Na manhã seguinte, promulgada pelas horas matutinas, Joana ainda dormia
tranquila, de sonhos completamente distantes e divergentes à sua vida real, que
subitamente e quase sem ter dado conta, se havia tornado numa autêntica
montanha russa, onde os pontos baixos e reviralhos, eram sem dúvida, os mais
abundantes.
Porém, foi só à segunda tentativa de chamada, que o seu telemóvel
anunciou sobre a mesinha de cabeceira, que ela se mostrou disposta a atender,
obrigando a abjurar-se do seu estado estranhamente repousante de calma
dormência, que levava há horas. No visor do Blackberry preto, podia-se
ler “Sara ♥ a chamar…”, mas tal era a preguiça
e sonolência a que estava fatalmente remetida, que atendeu a chamada sem ter a
preocupação de olhar o destinatário da mesma.
- Sim? – atendeu de clamor sumido e rouco, deixando-se permanecer
exactamente na mesma posição que havia despertado
- Bom dia, bom dia, boneca! – numa clara disposição leviana, a voz de
Sara deixou trespassar todo o seu alento que se encontrava leve e cadenciado
- Ah, Sara, és tu! Bom dia… - de telemóvel junto ao ouvido e ainda de
olhos fechados, impulsionou-se para trás, esforçando-se a pôr de parte a
preguiça que tinha, para se sentar à cabeceira da cama
- Isso é que é animação! Por esse entusiasmo todo, estou a ver que
preferias que não fosse eu…
- Oh, não sejas tonta… Quando atendi a chamada não vi quem era! – um
pequeno sorriso formou-se nos lábios mas assim que abriu apenas um olho para,
pela primeira vez naquele dia, ter a visão matinal do mundo, uma pequena careta
de incomodo formou-se no seu fáceis, assim que a luz forte do sol já pregoado
no céu, reflectiu raios ténues por entre as brechas do cortinado rastejado no
chão, da ampla janela que se estendia à sua frontaria
- Desculpa se te acordei… - ressentiu-se a pobre Sara, deixando que o
arrependimento por ter feito aquela chamada precoce, lhe abatesse a alacridade
madrugadora
- Não, não faz mal, amor… - comprimiu os ombros despoticamente, não
abonando qualquer gravidade ao caso – De qualquer das maneiras também te queria
ligar por causa daquela situação de ontem… Acho que te devo uma explicação! –
em desistência perante a fadiga física e emocional que lhe trespassava o corpo,
deslizou novamente para baixo dos lençóis e encaixou de novo a cabeça sobre a
almofada
- Pois, eu também queria falar contigo… - o tom uniformemente hesitante
que usou, foi o suficiente para despoletar em Joana, uma tirada de curiosidade
e preocupação
- Queres falar comigo…? Aconteceu alguma coisa?
- Não! – disse de imediato, para logo após um curto momento de reflexão
reconsiderar uma resposta mais assertiva – Quer dizer… aconteceu, mas não é
nada com que te devas preocupar… acho! – ditou numa afirmação não muito segura,
deixando que a última palavra lhe saísse pela abertura dos lábios já num
murmúrio, que deu graças a Deus por ter passado despercebido à amiga
- Hum, está bem… - embora não totalmente convicta da resposta um tanto
ou quanto forçada de Sara, Joana conseguiu fazer com que o seu estado súbito de
preocupação repousasse e o coração abrandasse a sua batida – Mas queres
combinar alguma coisa para agora?
- Sim, estava a pensar em irmos até lá em baixo tomar o pequeno-almoço…
O restaurante parece-me ser um sítio calmo onde vamos poder falar à vontade,
por isso, se também te parecer bem…
- Sim, parece-me bem… Parece-me muito bem! – falou com um rasgo nos
lábios, pela concordância imediata de planos – Podemo-nos encontrar então no
átrio junto ao restaurante?
- Sim, para mim está óptimo aí! Consegues estar pronta por volta das
oito e meia?
- Ah… - esticando o braço de modo a chegar ao relógio de pulso que tinha
em cima da mesinha de cabeceira, na expectativa de ainda lhe sobrar um tempo recheado
para se preparar antes de sair – Sim… Vinte minutinhos chegam-me! É só tomar um
duche rápido, vestir qualquer coisa e desço!
- Pronto… Então está feito, encontramo-nos lá!
- Sim, encontramo-nos lá! – anunciou em contundência, afastando os
lençóis e erguendo-se da cama – Vou então arranjar-me!
- Está bem, meu amor… À hora combinada, lá estarei!
- Sim, princesa! Até já… Um beijo!
- Outro também para ti, pequenina! Até já! – pouco depois, o ruído do
outro lado da ligação reduziu, e a chamada foi terminada
***
Instalada
no piso inferior, encontrava-se Sara, que depois do telefonema que fizera no
alpendre do quarto, regressara e voltara a deitar-se na sua cama. Não
conseguira ter uma noite tão tranquila assim, tal como queria e tinha esperado…
Aquilo que tinha visto e ouvido na noite anterior, aquando, depois de um jantar
tardio e de um passeio feito pelo jardim do hotel, regressara ao seu quarto,
trouxera-lhe a desordem aos pensamentos e ideias, que até à altura não se
encontravam tão compostos e integrais como deveriam, para tirar as conclusões
mais asseveradas.
Por
um lado sentia o peso da culpa por ter ouvido provavelmente, uma conversa da
qual mais ninguém poderia ter dado conta, uma conversa de total foro pessoal,
mas por outro também se sentiu na curiosidade e necessidade de o fazer, visto
que uma das pessoas envolvidas lhe eram bem mais próxima, do que alguma vez
poderia ter imaginado.
*****
-
I’m sorry… - desculpou-se de imediato o rapaz, que acidentalmente tinha chocado
consigo num mero toque de raspão no ombro, por componente das suas longas e
rápidas passadas, impostas na direcção oposta à sua
-
It’s okay! – respondeu-lhe com um sorriso, que não teve tempo de ser
retribuído, devido ao imponente percurso que ele persistia em percorrer no
menor tempo possível, com vista a um dos elevadores
Contudo,
Sara não deu importância, continuou a percorrer o corredor e só parou quando
chegou junto da porta do seu quarto, pronta para vestir o pijama, deitar na
cama e entregar-se totalmente a mais uma noite de sono que pretendia passar de
fiada e sem quaisquer interrupções, mas uma voz, uma voz que lhe era um tanto
familiar e que se arrastou por quase todo o corredor, obrigou-a a adiar essa
vontade apenas por mais uns minutos.
-
Ruben? – ouviu em proclamação grave, nitidamente um tom de homem, mas não se
atreveu a olhar… continuou antes a
procurar o cartão do seu quarto, perdido algures dentro da mala – Ruben! –
deferiu a insistência, e foi somente num olhar fugidio, que se poderá dizer ter
sido lançado quase sem intenção, que percebeu que aquela interjeição era
dirigida ao rapaz que tinha ido contra si – que ela ainda não conhecia, mas que
era ou melhor, fora muito próximo à sua melhor amiga.
-
Rui… - finalmente Ruben abrandou a passada, acabando por findar com o percurso
que já se encontrava tão curto, para se ver obrigado a parar daquela maneira
Sara
conhecia aquele nome, aquela voz, aquele semblante, mas de onde? Rui (!)
Felizmente que não levou muito tempo até que a sua memória a conduzisse ao
momento em que o vira pela primeira vez. É claro! Era o mesmo homem que
estivera há algumas horas atrás com Joana, no átrio de entrada, e a quem ela
chamara de padrinho, era o mesmo homem com quem se cruzara em Nova Iorque
inúmeras vezes, nas suas visitas à amiga íntima! Claro, claro… só poderia ser
ele, e mais uma vez ao olhá-los discretamente, pôde certificar-se disso mesmo!
Sara era perita em fixar caras novas, e aquela cara e aquela voz, não saíram
tão rapidamente da sua cabeça assim como entraram. E o tal de Ruben… Desse
estava certa de que nunca o vira antes, mas conhecendo ele Rui, o Dirigente
Desportivo da equipa encarnada, ele não poderia ser só um hóspede vulgar do hotel,
como lhe ocorreu primeiramente, mas também um dos jogadores de futebol ali instalados…
Mas tudo isto, claro, em suposição, pois vivendo e estudando em Nova Iorque,
estando assim demasiado tempo fora de Portugal e não sendo uma seguidora nem
tão pouco amante de futebol, era natural que não o conhecesse, mas, talvez,
isso tivesse prestes a mudar…
-
Pensava que já estavas no teu quarto… - disse, passando exactamente ao mesmo
tempo nas costas de Sara
-
E estava, mas… Vim cá fora um pouco, esticar as pernas! – ela sorriu para si
mesma ao ouvir a resposta dele, ainda nem o conhecia e o que dissera soara-lhe
de imediato a desculpa esfarrapada
-
Sabes que já é tarde, e acredito que o mister não iria achar piada ver-te
acordado a uma hora destas, e a vaguear pelos corredores…
-
Eu sei, Rui, mas precisava mesmo!
-
E é só isso ou precisas de mais alguma coisa? – Rui já o conhecia bem demais,
pelo menos conhecia-o o suficiente para que facilmente lhe conseguisse
desvendar alguma manha, como era o caso, e Ruben sabia disso, e como tal, sabia
também que não valeria a pena começar a construir uma teia em redor do assunto,
que de uma maneira ou de outra, mais cedo ou mais tarde, iria ser descoberta
-
Preciso… Preciso de ver uma pessoa! - desabafou, levando voluntariamente as
suas mãos ao encontro dos bolsos dos jeans, e o seu olhar a estacar sobre a
alcatifa bege que revestia todo o corredor
-
Merda…! Onde raio meti a porcaria do cartão? – proferiu Sara, num sussurro de
puro fatídico quase inaudível, pela busca que até então não tivera cessado pelo
cartão electrónico do quarto
-
Acho que nem me vou dar ao trabalho de tentar adivinhar quem seja essa pessoa…
- asseverou, sabendo ser ele a única pessoa que da família de Joana, havia testemunhado o que há tempos passados
havia sido um grande amor na vida da sua querida afilhada e daquele homem novamente
apaixonado, que permanecia na sua frente
-
Eu preciso vê-la, Rui… Preciso de falar com ela! – indagou numa súplica,
acercando-se de Rui e começando a abrir o jogo com ele, jogo esse que ainda há
pouco havia começado, mas que já se adivinhava bastante perigoso
-
Finalmente… - ela suspirou de alívio quando, no bolso interior da sua mala, deu
com o tão procurado cartão, que logo posicionado entre o polegar e indicador,
se encaixara perfeitamente na pequena entrada rectangular junto à maçaneta,
destrancando assim a porta
-
Não sei se isso será o melhor para ti e para a Joana, Ruben… - preveniu,
sabendo que desse encontro e dessa conversa que Ruben queria ter com a sua
afilhada, pudessem surgir dissabores que viessem a abater-se e a magoar ambos
os lados
No
instante em que Sara ouviu aquele nome, estacou. Apercebeu-se então de que a
razão daquela conversa, que por obra do acaso começara a ouvir, era a sua grande
amiga, a sua maior confidente… É certo que não poderia ter certezas, mas tudo
indicava para que dessa maneira fosse. Entrou no quarto e encostou a porta,
deixando-a apenas aberta por uma brechazinha da qual ela pudesse assistir a
todo o decorrer da situação. Agora conseguia ver tudo predisposto num novo
plano… Viu que Ruben e Rui conversavam num frente a frente, distinguindo cada
gesto que cada um incorporava, bem como cada palavrinha prenunciada por eles,
visto que a porta do seu quarto se distanciava a uns meros cinco metros.
