Chovia torrencialmente no final da tarde do dia seguinte,
a chuva intensa e copiosa caía vertiginosamente sobre as ruas imperantes de
Nova Iorque. Joana mirava-a através da enorme janela do quarto, serena,
observando a azáfama dos transeuntes no lado de fora, que corriam
apressadamente de um lado para o outro tentando fugir à rigorosa precipitação.
Envergava um vestido negro esmorecido, cortado a dois dedos acima dos joelhos,
com umas botas igualmente da mesma cor e o cabelo estava apanhado numa trança
perfeita, a cair-lhe sobre o ombro esquerdo.
- Joana? – imperou uma voz masculina nas suas costas. Era
Will, invocando-a junto à ombreira da porta - ela virou-se para o seu
semblante – Está na hora?
- Sim, está! – afirmou ele assentindo com a cabeça
Joana vestiu o longo sobretudo e colocou a mala ao ombro,
saindo de casa ladeada pelo rapaz. Sarah já os esperava dentro do carro sentada
no lugar de pendura, protegida do dilúvio que imperava no exterior. Antes de
ocupar o lugar de condutor, Will abriu a porta de passageiros dando a entrada a
Joana, protegendo-a sempre com guarda-chuva. Ela passou toda a viagem
completamente absorta, olhando alheiamente os pingos de água que escorriam em
velocidade pelo vidro da janela. Sentia um enorme e arrepiante aperto no
coração, sentia-se sozinha, sentia-se como tivesse sido atirada para um poço
obscuro e assustador, sem fundo…
- Estás bem? – questionou-a Sarah, olhando-a pelo
retrovisor
- Sim. – afirmou com a voz sumida, continuando a espreitar
pela janela já com os olhos a quererem deflagrar lágrimas gordas
Joana entrou de braço dado com Will juntamente com Sarah
que seguia a seu lado. Ficou abismada por ver na igreja uma amálgama de
presenças… a maior parte delas desconhecidas e as restantes, tinha-as visto uma
vez ou outra. Também os seus colegas e professores de liceu estavam presentes,
todos em grupo num canto ao lado esquerdo do altar. Por momentos foi invadida
por uma nostalgia pacífica, estava orgulhosa por saber que a sua progenitora
fizera diversas amizades e ganhara admiradores pelo seu cargo, embora também
tinha conseguido discernir os rostos de algumas sanguessugas emproadas que
trabalhavam em parceria no escritório com a sua mãe, que choravam
desalmadamente e rezavam por ela, no fundo Joana sabia que estavam apenas a
fazer uma triste deixa de uma peça de teatro e que mal chegassem a casa iriam
festejar animadamente e pregar louvores ao céus por esta “morte abençoada”. No seu
íntimo residia uma vontade desalmada de lhes dar uns valentes safanões e pô-las
a andar dali para fora, porém não o fez, como é óbvio.
O sermão do padre estava a causar-lhe náuseas de tão pouco
comovente e desproporcional que era… um dos momentos que mais lhe custou foi
receber os pêsames das entidades mais emotivas e as que demonstravam mais
compaixão. Custava-lhe dizer um “obrigada” ao mesmo tempo que lhe apertavam a
mão, simplesmente porque era desconfortante e pesaroso.
No final da cerimónia fúnebre, chegou a parte mais
arrepiante e dolorosa… a despedida. Todos os presentes abandonaram a igreja
ficando apenas a única familiar da falecida e os dois amigos. Débora estava
impávida e serena, a sua pele estava tão pálida que aparentava ser feita de
cera e os seus lábios esboçavam um terno sorriso. Joana acariciou-lhe a face
dura e automaticamente um calafrio lhe invadiu o corpo, aquela realidade
parecia-lhe de uma maneira patusca, irreal e preferia pensar que a sua mãe
estava apenas embargada a um sono profundo e simultaneamente eterno, mas é
evidente que isso não passava apenas de um desejo idealizado… ela continuava
ali… silenciosa, de olhos fechados e de sinais vitais petrificados. A rapariga
aproximou-se e presenteou-a com um beijo prolongado na testa gélida, deixando
escapar mais umas quantas lágrimas assim que cerrou as pálpebras.
- Isto é só um até já, querida mãe.
***
O temporal não revelava indícios de querer dar tréguas e a
chuva raivosa continuava a cair das alturas acabando por chapinhar estrondosamente
sobre os inúmeros chapéus-de-chuva e nos solos do vasto cemitério.
