para trás e consegui vê-lo correr na minha direcção

- Estou mesmo aqui! – olhei-o a sorrir pela pequena partida que me havia pregado e desligar o seu telemóvel que segurava na mão – Desculpa, não resisti!

Mesmo antes de eu ter tempo de tomar alguma atitude, senti-o abraçar-me por trás fazendo-me levantar os pés do chão, e não consegui evitar um gritinho espontâneo pela surpresa, que fez as pessoas que estavam mais próximas de nós, olharem-nos, como se aquilo tivesse sido uma brincadeira de um… casal. Porém estavam redondamente enganadas se pensaram dessa maneira, o William e eu partilhávamos de uma amizade forte, uma ligação de quase irmãos, que nos últimos dias tinha aquecido o meu pobre coração, ainda machucado.

- És tão parvo! – logo que me soltou dei-lhe uma leve palmada no peito, pela sua gracinha que me tinha ruborizado as bochechas de vergonha – Podias ter dito logo que já cá estavas…

- Sabes como é… Gosto de manter o suspanse… - ele mostrou-se mais uma vez engraçadinho e o seu rosto voltou a acolher um sorriso largo que me fez baixar a guarda

- E que suspanse… Oh oh! – a falange do meu indicador arrebitou-se e rodopiou no ar, pelo marasmo da minha asseveração – E diz-me, tens fome? Queres ir comer alguma coisa…?

- Fome não tenho, mas um cafezinho até tomava!

- Então vamos… Acho que um café também me vai saber bem. – ou então não, mas isso eu só viria a entender depois… o meu braço direito encaixou-se no dele, que me ofereceu, e daquele jeito encaminhámo-nos até a um café




***



(Ruben)

Trabalho; preparativos para o casamento; trabalho e mais preparativos para o casamento… Era desta maneira que estava cingido o planeamento da minha rotina nestas últimas semanas.
Passei noites seguidas a pensar na conversa que há algumas semanas atrás tivera com a Adriana, quando ela me procurara a fim de esclarecer as minhas intenções, questionar pelas minhas atitudes, tentar entender os meus sentimentos… Mas como poderia explicar-lhe se eu mesmo não os conseguia entender ainda? Parecia tudo tão fácil e ao mesmo tempo tudo tão difícil, tudo o que fiz, todas as decisões que tomei… E erradas decisões essas, que agora era já demasiado tarde para eu solucionar, e por isso apenas me restava lamentar em silêncio e consentir as consequências dos meus actos, aceitando a moeda de troca… Aprender a viver um amor que eu não sentia.

- Amor, vou experimentar estas calças… - a Inês veio até à minha beira, apanhando-me a vaguear pela loja

- Já escolheste?

- Sim, gostei destas… São giras, não são?

- Sim, são… São giras… - concordei, ainda assim na hesitação de conseguir fazer uma boa apreciação, porque o facto era que opinar sobre escolhas de roupa, ainda para mais roupa de mulher, não era de certeza o meu forte

Como se não bastasse chegar cansado a casa depois de dois treinos naquele dia, a Inês ainda me arrastou com ela para a confusão das lojas do Colombo, afim de a ajudar a fazer compras… Não sei porque razão ela ainda o fazia, porque conhecer-me bem como ela conhecia, já deveria ter percebido que eu detesto andar de loja em loja a ver de roupa.

- Então ficas aqui? Eu vou ali dentro ao provador e volto já…

- Sim, vai que eu fico aqui…

- Se precisar da tua opinião depois eu chamo-te.

Apenas me limitei a sorrir-lhe, afundei as mãos nos bolsos e caminhei para a saída da loja. Esperando conseguir encontrar alguma paz e sossego, agora sozinho, encostei-me e apoiei os braços no gradeamento do corredor e comecei a observar as pessoas à minha volta, e dei por mim a perguntar o que elas escondiam por detrás dos sorrisos, da pressa, da agitação, da alegria, e confesso que não resisti em tentar comparar a minha vida com a delas, que eu desconhecia totalmente… Teriam elas a felicidade que mostravam ter, ou era tudo fachada apenas para esconderem a tristeza que não tinham coragem de mostrar? Tal como eu… Não me sentia completamente infeliz, mas faltava-me algo, algo que eu não podia recuperar e que tinha sido a razão do meu sorriso, o meu mundo, o meu tudo, que estupidamente eu traíra e magoara, e agora já não me era nada.
A Adriana tinha razão quando disse que eu tinha mudado… Mudei a partir do momento em que supus ter perdido o meu único grande amor, pela segunda vez, mudara para pior e sentia-me mal com isso… Por ter agido como um verdadeiro idiota e me ter recusado a acreditar nela, por não lhe ter dado ouvidos quando ela tinha todo o direito de se explicar, por ter quebrado a confiança que aprendêramos a construir em mais de um ano de namoro. Aquele Ruben de há dois meses atrás não era eu, mas estava a conseguir recuperar-me e a trazer-me de volta.
Dizem que por detrás de um grande homem está sempre uma grande mulher, mas então eu já não sabia que homem era eu, pois a mulher da minha vida eu tinha perdido para sempre.