-
É o melhor, Rui… é! Eu já esperei demasiado tempo por isto, não posso nem
aguento esperar mais! – por aquela postura, por aquela franqueza na voz, por
aquele olhar brando e suplicante, ele percebeu o quanto aquilo era importante
para Ruben, para a sua vida, para o seu bem-estar com os outros, mas
principalmente, para o seu bem-estar consigo mesmo – Eu preciso de pôr os
pontos nos i’s… Preciso de esclarecer tudo de uma vez!
-
Eu pensava que vocês já tinham esclarecido tudo, quando…
-
Eu sei, eu pensava o mesmo, mas… - Ruben antecipou-se a interrompê-lo, antes
que ouvisse o que não queria e no qual se martirizara durante tanto tempo, sem
saber o verdadeiro porquê de tudo - … mas ela voltou, e isso… Isso veio mudar
tudo!
-
Tudo, o quê? – embora tivesse feito a pergunta, Rui já fazia uma ideia da
resposta que estaria por trás, mas não quis arriscar demasiado
-
Sei lá… Tudo! A minha vida… Tudo! – teve que sintetizar pois sem saber o que de
concreto podia dizer, Joana voltara a trazer-lhe algo com uma grandiosidade tão
indescritível, que foi impossível poder exprimir… e foi então, que ao
revelar-se, um sorriso triste surgiu na puerícia dos seus lábios – E é por isso
que eu tenho tanta necessidade de falar com ela!
-
Eu entendo-te, a sério que te entendo, mas talvez não seja boa ideia vocês
falarem hoje… Talvez amanhã seja melhor! – mostrando ser tão tolerante e
compreensivo quanto conseguia, Rui tentou chamá-lo à razão, fazendo-o ver que
aquela não era a altura certa para resolver o que fosse, por muito que também
ele o desejasse
-
Porque não hoje? Quanto mais rápido resolvermos isto, melhor!
-
A rapidez só vai atrapalhar, Ruben… Espera que o destino traga até a ti o
momento mais oportuno para vocês falarem, para acertarem o que tiverem que
acertar!
-
Eu já deixei de acreditar no destino… - o seu tom de voz diminuiu drasticamente
e foi notória, a mágoa que o levou a adoptar uma pose altamente derrotada
-
Quem sabe se não foi o destino que te trouxe a Joana de volta…?
-
Quem sabe se não foi o destino que a roubou de mim?! – contradisse prontamente,
deixando que o seu olhar assoberbado por uma culpa grotesca que sentia, mas que
no entanto não era sua, recaísse ao olhar directo do segundo pai de Joana
-
Tenta ao menos ser razoável… Já é tardíssimo, e mesmo que quisesses procurá-la,
tenho a certeza que na recepção não te diriam o número do quarto dela, nem
qualquer outra pessoa! – elucidou-o, tentando levá-lo a ponderar melhor a
situação que tinha em mãos
-
Sim, nisso tens razão…
-
Vês? Ouve então o que eu te digo: Volta para o teu quarto e descansa… É o
melhor que tens a fazer neste momento! Depois falas com ela… Amanhã é outro
dia! – mais uma vez a sua complacência em prol de uma situação tão delicada
como era a de Ruben e Joana, veio ao de cima, zelando pelos sentimentos de
ambos, pois foi o único que provou dos dois lados da moeda, e melhor do que
ninguém sabia o quanto eles haviam sofrido com o fim tão ingrato daquela
relação
-
Está bem… - cedeu, seguindo o conselho sincero que lhe tinha sido oferecido
pelo colega de profissão e também por um grande amigo, que Rui não só já havia
mostrado, como também já havia provado ser – Mas amanhã falo com ela sem falta!
Sem mais rodeios ou contratempos!
-
Tenho a certeza que sim! E, Ruben, quero que saibas uma coisa… Além de seres um
bom profissional, és também um bom homem e tens todo o meu respeito! – com a
mão esquerda fisgada no bolso das calças, Rui elevou a direita e sobrepô-la ao
ombro de Ruben, apertando-o ligeiramente – Por isso, seja qual for o ponto da
situação que fique assente entre ti e a minha afilhada, eu vou apoiar-te, tanto
a ti como a ela, como sempre fiz…
Do
outro lado da porta, Sara continuara atenta a ouvir a conversa, até ao que
julgara ser o bastante. Fechou a porta com muito cuidado para não fazer surtir
qualquer ruído que a denunciasse, e assim que tombou de costas na mesma, um
perfeito “o” formou-se na sua boca, cobrindo-o depois com a mão. Estava
surpreendida, na verdade estava bastante surpreendida com tudo o que ouvira e
naquele momento não soube bem o que assibilar, mas se alguma dúvida ainda
restava de que ambos haviam conversado sobre Joana, a mesma tinha sido abolida
no instante em que escutara aquelas últimas palavras.
*****
Afadigada
pelas tantas voltas ter dado à cabeça na procura incessante de respostas, que
não tinham como chegar às suas mãos, Sara afastou os lençóis frescos de Verão,
que até então ainda lhe cobriam somente as pernas, e ergueu-se da cama, pronta
para começar um novo dia. Tomou um duche de dez minutos e vestiu uma roupinha
fresca tal como a época mais quente do ano o apelava, ficando desta maneira
pronta para sair e descer até ao rés-do-chão.
-
Wait! Hold the elevator, please! – gritou com a mão erguida no ar, iniciando
uma corrida frenética que só cessou na sua trespassagem pelas portas do
elevador, seguras pela mão do rapaz que atendeu o seu pedido – Thanks!
Num
gesto a que se já tinha habituado, esticou o indicador no ar para pressionar o
número do piso onde pretendia sair, mas este reteve-se no mesmo instante que os
seus olhos perceberam que a luzinha já estava acesa, tendo sido o botão premido
anteriormente.
Recuou
levemente afastando-se das portas, e quedou-se junto a uma parede do cubículo
oscilante. Pela primeira vez desde que entrara, conseguiu dar conta das pessoas
que seguiam consigo… Cinco, apenas, e todos eles homens, acompanhados cada um
por um saco de desporto enorme que seguravam ao ombro. Adivinhou rapidamente
que se tratavam de jogadores de futebol, que vira chegar na tarde do dia
anterior, e… Sim! No meio dos outros quatro, deslindou Ruben, que
acidentalmente conhecera há um par de horas, e que o qual mantinha uma conversa
amena e simultaneamente descontraída com um jogador de sotaque espanhol. Os
olhares dos dois cruzaram-se numa curtíssima fracção de segundos, e pôde dar
graças a Deus por ele não a ter reconhecido. Logo que o elevador terminou o seu
percurso, Sara saiu disparada, sem mais olhar para trás e seguiu o seu caminho
para o local de encontro, combinado com Joana que para variar, estava atrasada.
***
-
Desculpa a demora… Já estás aqui há muito tempo? – finalmente Joana deu um
sinal de si, aproximando-se a passo célere e de sorriso perfeitamente
implantado no rosto, desconhecedor de tudo aquilo que ainda a esperava
-
Olá, amor! Não, não muito… dez minutitos, p’raí! - Sara retribui o mesmo
sorriso, partilhando com ela dois beijinhos no rosto
-
Vamos então entrar?
-
Hum, hum! – acedeu uma resposta positiva, reforçada pelo oscilar da cabeça –
Vamos!
-
Onde queres ficar? – questionou, logo que enveredaram em simultâneo pelas
portas franqueadas do restaurante, procurando por uma opinião que também fosse
do seu agrado
-
Pode ser naquela ali, junto da janela? – sugeriu Sara, com o seu indicador bem
arrebitado no ar, apontando para uma mesa de quatro lugares bem apelativa junto
às airosas ventanas, que também ascendiam caminho à esplanada
-
Sim, claro! – os seus lábios retalharam um sorriso puramente afável, que nem
mesmo ela percebia como tão bem o conseguia forçar e manter tão naturalmente,
face aos dilemas que iam ressurgindo na sua vida a uma velocidade furiosa,
bofeteando-a sem pungir dó ou piedade
Com
a mala segura entre a palma das duas mãos, e antes de se apressar a dar um
passo na direcção do lugar pré-seleccionado, num gesto desprovido de qualquer
intenção maliciosa, vagarosamente o seu olhar varreu todo a zona, que àquelas
horas da manhã, não estava a ser tão frequentada como estaria provavelmente nas
duas horas seguintes. Mas, inesperadamente, as suas órbitas cruzaram e acabaram
por se fixar num único ponto daquele amplo espaço… Instalada na outra ponta do buffet,
encontrava-se toda a comitiva encarnada, distribuída maioritariamente em
grupinhos de seis pelas mesas aglomeradas a uma das extremidades. Até ao seu
olhar reconhecer o único homem que mexia consigo de uma maneira completamente
desproporcional, pelas mais diversas e melhores razões, foi uma questão de
instinto e místicos segundos. Na extrema lateral de uma mesa, frente a Javi e
ladeado por David, lá estava Ruben, que por entre uma conversa que à primeira
vista julgara bastante agradável visada pelos risos que se iam escutando de
parte a parte, desfrutava da primeira e mais reforçada refeição do dia, antes
do treino que já se adivinhava puxado e rigoroso para os rapazes. Foi então a
vez do seu interior se manifestar, por ver aquele quadro exposto na sua frente…
em grau ascendente, conseguiu sentir a sua pulsação por vergência do coração
que começou a bater mais forte e mais depressa, que nem um autêntico louco
atrevido, por talvez, ter reencontrado aquele que fora desde sempre o seu único
porto de conforto, amor e paz.
-
Ou então também podemos ir para a esplanada, se preferires… - apercebendo-se de
todas as atenções da melhor amiga, centralizadas somente num ponto que ela
enxergara no mesmo instante, ela voltara a opinar, de maneira a ver Joana
vitimada ao menor desconforto possível
-
Não, nós ficamos aqui! – finalmente os seus olhos fugiram do panorama onde,
principalmente focara aquele que fizera o seu pequeno mundo voltar a girar,
para assentarem nos Sara, acompanhados por uma resposta segura e irreversível
Foi
ela a tomar ordem de direcção até à mesa, repuxando a cadeira posicionada
estrategicamente no lado em que não pudesse vê-lo de frente… Não iria conseguir
aguentar todo o tempo da refeição sem pelo menos olhá-lo de realce umas quantas
vezes, para matar as saudades… para matar as saudades do rosto dele, da sua
simplicidade, dos seus sorrisos e da alegria, alegria essa, da qual ela não
fazia parte, não mais. Entalhou as alças da mala na cadeira que elegeu para sua
e sentou-se, já não ia voltar atrás na decisão que tomara voluntariamente.