Após o padre proferir o último discurso, o caixão foi
levado para a sua última morada. No momento em que os coveiros começaram a
encher o túmulo com terra, Joana fechou os olhos e abraçou Will com todas as
forças que ainda lhe restavam. Rompeu novamente num choro agoniante, sentia que
aqueles abutres estavam a obrigar a sua mãe a morrer. De súbito a precipitação
abrandou, acabando no fim por escassear. Os dementes mais próximos do leito
deitaram flores, cada ramo perfeitamente enfeitado e os crentes e espirituosos
atiraram mãos cheias de terra para dentro do túmulo em sinal de respeito.
Estar ali, a presenciar todo aquele cenário devastador,
estava a destrui-la por dentro, a matá-la. Afastou-se ligeiramente
antes que Sarah e Will a pudessem ver e escapuliu-se por entre a multidão. A
fúria que tinha com Deus por lhe ter roubado a mãe para leva-la para os seus
aposentos era de tal forma caótica que fazia Joana derramar lágrimas e mais
lágrimas à medida que se afastava. Estagnou junto ao enorme e misericordioso
portão de ferro já um pouco ferrugento, para tentar acalmar a corrente de
emoções, o misto de mágoa e revolta… e foi nesse instante que observou um outro
alguém. Tinha a impressão de que se tratava de uma presença masculina devido à
estrutura corporal e à sua indumentária… estava cabisbaixo, encostado à porta
do carro. Aparentava-lhe um aspecto estranhamente familiar, porém não o
conseguiu discernir por completo, visto que o “desconhecido” se encontrava de
costas e a uns valentes metros de distância. Quando ganhou coragem para ir ver
mais de perto quem se tratava, um timbre grave de voz travou-a.
- Mas que raio te passou pela cabeça para desapareceres
assim?
- Desculpem… - não conseguiu dizer mais nada, continuava
hipnotizada a tentar adivinhar quem era aquele homem
- Joana, passa-se alguma coisa? – desta feita foi Sara a
interroga-la pousando as suas mãos nos ombros da amiga
- Aquele homem ali… - fez um trejeito com a cabeça na
direcção dele
- O que tem?
- Não sei, mas acho que não me é totalmente alheio… parece
que o conheço de algum lado. – supôs nunca descolando os olhos da sua figura
- Estranho, acho que nunca o vi! – indagou Will
- Pois, provavelmente eu também não e só estou pra’qui a
divagar… a criar macaquinhos na minha cabeça. – fez uma breve pausa – Quero ir
para casa… - finalizou olhando-os pela primeira vez
- Então vamos, eu deixo-vos às duas em casa. – mostrou-se
cavalheiro
Assim que Joana abriu a porta do carro para entrar, voltou
a procurá-lo com o olhar… de fugida. Perscrutou-o a alcançar as chaves no bolso
e a pressionar o botão destrancando assim o enorme e reluzente BMW, entrando
posteriormente sem nunca mostrar o semblante.
Assim que Will estacionou à porta do prédio de Joana, Sara
ofereceu-se para passar a noite com ela, na tentativa de a acalmar. Subiram e
instalaram-se, depois de terem comido alguma coisa, abriram o sofá cama e
acomodaram-se entre os cobertores.
- Ainda estás a pensar nele? – perguntou Sara, vendo a
amiga estranhamente absorta
- Nele quem? – mostrou-se alheia
- Naquele homem que viste à entrada do cemitério…
- Hum… para dizer a verdade, não… desisti de tentar
descobrir quem era, não lhe consegui ver a cara e não encontro mais nenhuma
ligação. – fungou
- Então estavas a pensar em quem?
- No meu pai, no canalha que ele é! – disse num laivo de
fúria
- Ainda lhe guardas rancor?
- Não diria bem rancor… é mais ódio e desilusão, embora os
meus pais tivessem separados, eles mantinham uma relação amigável… não percebo
porque é que ele não apareceu no funeral… contudo sempre tive esperanças que
ele viesse… - suspirou
- Se calhar não tinha voo, ou então foi o excesso de
trabalho que fizeram com que ele não pudesse vir… - tentou adverti-la
- Por favor Sara! Isso são desculpas, tretas! O meu irmão
tinha o direito de ver a nossa mãe uma última vez, nem que fosse… nem que
fosse, morta!
Sara juntou-se mais a ela e abraçou-a, acabando depois por
interroga-la.