- Foste tão estúpido, tão estúpido… - ainda me lamentava pelo rumo precipitado que tinha dado à minha vida, a forma como desiludi as pessoas que amava pela minha tomada de decisões, e a decisão mais fulcral que me atormentava o pensamento, era a do meu futuro a ser construído ao lado de uma pessoa que eu não conseguia amar, e viver longe daquela que um dia quis que fosse a mãe dos meus filhos, aquela com quem eu queria envelhecer ao lado e que ainda amava tanto

Aos poucos fui abrindo os olhos e levantando a cabeça, que pelo peso na consciência eu deixara tombar ligeiramente para a frente, enquanto me debatia interiormente com os meus pensamentos, mas nem quis acreditar no que vi a seguir… No corredor do lado oposto ao que me encontrava, e perfeitamente enquadrada na minha frente, estava ela… A Joana, a mulher que nunca mais viria regressar aos meus braços. Ao primeiro instante fiquei contente por voltar a vê-la, mas depois pareceu que tudo à minha volta se desmoronou… Vi outro homem aproximar-se dela e abraçá-la, pegar no meu mundo e tomá-lo nos seus braços. Não consegui reconhecê-lo, mas consegui enxergar bem os sorrisos que ambos trocavam e que espelhavam a felicidade que deviam estar a sentir, sim, ela estava feliz e ao contrário do que desejava, eu não era mais motivo dessa felicidade.
Estaria Joana com ele? Voltara ela a refazer a sua vida ao lado de outro homem? Teria ela conseguido esquecer-me e seguido enfrente? Um sobressalto no meu coração deixou-me os joelhos a tremer só por colocar aquela hipótese em evidência, uma hipótese que só poderia ser verdadeira.
Então era aquela a sensação que ela sentiu ao voltar a ver-me ao lado de Inês, era aquela a sensação de ser-se trocado, a sensação de vermos o nosso lugar na vida do nosso grande amor, o lugar que chegáramos a pensar nos pertencer para sempre, ser substituído por outra pessoa.
Senti uma tristeza tão grande e um vazio tão inexplicável em mim, que só me apetecia chorar. “Os homens não choram…”, também se ouve dizer. Então os valentões que pensarem assim que se apaixonem primeiro, mas que se apaixonem a sério, perdidamente, que encontrem o amor, o tesouro mais precioso da vida deles e depois que o percam para sempre, depois que venham falar comigo e me digam se um homem chora ou não, mesmo que por amor.
Continuei a olhá-los e eles continuavam a sorrir enquanto conversavam, enquanto se tocavam… E foi antes que visse alguma coisa que viesse confirmar ainda mais as minhas suspeitas, algo que me viria a deitar ainda mais abaixo, que me voltei e tornei a entrar na loja, onde a Inês já me procurava.

- Ruben, chega aqui, amor… - mal me viu ela chamou-me e fez sinal para que me aproximasse

- Oh Inês, ainda vais demorar muito com isso? Eu quero ir embora… - abatido pelo cenário anterior que assistira, e o qual tão cedo não iria conseguir esquecer, demonstrei-lhe a minha vontade súbita de apenas querer ir embora e voltar para casa

- Queres ir embora? Mas eu ainda não me decidi sobre o que vou levar… - lamuriou, desconhecendo totalmente a maior causa que me desalentava e me fazia querer deixar aquele lugar o quanto antes – Amor, o que achas destas blusas? Qual delas gostas mais? – perquiriu elevando uma blusa em cada mão para, como sempre, perguntar pela minha a opinião

- Não são as duas iguais? – senti uma linha fina traçar a minha testa que entretanto se enrugara, aquando a pergunta óbvia que coloquei, não reparando à primeira vista qualquer diferença que distinguisse as peças de roupa

- Claro que não são iguais, Ruben! Esta tem renda na gola e na bainha, e esta não… - evidenciou com uma disposição como se fosse um dever eu ter que saber os pormenores de bordados de roupa feminina – Diz-me qual das duas gostas mais…

- Oh Inês, eu não sei… Eu sei lá!