-
O que é que queres comer, amor? – perguntou-lhe num tom afável, muito próprio
de Sara, sentada na sua frente e estendendo o guardanapo de pano no colo
-
Não sei, qualquer coisa… - parece que as ideias, bem como os apetites de Joana,
se tinham dispersado numa rápida fracção que lhe roubou a capacidade de pensar
direito, levando-a a encolher subtilmente os ombros de forma desprendida – O
que tu escolheres, para mim está bem!
Dez
minutos foram o tempo suficiente para fazer a escolha, solicitá-la ao empregado
e serem servidas pelo mesmo, guarnecendo este a mesa com as peças mais variadas
da fruta da época, um pratinho de croissants, uma jarra de sumo natural e um
bule de café bem forte.
Começaram
a comer sem um tema de conversa, que pudessem discutir. Não que não tivessem
nenhum ou que não soubessem o que falar, mas sim por não saberem como começar a
fazê-lo. Foi então que, depois de lançar um olhar à mesa do fundo pertencente
aos jogadores, e que passou completamente absorto da atenção prestada por
Joana, que Sara se armou de coragem em findar com o silêncio, talvez, na pior
das maneiras que o podia ter feito.
-
Ontem conheci o teu ex-namorado… - quebrou a camada de gelo que até à altura
envolvia o silêncio, lançado um comentário das conclusões que ela própria tinha
retirado depois da noite anterior, balbuciando-o com uma naturalidade peculiar
enquanto barrava uma pequena porção de compota frutada no seu croissant
-
Tu o quê? – as palavras saíram-lhe mais estranguladas do que esperava e o tom
elevou-se por si só, deixando que uma pequena dose do café que vertia sobre a
sua chávena, se declinasse inconsequentemente sobre a toalha imaculadamente
branca que revestia toda a mesa de pequeno-almoço – Bolas! – praguejou irritada
consigo própria, pelo descuido que não conseguiu evitar e tentando ensopar
depois, os sobejos da bebida com os guardanapos de papel oferecidos pelo
empregado
-
Quer dizer, não o conheci conheci…! Cruzámo-nos… - corrigiu-se, mostrando nos
lábios um sorriso desafiante e continuando a dar enredo a um tema, que iria ser
debatido entre ambas nos minutos seguintes
-
Do que é que estás a falar?
-
Daquele borracho ali ao fundo… - sujeitando-se a um simples acenar de cabeça
que foi rapidamente direcionado a Ruben, e fez com que o olhar de Joana o
acompanhasse, para se arrastar até ao fácies que lhe parecia mais perfeito do
que nunca, do homem que foi capaz de conquistar novamente o seu coração
-
O Ruben… - proferiu o nome dele num sussurro esvoaçante, enquanto ainda o
mantinha focado bem no ponto fulcral de um mundo que voltara a querer chamar de
seu
-
Já sei quem ele é… Agora sei (!) E sim, já me tinhas contado as razões pelas
quais que te mudaste para Nova Iorque, e que tinhas deixado o teu namorado
pelas razões que também já sei! – enumerou calmamente, testemunhando todos os
pontos mais relevantes, sucintos na vida da sua melhor amiga, que desde o
início estivera a par – Mas não fazia ideia que ele era um futebolista famoso e
ainda por cima, é próximo da tua família… Porque não me contaste nada antes?
-
Eu ia contar-te… - ela voltou a rodar levemente o rosto, mas desta vez para
expô-lo na frente do de Sara – Era sobre esse assunto que queria falar contigo!
-
Então, então espera… Foi por causa dele que ontem ficaste daquela maneira? Que
reagiste daquela forma? – uma nova expressão tomou conta dos reflexos
traduzidos no rosto dela, por duas finas linhas traçadas na testa e o vergar
das sobrancelhas, que lhe revelaram o seu novo estado de estranheza e
curiosidade – Não querias que ele te visse, foi isso?
-
Não foi bem isso, quer dizer, talvez até tenha sido… Ai, já não sei! – na ordem
de palavras contraditas, Joana deixou-se emaranhar na confusão de pensamentos e
ideias que até altura tinha dado como lúcidos na sua cabeça, mas que agora não
passavam de simples controvérsias – As coisas tinham mudado muito quando
regressei a Portugal e o voltei a encontrar… Já nada era como dantes, algo que
eu não tivesse já à espera claro, mas até mesmo ele estava mudado… muito! – ela
suspirou pesadamente, sabia que ia voltar a tocar na ferida, que em nome do
destino fora reaberta – É uma história longa e complicada, Sara!
-
Eu não vou a lado nenhum… – disposta a ouvir tudo o que nos últimos meses lhe
tinha sido ocultado, Sara predispôs o seu croissant sobre um pratinho,
interrompendo por instantes a sua refeição – Tenho todo o tempo do mundo para
ouvi-la!
-
Eu não sei se… - redutível a adiar aquela conversa por mais algum tempo, Joana
mostrou-se hesitante em começa-la, algo que Sara se apressou a contrariar
-
Joana, conta-me… Por favor! – quase que suplicou, convicta a ouvir a sua
história, de maneira a ajuda-la a pelo menos amenizar todas as dores e mágoas
dissipadas no coração, deixadas pelos destroços insustentáveis de um passado
-
Então foi assim… - uma respiração temorizada soltou-se dos seus pulmões, para
dar então início a uma narrativa que se mostrava difícil de ser ditada
Embora
houvesse alturas em que as palavras lhe custassem mais a sair, devido às várias
situações e conflitos que debatera com ele, Joana acabou por lhe contar tudo o
que havia para saber. Desde o desprezo, facultado por todo o desgosto com que
Ruben a tinha recebido quando a voltara a reencontrar pela primeira vez no Caixa,
no fim de mais um dia de treino, até às últimas palavras por ele preferidas,
nas garagens do Colombo daquela tarde.
Do
princípio até ao fim, Sara manteve-se o mais atenta possível a ouvi-la, mas não
evitando interrompê-la algumas vezes, de maneira a esclarecer-se o mais que
pudesse e conseguisse, e mostrando uma nova expressividade a cada nova vírgula
e parágrafo acrescentado ao relato prescrito de um coração perdido.
-
Então e agora, o que está a pensar fazer? – não se demorou a perguntar, logo
que os largos minutos que Joana disponibilizara a falar, cessaram
-
É essa mesma pergunta que eu faço a mim mesma, todos os dias quando acordo! –
um leve sorriso demarcado por toda a falta de alento que sentia, pungiu-se no
berço da sua boca, não deslocando por um segundo, o olhar das mãos que tinha
pousadas no seu colo – Talvez não tenha que fazer nada… Prefiro deixar tudo
exactamente como está, do que levantar ainda mais véus que não quer ser
desfechados!
-
Mas o que é que sentes realmente? Voltaste-te a apaixonar por ele? É isso que
estás a querer dizer?
-
Eu não estou a querer dizer nada, Sara… E se não te importares, eu vou saltar
essa pergunta! – não que não soubesse já a resposta, como é evidente e está bem
claro para todos, mas prenunciá-la com todas as letrinhas para uma outra
pessoa, tornaria esse sentimento mais real, mais verdadeiro, e isso Joana ainda
não estava disposta a fazer… assim como não estava disposta a magoar-se de novo
-
Tu vê lá o que arranjas para a tua vida, amor! O tipo até pode ser bem giro e
interessante, mas vai casar! – era este o outro lado de Sara… embora fosse uma
mulher também apaixonada, bem como um porto seguro de carinho e paz que Joana
poderia sempre encontrar nela, o seu forte racionalismo fazia-se vencer pela
maioria das vezes, na batalha mais difícil de travar: a do amor
-
Não ouviste o que eu disse? O Ruben deu um tempo ao noivado… Pode muito bem não
chegar a casar! – ripostou, não preparada o suficiente para crer e se
consciencializar, da verdade que mais lhe custava ouvir, mas que de qualquer
das maneiras ela teria de saber respeitar
-
E tu acreditas nisso? Se ele não quisesse casar, acabava logo com tudo de uma
vez e pronto!
-
Talvez esteja só confuso… - disse sucintamente, tentando dar justificação
àquilo que não conseguia aceitar, mas que Sara fez questão de deixar bem claro
-
Confuso? Confuso com o quê, Joana? – um risinho de incerto sarcasmo foi solto
entre a abertura dos seus lábios naquele instante, provocando ainda mais
incertezas em destorço da pobre amiga
-
Ouve, eu não quero continuar a ter esta conversa, está bem? Com tudo isto já
tenho a cabeça às voltas, e tu não estás a ajudar! – ultimou, numa convicção
forte, porém triste, que não dava espaço a perguntas às quais ela não tinha
como, nem se sentia capaz a responder
-
Pronto, desculpa… - num tom de voz culposo, Sara reconheceu que não deveria ter
dito tudo aquilo à queima-roupa, quando a amiga ainda se mostrava tão frágil e
insegura perante toda aquela situação – Mas tu já sabes como eu sou! Fico
sempre de pé atrás quando ainda não conheço bem uma pessoa o suficiente para
poder confiar nela! E sou frontal… bem, às vezes até frontal de mais, mas
quando o tenho dizer digo e pronto!
-
Tudo bem, Sara… Já percebi!
-
Eu só estou a tentar zelar pelo teu bem … Não quero que te magoes! – a sua mão
deslizou sobre a mesa e só travou quando apertou a de Joana, tentando
transmitir-lhe o máximo de ânimo possível, gesto ao qual ela respondeu com um
suave e discreto sorriso, amostra de desculpas aceites
Sem
mais tocarem no assunto, deram finalmente continuação à mais importante
refeição de todo o dia, mas foi algo que ainda não tinha sido esclarecido, que
obrigou Joana a decair e voltar a página já virada, procurando uma explicação
em Sara, que com certeza não seria difícil de ser dada.
-
É verdade… Ainda não me disseste com descobriste o… Ruben... – inquiriu,
tentando trespassar a maior normalidade, que no fundo não detinha, estendendo o
corpo sobre a mesa de forma a alcançar uma peça de fruta
-
Acho que foi mais ele que me descobriu a mim…
-
Como assim?
-
Então, parece que os jogadores estão instalados no mesmo andar que eu, e ontem
à noite quando ia para o meu quarto, não sei bem de onde é que ele apareceu,
mas a verdade é que chocou contra mim! Entretanto apareceu o teu padrinho, eles
ficaram a falar e pelo que os meus ouvidos perceberam, o tema da conversa eras
tu… - explicou calmamente, pousando seu o copo de sumo já vazio sobre a mesa,
no qual acabara de dar o último trago – E daí até descobrir que era ele o teu
ex, foi uma questão de saber encaixar as peças do puzzle.