- Eu sei que esta pergunta não vem a propósito, mas… o que
é que estás a pensar fazer da tua vida… daqui para a frente?
Joana mostrou-se pensativa por instantes.
- Vou voltar para casa… Vou voltar para Portugal.
Aqui vos deixo mais um capítulo, espero que tenham gostado
Joana :)
P.S. Informaram-me que alguns leitores não conseguiam
comentar em anónimo, de facto não estava a aceitar comentários de utilizadores
que não estavam registados, sem me aperceber. Mas já resolvi o assunto, agora
quem quiser, já poderá deixar o seu comentário em anónimo! :)
Quem seria aquele homem?!
ResponderEliminaruhhhhh...mistério... :b
estou ansiosa pelo próximo Juca, e com ele o regresso a Portugal :)
beijinhos
Mariana
Oh minha querida Juca, primeiro tive de acalmar um pouco, pois confesso que ainda nem ia a meio do capítulo e já estava a chorar, tal qual Madalena arrependida... Já sabes como sou chorona, enfim!
ResponderEliminarMais um capítulo extraordinário que me deixou sem palavras, mas com as emoções à flor da pele.
É incrível a capacidade que tens para transpor emoções com simples palavras e fazê-lo de uma maneira tão simples e genuína, mas que cativa imenso os leitores.
Só posso dizer que aguardo ansiosamente pelo próximo! :D
Beijinhos, minha linda! ^^
fantastico...
ResponderEliminarquero mais...
continua...
Minha linda, acabei de ler!
ResponderEliminarOpa deixaste-me com a pulga atrás da orelha, quem é o homem??? Será quem penso que é??? Hum, bem q podias desfazer esse mistério rapidamente, né???
Qt ao capítulo em si, está fantastico!
Continua!
Bjs
Esta muito muito bom continua.bjs
ResponderEliminarMinha querida, mais uma vez deixaste-me sem palavras... Fiquei super emocionada com este capítulo para não variar :)
ResponderEliminarCada vez escreves melhor e consequentemente eu fico mais curiosa e ansiosa pelo próximo capítulo!
Tens um talento enorne para a escrita e eu ador o que escreves.
Cintinua, eu ficarei à espera do próximo capítulo!
Um beijinho enorme, Lígia *_*
Óptimo! :D
ResponderEliminarContinua!
Beijo enooorme!
Ana Rodrigues*
Oie Oie :p
ResponderEliminarO capitulo está lindo :) , cheio de sentimento , a fic apesar de ainda estar no inicio tenho a certeza que vai ser excelente , pois já deu para entender isso :p
Quem será aquele homen :p , eu quero saber , sim ?
Quero ver o regresso de Joana a Portugal :)
Fazes-me um favor ? sim ? :p
Então é o seguinte :p posta rapidinho :p , pois eu tenho um grande defeito , foi uma curiosa de primeira :p
Vá , continua com o óptimo trabalho que tens feito até agora :) , e nunca pares de escrever :p
http://luta-por-um-sonho.blogspot.pt
Beijinhos :p
Logo ao 3º capítulo consegues captar toda a minha atenção. Escreves mesmo muitíssimo bem!
ResponderEliminarLindo! :')
Continua!
Beijo :')
Comecei a escrever uma fanfic. Espero que sigas (:
ResponderEliminarnemsemprevivercusta.blogspot.com
EStou a gostar ! continua :)
ResponderEliminarsegui *
Descobri hoje a tua história e devo-te dizer que nunca ninguem fez com que as lagrimas caiessem tão... olha nem tenho palavras, tá magnifico, com a tua escrita fazes-nos passar para o mundo onde a personagem vive, onde ela sofre e nos sofremos com ela.
ResponderEliminarFico a aguardar o proximo capitulo.
Beijinhos*
http://quandomenosseespera.blogs.sapo.pt/
obg princesa *-*
ResponderEliminara mim também é-me completamente impossível :s
ResponderEliminarInfelizmente é mesmo querida, adorei a história e o blog, segues o meu ? tambem já sigo o teu (:
ResponderEliminarObrigada querida (: e sim, têm sempre a tendência de se fartar.
ResponderEliminarestou a seguir ! segues também ? (Capitulos da Vida)
ResponderEliminar=) tens um cantinho maravilhoso!
ResponderEliminarMaria
quando voltas a publicar?
ResponderEliminarestou ansiosa p'ra saber mais desta história...
beijinhos
adorei o teu blog, vou seguir (:
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