- Estou a pedir-te a opinião, Ruben, acho que não é uma coisa difícil de se fazer… Apontas para uma blusa e pronto, eu vou experimentar!

- Mas porque é que precisas de saber se eu gosto ou não gosto? A roupa é para ti, és tu que a vais usar, não eu…

- Olha não sei, porque se calhar és o meu noivo e eu gosto de ficar bonita para ti… - não era a minha intenção magoá-la com o que disse, mas parece que exagerei na maneira como manuseei as palavras e isso reflectiu-se na forma como ela falou, ríspida e ofendida… até no olhar

- Desculpa, pronto… Mas tu sabes que eu não gosto de vir às compras, não me sinto bem a andar aqui às voltas…

- Se fosse para estares a jogar consola ou a fazer outra coisa qualquer com os teus amiguinhos, já não te importavas! – ela falou com uma frieza abrupta a conjecturar-lhe a voz, e virou-me as costas, começando a caminhar na direcção oposta

- Oh Inês, não é nada disso… - tentando impedir que aquele pequeno desentendimento originasse algo de maior, segui atrás dela – Mas nós já andamos aqui há horas para trás e para a frente, e ainda não compraste uma única peça de roupa que fosse! – tentei ser o máximo coerente possível, explicando-lhe as razões compreensíveis do meu desânimo

- Sim, tens razão, desculpa… - finalmente ela travou o seu compasso de marcha e olhou-me – Eu sei que não gostas de fazer compras e andas há imenso tempo a aturar-me entre lojas e mais lojas… Vai dar uma voltinha por aí enquanto eu me decido quanto ao que levo, depois ligo-te para nos encontrarmos.

- Não te importas?

- Oh, é óbvio que eu preferia que estivesses comigo, mas vocês homens são assim, no que toca a ir às compras com as namoradas, enfim… Mas não, não me importo, vai lá…

- Então eu vou tomar um café.

- Está bem, depois quando estiver despachada vou lá ter contigo. – sorri-lhe, pronto para a deixar e ter um momento só para mim, mas Inês voltou a chamar-me antes que eu tivesse a oportunidade de me afastar – Ruben?

- Diz… - voltei-me novamente para a sua frontaria e encarei-a

- Não me vais dar um beijo antes de ires? – apenas para lhe satisfazer o pedido, aproximei-me dela uma vez mais e com um simples e único toque de lábios, ofereci-lhe um beijo, que não sei se infelizmente para mim ou para ela, foi o mais impessoal e sem sabor de todos, pelo menos do que senti da minha parte

- Até já. – novamente com a mesma postura de há pouco, com as mãos recolhidas nos bolsos e de olhar cabisbaixo, saí da zona das lojas e caminhei para a restauração 

Com o avançar das horas, a hora do jantar aproximava-se e por isso os cafés e restaurantes começavam a encher. A minha ida ali tinha só um propósito, beber um café sossegado e esperar por Inês numa mesa, fugindo assim à confusão e tédio das lojas, onde passara uma grande parte da minha tarde.
Acerquei-me da bancada de um café e atrás de uma pequena fila esperei pela minha vez, que felizmente e para a minha satisfação, não tardou muito a chegar.

- Aqui tem os dois cafés e o seu troco, obrigada e boa tarde! – ouvi a empregada falar com o rapaz que estava a ser atendido na minha frente

- Obrigado! – ele agradeceu de volta, mas quando voltou o corpo numa só rajada, por pouco não fez colidir o seu tabuleiro contra mim, que arredei passo para trás no mesmo segundo – Peço desculpa.

Tencionei-me a responder-lhe, mas não fui capaz… A voz ficou-me retida na garganta quando na minha cabeça a imagem dele se identificou rapidamente com a de uma pessoa que eu já tinha visto antes. Ele era o mesmo homem que avistei com a Joana há alguns minutos, e se a memória não me falhava totalmente, não era só dali que o conhecia, podia jurar que já o tinha visto antes, só não sabia de onde.
Seguindo-o com o olhar, observei-o meticulosamente a caminhar até chegar à mesa onde estava instalado e quando a alcançou, reparei que ainda estava acompanhado por Joana, que sentada numa cadeira, o esperava. Voltaram a mostrar-se sorridentes um com o outro e por muito que tivesse lutado contra, eu não consegui ficar indiferente a toda aquela cumplicidade… demasiada, até.