-
Espera, espera… - o seu indicador ergueu-se no ar, em prepotência de um ponto
que ficara para trás e não fora devidamente esclarecido – Disseste que o Ruben
e o meu padrinho ficaram a falar sobre mim?
-
Hum, hum! E pelo que eu também percebi, ele ia a ver de ti, o teu padrinho é
que o impediu! – acrescentou, fazendo aumentar em Joana, somente a intriga e
admiração – E se ainda não estas disposta a encará-lo, sinceramente, se eu
fosse a ti preparava-me, porque quando o Ruben conseguir a oportunidade
perfeita, vai procurar-te e vai querer falar contigo!
Ao
ouvir tal discurso, um pequeno mas forte aperto no peito, suprimiu os
batimentos cardíacos de Joana, que por uma fracção de segundos lhe roubou uma
qualquer reacção de resposta. Não foi capaz de verbalizar nada assim como
também não perguntou rigorosamente nada. Quedou-se em silêncio e concentrou-se
unicamente em si… Pressentia que de alguma maneira, seriam as respostas a virem
ter consigo e não o contrário, e isso iria acontecer brevemente… Muito
brevemente e muito mais cedo do que todos esperavam.
Sentados
à mesa na outra ponta da sala, ainda permaneciam os jogadores, compartilhando
durante todo o tempo, conversas ligeiras e sobretudo desanuviadoras, que sempre
encontravam como refugio para, por vezes, fugir à fadiga psicológica do
trabalho no entanto já antecipando o fim da refeição.
-
Já viu quem tá ali? – murmurou num segredo recatado, David, que lançou ao
ouvido de Ruben, sem tirar uma única vez os olhos ao corpo da mulher que logo à
primeira vista, sabia pertencer a Joana
-
Onde? – menos discreta foi a pergunta imediata de Ruben, intencionada por todos
os seus sentidos que deram prontamente o alerta
-
Tente ser discreto e não dê bandeira pra ninguém topar… - avisou-o
primeiramente, antes que os amigos e colegas de profissão que também se
encontravam na mesa junto deles, se apercebessem da pequena novidade presente
no restaurante – Olha ali naquela mesa do fundo, sentada na frente da moça
loira…
Os
seus olhos seguiram então o caminho oblíquo traçado pelos de David, e somente
findaram aquela procura, quando assentaram no conforto da inesperada mas
perfeita imagem que tinha perante si. Até à altura ainda não dera pela presença
da mulher de que agora estava certo ser a única possuidora do trinco secreto
para a sua felicidade, e foi-lhe inevitável controlar agitação desregulada e
contida no lado esquerdo do peito, quando o seu coração que havia decidido por
ele cacetear todo o sangue nas veias com toda a força, como um doido
desmesurado. Sorriu. Sorriu pela primeira vez naquele dia, com um rasgo de
lábios sublime e verdadeiramente esperançoso, de ver cada vez mais perto de si,
a oportunidade de voltar a ser feliz.
-
É a Joana… - confirmou tanto a si como a David, não se conseguindo livrar
daquele sorriso pelo qual era tão bem conhecido entre todos
-
É… Parece que é ela me’mo! – gracejou, mastigando a última dentada que dera na
maçã polida pelo vermelho da madurez, que segurava entre o indicador e polegar,
prosseguindo depois com o seu discurso – Ontem caí na cama e ferrei no sono…
nem dei conta de cê voltar no quarto! Consigo falar com ela?
-
Não! – respondeu sem meios rodeios, dando depois um sorvo na sua chávena de
café
-
Não? Como não? – uma lividez de estranheza, apoderou-se do tom de voz de David
que se tornou incrivelmente mais agudo, por esperar a consolidação da relação
dos dois amigos mais próximos, algo que para sua surpresa, não se veio a
suceder
-
Puto, passa-me o prato das torradas, se faz favor! – pediu educadamente a Savi,
tendo este o pratinho mesmo na sua frente
- ¿Qué? –
numa expressão engraçada de uma ignorância pacífica, Savi naturalmente não
havia percebido o pedido de Ruben, que ao contrário do que se esperava, não
tardou em ser atendido ainda assim
- Deixa
estar, não te incomodes… - ripostou numa clara locução de um gozo teatral, que
levou os rapazes que estavam na mesma mesa e que se aperceberam da interjeição,
a gargalhar levemente, para depois se levantar ligeiramente e esticar o braço
sobre a mesa, para chegar assim às torradas – E não, não falámos porque
entretanto o Rui apareceu e já não deu pra ir procura-la! – respondeu
serenamente a David, logo assim que teve oportunidade e não se mostrando tão
afligido com seria esperado da sua parte, pelo tão desejado encontro, que fora
adiado uma vez mais
- Cês não
falaram, não se acertaram, e você tá aí assim… Numa boa?
- Sim…
Porque razão não haveria de estar? – aquela pacificidade toda e a descontracção
que chegava até mesmo ser irritante, estavam a deixar David ligeiramente
arreliado, face à troca da urgência que Ruben lhe mostrara em querer esclarecer
tudo com Joana, na noite anterior, pela calma que o havia apoderado por
completo
- Porque é
que tenho a sensação que não tá contando tudo? Cê tá escondendo alguma coisa,
manz…!
- Oh, lá
estás tu com as tuas cenas do sexto sentido… Deixa isso para as gajas, puto! –
espicaçou, fazendo vir ao de cima mais um momento facultado pela sua boa
disposição, e fazendo embater levemente as costas da sua mão direita no peito
de David
- Ah, não…
Eu conheço essa sua expressão, velho!
- Qual
expressão?
- Essa que
tá fazendo agora! – asseverou com toda a certeza que tinha e olhando-o
detalhadamente o rosto do melhor amigo, denunciante das suas intenções – Cê tá
com cara de quem vai aprontar alguma coisa!
-
Oh David, relaxa, está bem? Eu não vou fazer nada… - afirmou, dando a primeira
dentada na torrada crocante, barrada com uma fina camada de manteiga
-
Não vai fazer nada? Nem tentar falar com a Joana?
-
Não te preocupes, hoje é um longo dia e eu vou falar com ela, disso podes ter a
certeza! – aquela segurança, aquela firmeza… David sabia que Ruben tinha um
trunfo debaixo da manga, e tinha a certeza de ser esse o trunfo que de uma maneira ou de outra, o levaria até
Joana
-
No que cê tá pensando, manz?
-
Tem calma… A seu tempo saberás! – declarou com convicção, e ergueu o braço no
ar de forma a chamar a atenção de um dos empregados que circulava as mesas
naquela zona – Escuse me! May you came here just a second, please?
***
- Calaste-te de repente … O que é que se passa? – perguntou Sara num livor de
preocupação, na mesa que unicamente estava destinada a si e à sua melhor amiga,
onde o pequeno-almoço partilhado por ambas ainda prosseguia, agora
estranhamente mais contido e reservado do que antes – Ainda estás a pensar no
que o Ruben quererá falar contigo?
-
Também… - respondeu simplesmente, de olhar preso e simultaneamente inerte sobre
a paisagem imensa, trespassada para lá dos vidros da janela colossal
-
Também?! Anda aí mais alguma coisa atormentar essa cabecinha?
-
Estava a pensar no meu pai…
-
Ui, pensamento oriundo desse senhor, estou mesmo a ver que não deve ser coisa
boa! – as palavras fugiram-lhe pela boca, e por mais que quisesse foi
impossível contê-las, finalmente a atenção de Joana presa noutro lugar, voltou,
e os seus olhos fixaram somente os de Sara – Amor, desculpa… Eu sei apesar de
tudo ele é teu pai, e não era bem isso que eu queria dizer, desculpa!
-
Ontem conversámos um pouco e ele disse uma coisa que me deixou a pensar…
-
E que coisa foi essa?
-
Ele disse-me… - pausou, reflectindo sobre o assunto uma última uma vez, e
abeirando levemente o seu corpo à mesa, um pouco mais – Ele disse-me e jurou a
pés juntos que foi ao funeral da minha mãe… Que esteve lá!
-
Oh, isso é impossível! – Sara arremessou o rosto para o lado naquele instante,
totalmente irredutível a negar o que ouvira, por todas as razões óbvias – Se
realmente ele estivesse lá estado, tinha-se aproximado, deixava que todos o
vissem, ia falar contigo... ou não?
-
Pois, foi o que eu também pensei no mesmo instante em que ele disse isso, mas
depois…
-
Depois… - imitou, desta feita numa voz mais arrastada, claramente um sinal de
incentivo a continuar
-
Tu lembras-te de quando eu saí a meio do enterro? Que até tu e o Will foram à
minha procura e me encontraram junto do portão do cemitério… - iniciou, embora
pudesse vir a estar errada, o seu intento era apenas o de levar aquela conversa
até a uma devida conclusão
-
Ah… Sim, lembro… - afirmou, num prenúncio um quanto incerto, mas o qual veio a
ser reforçado poucos momentos depois – Que quando chegámos lá, vimos-te a olhar
para um homem que disseste ser-te familiar?
-
Sim! Exactamente…
****
- Mas o que raio te passou pela cabeça para desapareceres assim? – era
William, que domado pela preocupação que por momentos o reprimiu, se deixara
levar por um tom mais austero e significativo, que no entanto não era nada seu
Sara vinha ladeada por ele, com quem também partilhava da mesma
preocupação, e chegando junto a Joana que continuava subjugada a forças que a
obrigavam a manter a sua atenção focada num outro lugar, algures a uns metros
de distância do portão forjado do cemitério, onde permanecia.
- Desculpem… - pediu, sem dizer rigorosamente nada, pois continuava
entorpecida a tentar adivinhar quem era aquele homem
- Joana, passa-se alguma
coisa? – foi agora a vez de Sara interroga-la, pousando as suas mãos nos ombros
da amiga
- Aquele homem ali… - indicou,
servindo-se de trejeito com a cabeça posicionado na direcção dele
- O que tem?
- Não sei, mas acho que não me
é totalmente alheio… parece que o conheço de algum lado. – presumiu, sem nunca
se abstrair daquela figura, que embora não soubesse, lhe era bem conhecida e
muito, muito próxima
- Estranho, acho que nunca o
vi! – indagou Will
- Pois, provavelmente eu
também não e só estou pra’qui a divagar… a criar macaquinhos na minha cabeça! –
fez uma breve pausa para olhá-los uma primeira vez – Quero ir para casa…
****
-
Então quer dizer que esse homem que vimos, era o teu pai?
-
Não sei, eu não sei… Mas o que é certo é que quanto mais penso no assunto, com
mais certezas fico de que era mesmo ele! – concluiu num olhar pesado, deixando
que um suspiro contundente levasse o seu corpo a extasiar-se na cadeira
- I’m sorry for interrupting you… Miss? – numa pose comedida e extraordinariamente educada, um
dos empregado da zona de restauração, aproximou-se delicadamente da mesa delas,
solicitando somente a atenção de Joana
-
Yeah? – aclamou, logo que o seu olhar singular percorreu de uma só consumada,
toda a figura polidamente trajada do jovem empregado
-
Ah… Sent me give you this note! - o seu braço tornou-se perpendicular ao corpo,
assim que estendido na chefia dela,
segurando entre dois dedos um pequeno papel dobrado a uma só volta
-
It’s… for… me? – inquiriu intermitentemente, oscilando o olhar entre o
semblante do pobre rapaz, que se servira agora como capacho, e o bilhetinho que
ainda não tomara para si – Are you sure?
- Yes, miss, it’s for you… I’m
pretty sure!
-
Who sent this? – o seu olhar fora agora dirigido a Sara, na expectativa de
obter uma resposta para aquela situação que estava com certeza, fora dos seus
planeamentos, mas esta muito menos sabia, como já seria de esperar
-
Ah… - procurando o responsável pelo pedido que há curtos instantes lhe havia
feito, o rapaz observou toda a zona disposta à sua retaguarda – Was that
getleman, over there, who is siting in the background! – o seu indicador
alteou-se de forma discreta, e apontou sem margem para erros, Ruben, que agora
se mostrava alheio ao panorama que ele próprio ministrara
-
Thank you! – forçando um sorriso grato, Joana tomou na sua mão o bilhete, no
qual estava prescrito um conteúdo, que ela desconhecia na sua totalidade… ainda
-
Escuse me! – numa pequena vénia feita com uma mão à frente e outra atrás do
tronco, o empregado de mesa acabou por se retirar, deixando no ar uma enchente
de incógnitas que bem mais cedo, acabaram por ser desmanteladas assim que ela
reuniu o alento necessário, para começar a ler o pequeno manuscrito que já
tinha encetado entre as mãos
“Lembras-te
daquele nosso final de tarde no Colombo, quando te convidei para irmos comer
sushi, mas tu feita teimosa disseste que não? Pois é, se te lembras disso
também te deves lembrar que me prometeste que ficava para uma próxima e não
sei, digo eu, mas parece-me que essa ‘próxima’ chegou e está na altura de eu
cobrá-la… O que te parece?
Vem
jantar comigo esta noite, e não vou aceitar um não como resposta... olha que às
vezes, mas só mesmo às vezes, consigo ser mais teimoso e persistente do que tu!
Espero
por ti às 21h no átrio principal, não te atrases com a escolha do vestido.
R.A.”
-
O que é isso? O que está aí escrito? – Sara não se conseguiu evitar, e ao fim
de um tempo, volutado ainda sim, que passara a olhar entre o sorriso
irrevogavelmente apaixonado de Joana e a pequena folha de papel, deixou que a
curiosidade e impaciência falassem por si
-
Eu tenho de ir… – declarou numa só respiração, arrumando o bilhetinho dentro da
sua mala, e levantando-se do seu lugar logo de seguida
-
Espera, onde é que vais? – vergando o sobrolho um arcada imaculável,
mostrou-lhe um ar notavelmente confuso, pela segunda saída abrupta e tomada sem
grandes explicações, que Joana perfizera em dois únicos dias – E tira esse
sorriso tolinho da cara… Não me contas nada e dessa maneira estás a deixar-me
ainda mais curiosa!
-
Não te preocupes, depois conto-te tudo! – um solene piscar de olho promitente
tremeluziu, e Sara automaticamente serenou certa de que mais tarde, quando
Joana acha-se ser a melhor altura, ela iria ficar a par – Mas agora vou indo…
Acho que vou tirar umas fotografias por aí, depois uma caminhada pelo areal,
talvez um mergulho… Preciso de dar uma volta, apanhar ar!
-
Até ia contigo, mas já tenho marcada um aula de body combate, mais daqui
a pouco no ginásio! Para além de que o dia de hoje não convida muito a saídas…
Não tarda e vem aí uma chuvada daquelas!
-
Oh já sabes como é este clima… De manhã o céu até pode estar nublado e correr
um friozinho, mas à tarde o sol já aparece para ficar!
-
Então vai, vai lá… Aproveita e espairece um pouco para meteres essas
ideiazinhas todas em ordem… Quero ver-te bem! – encorajou-a num sorriso muito
meigo, que Joana soube imediatamente guardar no lado esquerdo do peito
-
E eu vou ficar… Preciso do meu espaço e de um pouco de tempo, mas vou ficar
bem! – falou como forma de sossegá-la e convencê-la que melhores dias estariam
ainda para vir, mas principalmente de forma a convencer-se a si mesma, que
ainda havia uma força de esperança em que acreditar – Bem, até logo! –
gracejou, mandando-lhe um beijinho pelo ar que foi soprado sob a palma da mão
Um
burburinho disperso no fundo da sala, pelo misto de sotaques pronunciantes,
denunciador do fim do pequeno-almoço e da a retirada dos jogadores para os
campos de treino, fê-la atravessar o corredor até à porta de saída, o mais
discreta, mas aceleradamente que conseguiu, para passar assim despercebida, mas
no entanto nem isso lhe valeu. Perante toda a agitação Ruben ainda a viu
escapulir-se por entre outros hospedes que davam a sua entrada, mas nada
fizera em relação a ela… e o que é certo também, é que mesmo se tivesse sido
essa a sua vontade, Joana não lhe dera qualquer escape de tempo para que ele
reagisse e tomasse assim uma atitude.
Subiu
no elevador até ao andar que lhe estava destinado e assim que abriu a porta da
sua suíte e a trancou, atirou a mala para cima da cama, tendo sido depois ela,
a tomar a mesma acção. Pensou, pensou muito e durante muito tempo, em tudo o
que a vida lhe conferia… Pensou na relação de um ano e meio que manteve com o
homem da sua vida, pensou no fim da mesma e com isso todos os dissabores que se
seguiram… Pensou na separação dos pais, da sua vida em Nova Iorque, na morte da
mãe, no seu regresso e no fim o seu pensamento centralizou e despendeu-se
unicamente numa pessoa: Ruben. Nem poderia ser de outra maneira. Com isso os
ponteiros do relógio anteciparam-se de uma maneira descomunal, que não esteve a
seu ver. O tempo deixou-se passar então, trazendo com ele um destino traçado, a
que dois corações não poderiam fugir…
***
Acordou
já poucos minutos faltavam para o meio-dia, adormecera embrenhada à leitura dos
quatro capítulos seguintes, do terceiro livro da saga de Philippa Gregory, uma
das suas escritoras predilectas.
Levantou-se
da cama, arrumou o livro marcado na página onde ira dar a continuação, sob uma
das mesinhas de cabeceira, e correu para o armário escolhendo um novo conjunto
de roupa que a iria acompanhar no passeio que já havia engendrado somente para
si naquela manhã. Amarrou os longos cabelos num coque no cimo da nuca e atou
um lenço vermelho estampado que lhe segurou a franja, dando-lhe um pequeno nó
numa lateral da cabeça. Arrumou a sua máquina fotográfica na bolsa adequada e
depois guardou-a na mochilinha negra que iria levar às costas durante todo o
percurso. Perfumou-se, encaixou os óculos de sol escuros na cana do nariz e
saiu para um mundo que a aguardava majestosamente do lado de fora.
Embora
um manto negro e denso atulhasse todo o azul dos céus, um ar extremamente
quente e pesado viandava por toda a cidade, e era naquela zona, a mais acercada
das praias, que esse clima funesto mais se fazia sentir.
Caminhou
durante largos minutos entre os quarteirões das redondezas, preferindo fazer
todo o percurso a pé, pois se não fosse dessa forma, nem desfrutaria da mesma
maneira… Aproveitou então para se dedicar a uma das suas grandes paixões, que apesar
do ser, nem sempre tinha disponibilidade para dedicar muito do seu tempo, tanto
quanto o que gostaria: a fotografia. De mochila enlaçada aos ombros e de câmara
sempre pronta a disparar entre as mãos, fotografou de tudo um pouco, para mais
tarde ver e recordar. Desde moradores locais e turistas, a monumentos
emblemáticos, exposições de arte em plena rua e paisagens lindíssimas,
potenciais inspiradoras a qualquer enamorado. E no fim restou-lhe o último
lugar de destino, a sua e já mais olvidada, adoração, que ficava a cerca de uma
hora do hotel e a vinte minutos do local onde se encontrava, e que já se conseguia
adivinhar qual seria.
***
Ao
fim de uma manhã condicionada às ordens de um treino rigoroso com a equipa,
Ruben teve a ensejo de aproveitar o pouco mais de duas horas de almoço, para se
dedicar inteiramente a um passeio pela cidade, que estava deliberado pela
passagem num único lugar que ao fim de três anos lhe trazia tantas e tão boas
recordações, bem como as saudades que o tempo não levou… Aquele que havia
elegido por si como a sua praia e de não só.
Parou
no bar para se refrescar com uma bebida energética e lançou-se ao mar, onde
dera alguns mergulhos e umas quantas braçadas que o deixaram sem dúvida mais
relaxado, mas a dor do pensamento balizada pelas saudades do coração, essa
ainda continuava lá, e só dando sinais de uma saída definitiva, quando tivesse
de volta a sua pequena mulher nos braços.
Voltou
ao areal quando já vencido pelo cansaço a que ele próprio se colmatara,
embrulhou-se na sua toalha para resistir ao ar glacial que as correntes traziam
e lhe provocavam calafrios. O seu olhar seguiu o enfiamento do horizonte e
arrastou-se pela linha da praia… A sua boca entreabriu-se de pasmo e uma só
imagem formara-se lá ao fundo, ainda longe do seu alcance. “Não pode ser…!”.
-
Is yours? – perguntou a doce Joana a um miudinho com pouco mais de quatro anos,
que numa brincadeira compartilhada com outras duas crianças mais ou menos da
sua idade, deixara que a sua bola de praia se arrastasse até aos pés dela, que
caminhavam descalços levemente sob o areal branco
Numa
timidez amorável, o pequenito apenas acenou brevemente com a cabeça num claro
sinal afirmativo, que escondia um sorriso atadinho de pura brincadeira e
inocência, muito natural da sua tenra idade.
-
Take it, then! – agachou o seu corpo até ficar próxima da altura dele, e
mostrou-lhe numa só mão a bola listrada com a cor vermelha e translúcido
-
Thank you! – agradeceu numa vozinha decadente, mas ainda assim muito doce,
momento em que tomou o objecto proporcionador de momentos de divertimento e
brincadeira, de volta para si
-
Go… Go play with your friends, honey! – encorajou-o num sorriso embelecido,
muito característico seu, quando se sentia enfeitiçada pela pureza e
genuinidade das crianças, que foram desde sempre os serezinhos mais venerados
pelo ela, despenteando-lhe levemente o cabelo escuro entre os seus dedos e
vendo-o depois correr desalmadamente na direcção contrária, onde se junto à
família que já o aguardava
Voltou
a erguer-se e aí, de corpo hirto e voltado para o oceano, o seu olhar
remontou-se avultadamente sobre o mar imenso, que se despendia até ao fundo
horizonte. De olhos fechados inspirou a brisa que a maresia arrastava até si e
uma embriaguez de memórias voltou a roubar-lhe a aptidão de seguir em frente
com a sua vida, de uma vez, e sem cair no erro crucial de olhar para trás,
chorar e lamentar o tempo perdido.