- Desculpe… Senhor? Em que posso ajudar? – pela insistência da empregada de balcão, que se esforçara por me trazer de volta, notei que a minha atenção já tinha sido promulgada bem mais que uma vez, mas esta estivera focada bem longe dali

- Ah… É um café curto e uma garrafa de água, por favor. – pedi, tendo no instante seguinte desviado o meu olhar curioso novamente para a mesa deles, tendo lá permanecido até ao meu pedido ter sido pago – Muito obrigado, boa tarde! – agradeci-lhe educadamente, e com o tabuleiro nas mãos procurei por uma mesa disponível onde me pudesse sentar

Queria saber o que se passava entre eles os dois, embora soubesse que não tinha o direito de me voltar a meter-me na vida, e principalmente no foro pessoal da Joana, mas era impossível permanecer imparcial ao que estava ali a acontecer. Queria saber mais, precisava, e naquele instante era essa a única certeza que tinha.  




Queridas leitoras, aqui está a continuação da história!
Espero que gostem deste capítulo, o próximo será publicado logo assim que puder, e não se esqueçam de comentar, as vossas opiniões são muito importantes.

Um beijinho grande, Joana :)



8 comentários:

  1. Bem já sabes o que acho... e o que devias escrever loool mas pronto hoje até nem estou num dia de querer sangue lool quero mesmo é mais...

    Beijocas

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  2. Fantástico adorei.Quero o próximo.bjs

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  3. Adoro o Rubico roídinho... bem feito :D
    Adoro, adoro, adoro, só quero ler mais.
    Beijo

    Adriana

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  4. Adorei quero o próximo.bjs

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  5. Estou ansiosa para o proximo, espero mesmo que eles se entendam e estou curiosa para o que vai acontecer :3

    e mais uma coisa: esta perfeito!

    Beijos xana

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  6. Rúben provaste do teu próprio veneno, eu sabia que o William ainda ia ser muito útil, não gostaste de ver a Joana com outra pessoa? Temos pena, dói, não dói menino Rúben? Foste tu que quiseste que fosse assim, agora só tens que aguentar, fica lá com a tua noiva, que nem para escolher uma blusa serve. Agora sabes o que a Joaninha sentiu quando te viu com a Inês, e não é nada agradável, chora muito, alivia a alma e não desesperes porque o tempo tudo cura, ou não.
    Não resisti, tive mesmo que dirigir o meu comentário directamente ao Rúben.
    Adorei, mas isso também já não é novidade, porque tu contagias-me com a tua forma de escrever. Finalmente a Joana parece que está a seguir a sua vida, devagarinho, mas tá, dedicada ao estudo aos amigos e ao trabalho, mas anda comer pouco? e não conseguiu terminar de comer o crepe porque o chocolate a estava a enjoar? ai,ai,ai, não me digas que aquela noite deu frutos?, eu bem disse que aquela noite ainda ia dar que falar. Eu ia adorar, mas primeiro quero muito o próximo capitulo, tou aqui ruidinha de curiosidade. Continua

    Beijocas

    Fernanda

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  7. "Então era aquela a sensação que ela sentiu ao voltar a ver-me ao lado de Inês, era aquela a sensação de ser-se trocado, a sensação de vermos o nosso lugar na vida do nosso grande amor, o lugar que chegáramos a pensar nos pertencer para sempre, ser substituído por outra pessoa.
    Senti uma tristeza tão grande e um vazio tão inexplicável em mim, que só me apetecia chorar."

    Doi, nao doi??
    ah pois, e eles nem sao nada, mas isso ele ainda nem sabe e merece um pedacinho esse sofrimento, essa angustia, esse medo de perde-la!!

    A Joana está gravida?! Ainda nao, embora eles queiram ser pais, nao assim, nao ainda!

    Adorei e quero ver o que ele vai fazer, se os vai confrontar ou esconder-se e observa-los.

    P.S- a Inês, credo, é uma chata!!

    Beijinhos

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  8. Tens que publicar mais! *.*

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