Foi
numa reflexão espontânea, que deixou cair sobre o areal a pequena mochila,
roupa e ténis, caminhando e mergulhando por fim, no meio das águas claras e
imensas. Nadou calmamente e deixou por vezes que as pequenas ondas
balanceassem o seu corpo… Usufruiu daquele momento a seu belo prazer, o quanto
pôde, para após sensíveis minutos, regressar à zona onde deixara os seus
pertences.
-
Bolas, não trouxe toalha! – praguejou num jeito de represália a si mesma, pelo
facto eminente de esquecimento, pelo que só tão tarde dera conta
Fora
da água estava bem mais frio, e a corrente de ar, agora arrefecida que a
marejada arrastava, conferiam os complementos necessários para que arrepios
contínuos e pequenos tremores percorressem todo o seu corpo, resguardado apenas
por um mendinho bikini. Foi então que abraçada ao próprio corpo, o seu olhar
percorreu toda a zona, povoada ainda assim por algumas pessoas ali e acolá,
desfrutando também de um dia, que apesar de não ter nascido com porte figurino
do sol, não fora motivo suficiente para não as levar ali.
Ele
não foi capaz de parar de observá-la e foi indeclinável não sorrir embevecidamente…
Sorrir sim, porque depois de tudo, depois de tudo a que foram obrigados a
passar longe um do outro, depois de todas as discussões, de todas as lágrimas,
depois de toda a dor da ausência um do outro, agora ambos estavam ali,
exactamente no mesmo lugar onde já haviam sido tão felizes. Tal como lhe
dissera Rui na noite anterior, foi mesmo o destino que acabara de levar até si
a oportunidade perfeita de voltar atrás, apagar o ponto final que fora imposto
por uma calamidade e reescrever aquela história que poderia ter agora a sua
continuação, sem comos nem porquês, apenas descrita pelos com sorrisos, pelos
beijos e principalmente pelos muitos momentos de amor que ainda estariam para
vir.
- Que bela surpresa… - sussurrou-lhe
enternecidamente ao ouvido, assim que pé ante pé surgira nas costas dela, sem
claro, deixar que o visse primeiro
Mais
do que alguma vez, Joana sentira cada grãozinho de areia escapulir-se por baixo
dos seus pés. O seu corpo tremeu intempestivamente e aquela voz que durante tanto
tempo lhe soara como uma melodia, fizera-a fraquejar e contrair-se sobre si
mesma como uma pequena criança amedrontada. E amedrontada também com o que
pudesse vir a descobrir… rodou sobre os seus pés, muito pausadamente, vendo
depois, o corpo mais belo que alguma vez tivera o prazer de tocar. Ruben
mantinha-se invicto bem na sua frontaria, e de sorriso bem demarcado no seu
rosto mais jovial e rejuvenescido de que nunca, levando a que o olhar dela
percorre-se todo o seu corpo, com uma veracidade que há muito fora corroída
pelo desgaste do tempo.
Sem
ainda nada dizer, o olhar de Joana deslindou todas as gotas de água salgada que
declinavam, pela força da gravidade, todo o seu tronco vincadamente torneado
pelas horas de treino intensivo e passagens individuais pelo ginásio… Vira
também pela primeira vez, a enorme tatuagem que lhe marcava a pele desde o
ombro até à dobra do antebraço. Vira e revira todos os traços que a sua memória
traiçoeira já não a deixava recordar e pela primeira vez, ao olhar o rosto dele,
que até então se mostrava impávido e sereno enquanto a contemplava da mesma
forma, que também um sorriso lindo e assoberbado da felicidade que se
adivinhava, lhe preencheu o rosto pueril na sua totalidade.
-
Ruben… - nada mais saíra do que o nome, pois encontrava-se de uma maneira
confusa tal, que não conseguiu compelir uma melhor saudação, uma que ele
merece-se
-
Estás a tremer… Tens frio? – num único vislumbre, intencionado sem quaisquer
segundas intenções, Ruben desvendou-lhe todos os tremores por completo, naquele
corpinho, nunca antes tão desprotegido como agora
-
Sim, mas isto já passa… - assegurou por entre um sorriso lisonjeiro, no entanto
inseguro, que lhe demarcou os lábios tenuemente arroxeados – Esqueci-me da
toalha, mas quando enxugar já me volto a vestir e fico bem!
-
Podes utilizar a minha… - ofereceu amavelmente, sentindo em si a forte
necessidade de a proteger, apesar de todos os factores inconclusos que ainda
formavam barreira a separá-los
-
Não, deixa estar, eu já fico bem… Obrigada! – recusou de forma educada, sendo
traída logo de seguida por uma aragem incrivelmente fria, que a levou a
estremecer num só abalo fundado pelas forças da natureza, levando-a a tremelear
freneticamente
-
Não, não vais ficar bem… Vais é ficar doente, se não deixares de ser uma
teimosona orgulhosa! – a sua persistência perante uma situação tão banal,
revelou-lhe toda a preocupação que escondia dentro de si, pela segurança e bem
estar de Joana – Eu insisto!
-
Mas assim vais ficar tu com frio…! – ripostou numa moafa engraçadamente
carinhosa, não declarando cedência às vontades dele, que ainda assim acabaram
por se mostrar bem mais determinadas do que espera
-
A minha toalha é enorme… suficiente para nós os dois! Vem cá… – sem lhe deixar
outra saída para continuar naquela recusa, ele alcançou-lhe a mão, mas Joana
continuava decidida a não vergar a uma proximidade tão comprometedora como
seria aquela, mantendo fincado o pé no chão
-
Ruben, não acho que devêssemos…
-
Shiu, eu é que sei! – calou-a ao puxá-la para si, procurando o olhar dela com o
seu, de maneira a provar-lhe que não havia nada que pudesse temer, nada que
estivesse tão certo como aquele toque que estava prestes a acontecer – É só um
pouco até te aqueceres… Não te preocupes, está bem?
Um
abraço forte e carregado por todo carinho que nutriam um pelo outro, seguiusse.
Ruben puxou-a uma vez mais, não permitindo que um afastamento, por mais ínfimo
que fosse, a mantivesse longe de si, e cobriu-a com a toalha de que também
fazia uso. Um pequeno e curto embate corpo contra corpo, pele contra pele, deu
a derrocada a uma avalanche de sensações indescritíveis, que certamente, Joana
tão cedo não iria esquecer. E em sinal de inegável entrega, os seus braços
não resistiram àquele toque e contornaram-lhe o tronco, quase na sua totalidade,
quando Ruben manteve também essa tão agradável proximidade com os seus membros
superiores a tornearem os ombros dela e penderam sob as costas. Joana encostou
mansamente a face ao peito esguio e ainda humedecido dele, e por momentos
ouviu, tanto quanto sentiu, um bater desmesurado do coração. Uma amálgama de
cheiros unificou-se então, oriundo de ambos os perfumes, que envoltos em todos
os aromas que a maresia oferecia, conferiam uma nova essência, e que puderam em
silêncio, deliciar-se com novo eflúvio que abundava ambos os corpos e de que
agora partilhavam.
-
Porque é que ontem fugiste de mim? Porque é que me olhaste daquela maneira e
depois me viraste a cara, como se eu fosse um qualquer? – sem levantar qualquer
exaltação de qualquer parte, Ruben falou a olhar o mar que se estendia à sua
frente, portando um tom calmo mas aura ressentida
-
Desculpa, mas naquele momento, foi o que achei mais certo fazer! Se
continuássemos com aquilo, não iríamos ficar por ali, e nós não… Nós não
podíamos…
-
Porque não? – aquela era só a primeira de uma enchente de perguntas, que
estavam ainda por ser feitas no decorrer da conversa que se seguiu, uma
conversa intimista, que só eles poderiam compreender
-
Porque se nos voltássemos a aproximar, iria começar tudo de novo… Tudo!
-
E já viste bem até onde a tua tentativa de afastamento nos trouxe? Já olhaste
bem para nós, aqui e agora? – a sua força nata, fê-lo esborrachar ainda mais o
corpinho dela contra o seu, compelindo mais àquele abraço, o poder
indestrutível que o mantinha, alimentado pelo calor daqueles dois corações
carentes e irremediavelmente apaixonados
-
Ainda assim isto não está certo…
-
Não está certo porquê, Joana? – insistiu, não conformado com o desfecho forçado
a um amor que tinha tudo para ser vivido na máxima plenitude e felicidade
-
Porque nós já tivemos o nosso momento, a nossa oportunidade para sermos
felizes! – esclareceu com quanta calma e serenidade que ainda guardava dentro de
si, sabendo ela estar a ferir o seu próprio coração, com as mesmas palavras que
dolorosamente lhe saíam pela boca
-
Nunca ouviste falar em segundas oportunidades?
-
As segundas oportunidades são só para histórias que ainda não acabaram… E a
nossa já teve o seu fim… já acabou! – disse num sussurro trépido, antecedente
ao fluxo de lágrimas, portadoras dos dissabores de tudo aquilo que ficou por
ser vivido
-
E não restou nada? Tudo o que nós tínhamos, tudo o que partilhámos, os
projectos… Acabou tudo? Não ficou nada?
-
Ficaram as feridas, as mágoas…
-
Shu, shu, shu… - silenciou-a meigamente, embalando-a nos braços, de forma a que
aquela afirmação se dissipasse a cada movimento de ambos os corpos – Não digas
isso, já passou… Isso já passou! – olhou-a pela primeira vez durante aquele
contacto, e fez com que os seus lábios roubassem um beijo na pontinha do nariz
dela, disfarçando nos lábios, um sorriso tão gracioso quanto feliz, por apenas
com um simples gesto, Ruben a ter conseguido feito relaxar, em ordem de um
assunto por eles novamente debatido, mas que ainda se mostrava doloroso de
proferir
-
Pronto, acho já que me podes largar agora… - ditou, mais reconfortada e na
esperança, conquanto deturpada, de que Ruben a soltasse do seu domínio, de
maneira a colocar um termo também àquele toque, bem como a toda a partilha de
sensações que este facultava a cada um
-
Hum… Acho que ainda não é seguro! – contradisse, numa expressão falsamente
sisuda pela pequena brincadeira que escondia, advertindo de uma maneira muito
natural o pedido dela, apenas para continuar com aquela sensação de conforto e
paz que Joana tão bem lhe conseguia transmitir
-
Tu por acaso, estás a contrariar o meu pedido? – inquiriu, dando continuação à
brincadeira, por ele formada, desencostando a cabeça do pousio perfeito entre o
lado esquerdo do peito e a dobra do pescoço, que tinha estremado, para olhar os
seus olhos
-
E tu por acaso, estás com algum problema de estares abraçada a mim, hum? Tu
imaginas a quantidade de mulheres que sonhavam poder estar no teu lugar? Olha
que se eu fosse a ti aproveitava…
-
Convencido! - acusou disfarçadamente, por entre curtas e forçadas tossidelas,
pregoadas de punho cerrado frente da boca
-
Ah, só falta dizeres que não gostas de estar assim… Agarradinha a mim…!
-
E gosto! Quer dizer… Quer dizer, a tua mãe não te abraça, não? É que parece-me
a mim, que nestes últimos dias tens andado muito carenciado!
A
maneira como tentara disfarçar o embaraço pelas próprias palavras que a
denunciaram, assim como de jeito automático e numa reacção repentina se voltara
a agarrar a ele, agora impondo ela toda a força naquele aperto, deixou Ruben
completamente deliciado, da maneira, talvez, de como ela negava todos os
factores que ainda os unia, e como logo de seguida quebrava todas as imposições
que os obrigava ao distanciamento… Do jeito mais doce que ele lhe conhecia.
-
É claro que me abraça! Ainda sou o bebé dela… o seu benjamim!
-
Ah, pois… Imagino! Andas feito num mimadão!
-
Ai é isso que pensas, é? Então agora é que não te largo mesmo! – afirmou
decidido, numa clara feição de amuo encenado, que ela deslindou num só olhar
-
Sabes que é verdade!
-
Sabes que a culpa também é tua! Habituaste-me mal desde cedo…
-
Pois, talvez a culpa tenha sido mesmo minha… Parvo!
-
Parva! – a brincadeira que mais se poderia comparar à de dois autênticos
miúdos, foi dada como terminada, ao som levitante das suas gargalhadas,
surtidas directamente de ambas as almas
-
Vamos dar uma volta por aí… conversar um pouco… Estou a precisar! – pediu-lhe
encarecidamente, agora fora de qualquer jogo de palavras que poderia ser
conduzido a qualquer brincadeira, encarando-o de frente
-
Claro… Deixa-me só ir buscar as minhas coisas, está bem? – perquiriu num
sorriso terno, recebendo depois uma aprovação com um delicado oscilar da
cabeça, enquanto lhe fixava o rosto meigamente
Ruben
deixou a toalha com ela e afastou-se, para dar seguidamente uma leve corridinha
sobre a areia, de maneira a alcançar assim a sua t-shirt e outros dos seus
pertences pessoais que deixara para trás. Enquanto isso, Joana aproveitou para
se enxugar melhor e vestir a sua roupa, espalhada descuidadamente sobre o
areeiro. Meditara secretamente com os seus botões, se o que estava a fazer era
o mais correcto, tendo em consideração todos os prós e contras dos seus actos,
mas já chegava de dar ouvidos à razão, quando o que a fazia verdadeiramente
feliz eram as vontades do seu pequenino e apaixonado coração, que lhe sussurrava “vai
em frente, sem medo”.
-
Onde queres ir? – vestindo ainda a camisola, Ruben voltou a aproximar-se, enquanto
ela ainda se acabava de arranjar
-
Podemos ir até ao pontão? Já tenho saudades… - revelou com uma levante de
nostalgia, de certa forma repartida também com ele, pelos tempos passados
naquele ponto de mais referência da praia, que nenhum dos dois era capaz de
esquecer, nem que passassem mais três anos
-
Claro que sim… Vamos! – depois de Joana colocar a sua mochilinha às costas e de
segurar na sua mão direita, os ténis, Ruben voltou a tomar conta da proximidade
de ambos os corpos, que pretendida manter sempre bem juntos, o tanto quanto
pudesse, e passou-lhe delicadamente o braço musculado sob os ombros,
apercebendo-se ela da sua preocupação em não exercer demasiada força, para logo
de seguida, e num gesto quase comandado contra a lógica, lhe beijar um cantinho
da testa num indício codificado de “eu cuido de ti”
Aquela
proximidade sensivelmente arrebatada que tomavam em prol um do outro a cada
instante que passavam juntos, aqueles comportamentos que qualquer um ao ver,
poderia julgar esconder algo mais do que uma amizade, mas era só e simplesmente
isso mesmo… Aquelas atitudes, aqueles gestos de puro carinho, eram apenas de
dois amigos… Dois amigos perdidamente apaixonados um pelo outro, é certo, mas
que no entanto haviam aprendido a sê-lo, passiva e ocultamente, pois não
estavam dispostos a perderem-se novamente um ao outro, nas malhas de um futuro
atroz, que poderia estar ainda reservado.
-
Sei que recebes-te o meu bilhete, esta manhã… Gostas-te? – curioso, perguntou
num jeito traquina, muito próprio seu e o qual nunca ira conseguir perder por
muitos mais anos que passassem, guindo-a numa caminhada calma até ao pontão,
tal como haviam decido e que não se encontrava longe dali
-
Hum, hum… Gostei, pois! E gostei principalmente daquela última parte que diz…
Como é mesmo? Ah… “não te atrases com a escolha do vestido” Sem dúvida
um excerto muito original! – asseverou numa entoação irónica, mas sobretudo
divertida, que ele soube bem como acompanhar
-
Eu sabia que ias gostar… Mas ainda estou à espera de uma resposta tua!
-
Logo te dou uma…
-
Logo, quando? – temeu no seu âmago mais profundo, que uma resposta pudesse não
chegar e o momento pelo qual tanto tempo aguardara, pudesse não vir a acontecer
-
Quando chegar a altura certa! – atestou com a maior honestidade, num cruzamento
coincidente de ambos os olhares, tentando ganhar depois algum fôlego, que lhe
desse as forças necessárias para estirar um novo tema… um tema que a magoava de
cada vez que era tocado – E, Ruben…
-
Diz… - se procurava alento, naquele instante, naquela breve palavra e pequeno
incentivo, Joana recebeu o bastante para que pudesse continuar
-
Como estão as coisas entre ti e a Inês?
Não
queria, de todo que não queria mesmo ter sido ela a fazer suscitar aquele
assunto entre eles, mas sentiu essa necessidade independentemente de tudo… não
queria ficar apenas com o parecer de revistas e redes sociais, queria sim,
ouvir uma resposta bem formulada da parte dele, mesmo que não fosse a que
estava à espera, mesmo que a magoasse e lhe destruísse todos os sonhos de um
possível entendimento. Já Ruben, sentiu-se um quanto desconfortável com a
impertinência daquela conversa que ainda mal começara, não que lhe custasse
falar sobre o assunto, mas ter de fazê-lo com Joana, pareci-lhe estranho… austero,
depois de tudo o que conseguiram ultrapassar para estarem ali.
-
Entre mim e a Inês não há nada… Não mais! – ainda assim, respeitou-lhe o
pedido, preparado para lhe esclarecer todas as dúvidas que ela pudesse ainda
colocar-lhe sobre a mesa – Não seria justo para ela continuarmos a manter
aquela relação e aquele casamento!
-
Não seria justo porquê?
-
Porque a Inês estaria sempre em desvantagem na relação… Por muito carinho que
eu tivesse e tenho ainda por ela, por mais estima que lhe tome, nunca lhe poderei
dar o que ela precisa: o amor verdadeiro.
-
Porque não? – ainda que o seu coração estivesse entregue ao homem que a
abraçava, aquando da caminhada, Joana não poderia ser egoísta ao ponto de não o
querer ver feliz, mesmo que o fosse ao lado de outra mulher, mesmo que isso lhe
causasse um custoso sofrimento que teria de ser passado em silêncio… só queria
vê-lo bem e feliz, já que não o poderia ser consigo – Vocês pareciam tão
apaixonados, tão felizes um com o outro…
-
Ouve uma coisa, Joana… - obrigando-a a cessar o passo na frente da entrada do
pontão, e colocando-se na vanguarda dela, Ruben dispôs-se a abrir-lhe o
coração, como nunca antes o fizera para outro alguém – É verdade que eu e a
Inês vivemos bons momentos juntos, que me apaixonei por ela, tal como tu também
te deves ter apaixonado por outra pessoa nos tempos que tiveste fora… Mas há
coisas na vida que não mudam, não se esquecem e não se ultrapassam, e uma
dessas coisas é o primeiro grande amor… Seja ele descoberto numa primeira,
segunda ou terceira relação!
-
Ruben, não tens que…
-
Tenho sim, e por favor, deixa-me continuar antes que eu perca a coragem e não
consiga levar isto até ao fim! – pediu-lhe, olhando numa outra direcção que não
fosse o rosto dela, já raso de lágrimas pelo que adivinhara vir a escutar – Tu
sabes, e eu nunca te escondi, que foste tu o meu primeiro grande amor, o único
que eu vivi até hoje… Eras tu a razão pela qual eu me levantava todos os dias
da cama, eras tu a razão da minha alegria constante, por vezes, até exagerada,
foi a ti a quem eu disse um “amo-te” sincero, pela primeira vez em toda a minha
vida, Joana! Tu sabes o quanto isso significa?
Aquela
segurança em cada palavra, aquela profundidade do olhar, estavam a corromper a
veracidade de um autocontrolo agora tão débil, como era o dela, a matá-la…
lentamente. Nunca antes lhe custara ouvir um discurso sem igual, com toda
aquela franqueza que Ruben impunha entre cada frase. E leve e silenciosamente,
uma fina linha de lágrimas começou a declinar o seu rosto de candor,
anteocupando-se em continuar a mantê-lo longe do alcance dele.
-
E agora tu perguntas-me porque é que não consigo ser feliz ao lado de outra
mulher? – as suas mãos vincaram-se nas ancas e cabeça pendeu totalmente para
trás, obrigando a que também as sua lágrimas não cedessem e o forçassem a
travar o discurso
-
Mas a Inês gosta tanto de ti, Ruben… Ela deve estar a sofrer tanto com tudo isto!
-
E achas que eu não sei? Só lamento ter deixado isto ir tão longe… Eu juro que a
última coisa que queria era magoá-la! – declarou, notavelmente transtornado
pelo desassossego intempestivo que havia criado com a pessoa com quem
partilhara quase dois anos de vida, e pela qual mantinha um carinho muito
especial, somente – Só no momento em que eu esquecer, em que eu ultrapassar e
me libertar de uma vez desse amor, aí sim, vou conseguir seguir em frente, mas
agora não… agora ainda não estou preparado para isso!
-
Oh Ruben, desculpa… Não sabes o quanto lamento tudo isto… Desculpa! – num acto
imprudente, Joana lançou o seu corpo nos braços dele, apertando-o
amedrontadamente contra si, e sentido o peso da culpa que julgava unicamente
lhe pertencer, por não o deixar viver uma vida plenamente feliz
-
A vida é assim, Joana… Sabes que também há coisas contra as quais não conseguimos
lutar, e esta é uma delas… - o seus braços acabaram por receber o corpo módico
e indefeso dela, despoletando-lhe um suave beijo no topo da cabeça – Não tenho
forças suficientes para lutar contra aquilo que ainda sinto aqui dentro! – o
brilho imenso dos seus olhos falou por si, as palavras que tinha tanto medo de
enunciar
-
E não imaginas como eu bem sei, o que estás a sentir…
-
Sabes mesmo?
-
Sei… Sei mesmo! – não foi preciso formular devidamente uma resposta, com todos
os pontos cruciais que esta exigia, encobrindo entre ela e entre os corações
palpitantes, o que ambos queriam declarar, mas que nenhum tinha coragem de
proferir
-
Então vamos… o nosso passeio ainda não terminou! – as suas mãos pesadas e
desconcertantemente cálidas, abarcaram o rosto húmido pelas lágrimas, que já
na altura tinham cessado, de Joana, enxugando-o com os polegares grosseiros e
preocupados, que se apressaram a fazer dissipar aquela dor
Juntos,
pisaram então as fasquias de madeira que se multiplicavam até ao fundo do
pontão, fazendo-os caminhar alguns metros acima das águas, agora agitadas, do
mar imenso que se desdobrava num manto azul abaixo dos pés. Mas todo o
percurso, dos corpos vagantes por eles ditado, até chegaram à outra ponta, foi
coberto por um véu de tenebroso silêncio e que não dava indúcias de ser
quebrado por nenhum dos dois, por muito que tivessem uma vontade louca de por
fim a todo aquele padecimento e se deixassem embrenhar na paixão avassaladora
que os comandava, em cada dia.
-
Sentamos?
-
Hum, hum! – afirmou ela simplesmente,
sentando-se depois e deixando pender para lá da berma, as duas pernas
que rapidamente começaram a balançar, pontapeando suavemente a atmosfera
-
É uma paisagem linda, vista aqui de cima! – assibilou, deixando que um toque de
deslumbre se apoderasse da sua voz, enquanto deixava que seu olhar percorresse
cada recanto do que se estendia atrás de si, para além do mar, deambulando uns
metros mais abaixo e tomando o lugar vago junto dela, copiando-lhe o gesto
-
Sim, é… - concordou, aquando de mãos fincadas no tabuado, colocadas às laterais
do corpo, lhe lançou um breve olhar – Já tinha tantas saudades disto…
saudades de vir aqui!
-
Também eu, e foram essas saudades que me fizeram voltar cá… Não importa quanto
tempo passe, esta vai ser sempre a nossa praia!
-
Sinto o mesmo… - um suspiro boémio, foi solto pelos seus lábios entreabertos,
deixando que fosse arrastado pela brisa que preenchia o ar, e alcançando depois
a sua mochila para retirar do bolso frontal, uma pequena escova portátil que
tencionava fazer deslizar pelos seus cabelos de modo a alinhá-los
-
É desconfortável para ti ou achas que posso…? – com um simples relance, Joana
pode desvendar-lhe a intenção pela qual lhe pedira um consentimento, distendeu
cuidadosamente o braço numa só direcção e passou-lhe a escova para que ele não
hesitasse em tomá-la
-
Não, não me é desconfortável de todo… - apesar de não lhe querer dar aquela
descortesia, era evidente que Joana não se sentia totalmente confortável para
partilhar com ele um gesto, que em tempos tanto se mostrara presente na sua
intimidade enquanto casal
-
Chega-te então, um pouco mais para aqui… - Ruben pegou a escova e com um leve
impulso que fez para trás com o seu corpo, abriu um espaço entre as suas pernas,
suficientemente confortável para Joana
Ela
mostrou-se vacilante, num curto espaço de tempo apenas, mas acabou por lhe
fazer a vontade e mansamente, fez o encaixe perfeito de ambos os corpos.
Sentou-se à sua frente, deixando que somente uma perna de Ruben pendesse para a
berma do pontão e as suas se encolhessem para dentro, junto do corpo. No
momento em que sentiu o toque delicado dele, a lançar os seus longos cabelos
para trás das costas, fê-la ter um momento de dejá vu, aquele gesto já
aconteceu… já se repetira inúmeras vezes na privacidade de um casal que agora
já não formavam, das noites em que se sentavam na cama e Ruben lhe penteava os
cabelos, com uma habilidade que aprendera a formar e se transformara num
ritual. A escova começou então a deslizar nos fios de cabelo ainda humedecido e
um tremor incontrolável tomou-a numa pequena convulsão, a que ele não ficou
indiferente.
-
Estás outra vez com frio? – perguntou num tom preocupado, como já era habitual
na presença dela
-
Não, foi só um arrepio… Já passou! – Joana observou-o de realce a cima ombro,
com um sorriso que fazia trespassar perseverança
-
Então e vieste aqui porque… - forçou a uma nova conversa, de maneira a saltarem
ao vácuo do silêncio que podia transformar-se novamente num momento de
embaraço, e dando prosseguimento ao escovar suave do cabelo da sua oculta amada
-
Fui dar um passeio pela cidade, tirar umas fotografias, espairecer um pouco e
vim parar aqui! – enumerou, mantendo a sua postura tão serena quanto possível,
e fitando o mar enquanto o céu permanecia ainda mais encoberto do que no início
da manhã, antecedendo à precipitação que se podia adivinhar
-
Lembras-te das nossas férias cá? Meu Deus, foram incríveis… - Ruben continuava
a abrir portas que em tempos foram trancadas, portas que não poderiam ser
novamente abertas e ele sabia muito bem, que essas recordações iriam afectar
Joana, mas não findou com o assunto – Lembro-me de cada lugar que visitámos,
cada momento que vivemos no quarto de hotel, cada jura de amor que trocámos…
-
Sim… Foram umas férias fantásticas! – declarou num sorriso triste, sentindo
recair em si, o amargo sabor da saudade, que lhe trouxe à memória os maiores
momentos de felicidade que vivera até então
Rodeou
escassamente no meio das pernas dele e no cabelo voltou a colocar o lenço que
enleou na cabeça, rematando com um lacinho no topo, enquanto com um sorriso que
já não dava de maneira nenhuma para continuar a disfarçar, Ruben a olhava
observando-lhe a beleza de cada gesto e o movimento de cada olhar, que se
continha por não cruzar com o dele. E Joana ali estava, tão perto e ao mesmo
tempo tem distante, mas nem assim se preocupou com o facto de ela o poder
apanhar a olha-a de flagrante… Já nada lhe importava naquele momento, que não
fosse tê-la ali e no pensamento uma elucidação imediata completou o testemunho
do que os seus olhos viam “ela é perfeita”.
-
E ainda tens as fotografias?
-
As que tirámos nas nossas férias? – um rasgo de estranheza formou-se quando a
pergunta foi imposta, não percebendo no momento, onde ele queria chegar com
tudo aquilo
-
Hum, hum!
-
Acho que sim! Devo tê-las ali, noutro cartão de memória… Mas porquê?
-
Posso vê-las?
A
franqueza e a súplica ocultas naquele pedido, de uma maneira estranha, não
deram hipóteses a Joana para o questionar. O que estava claro, era que Ruben
iria recorrer às lembranças para manter vivo aquele amor, que no fundo, nunca
chegou a morrer, e também no fundo, Joana não queria perceber isso, preferia
pensar que ele estava a fazer aquilo, apenas para queimar os últimos cartuchos
de uma relação que há muito conhecera o seu fim.
Alcançou
novamente a mala e dela retirou a máquina fotográfica, recorrendo a uma
bolsinha individual da mesma para tirar e trocar os cartões de memória.
-
Toma… Podes ver! – após os cartões trocados, ligou-a e estendeu-a com o auxilio
do braço, para que ele a pegasse e pudesse dar inicio à enxurrada de
recordações
-
Não queres vê-las comigo? – já tendo a máquina em seu poder, ele inquiriu-a
numa pergunta que poderia ser compreendida com um pedido, logo que no menu
seleccionou a visualização da galeria dispersa em dezenas de fotografias,
provas de um passado muito feliz
-
Não sei se isso será bom para nós… - as duvidas que a perturbaram foram mais
fortes, mas não tanto como a insistência e manipulação dele, que se mostraram
bem mais fortes, aquando de um olhar pedinchão e uma voz implorante
-
Vem… Por favor! – a sua cabeça alteou-se e foi acompanhada pelo olhar que
voltou a subir, procurando o dela, que fazia um esforço desumano para não
deixar cair as lágrimas que intuitivamente haviam subido às pálpebras
Joana
gatinhou subtilmente até ele e tomou pousio ao sentar-se no mesmo lugar que
ocupara há instantes apenas. Ruben ofereceu-lhe a máquina, para que fosse ela a
mostrar-lhe o que de melhor viveram, e ela aceitou-a, embora o tivesse feito um
pouco contra a sua vontade. Ele fez questão de recebe-la com todo o aconchego
que lhe podia dar e deixou que o corpo dela ficasse bem protegido entre o seu.
De modo a facilitar-lhe a visão, sobrepôs o queixo ao seu ombro, ainda assim
sem deixar que se tocassem uma única vez… Não iria ser ele a fazê-lo, pois o
receio de se precipitar, o que levasse Joana a afastar-se de novo,
ultrapassava-o.
Os
largos minutos que se seguiram serviram apenas para que um brilho tremeluzente
nos olhares se intensificasse a cada fotografia percorrida, deixando que também
o som de deliciosas e gracejantes gargalhadas, se soltasse inesperadamente da
boca de ambos, das vezes que se deparavam com poses disparatadas mas
divertidas, como se haviam disposto para a objectiva… Levando-os enfim, a
partilhar de um clima mais suave, harmonioso e sem dúvida mais íntimo.
-
Olha estas… Tirámos na feira! – declarou, dando agora lugar a um enxurro de
fotografias unicamente tiradas numa noite de diversões na feira popular da
cidade – Lembro-me de me teres chateado todo o santo dia para irmos lá…
-
Eu chateei-te para irmos à feira? Tu tens a certeza? É que eu não me lembro de
nada disso…
-
Ai não? – por cima do ombro olhou-o em jeito de desafio, e Ruben limitou-se a
esconder o rosto do alcance dela, como se tivesse sido atingido pela maior
timidez – Andavas doidinho por comer farturas recheadas e por andar na roda
gigante também… Parecias mais entusiasmado que o meu irmão!
-
Eh, que exagero… - contrapôs deixando arrastar a voz, num sorriso que teve mais
de travesso e brincalhão do que contrafeito
-
Exagero nada… Sabes bem que é verdade!
-
Ah, dessa eu lembro-me! – disse, apontando uma fotografia que Joana tivera de
retroceder primeiro – Tínhamos ido ao tiro ao alvo, e como já seria de esperar,
não é, com uns bons disparos certeiros nas latas, o Ruben ganhou um urso de
peluche gigante, e sabes a quem é que o ofereceu?
-
Ah… – formulou um ar pensativo por instantes, e com uma naturalidade
irracional, deixaram-se levar numa conversa incrivelmente descontraída, formada
na terceira pessoa, que no seu jeito cómico Ruben armara e que ao fim de
terminada, acabou por gerar uma enchente de risos - … ofereceu-o à Joana?
-
Nem mais… Ofereceu-o à Joana! Mas enfim, ele estava completamente apaixonado e
como era um romântico incurável… - Joana sentiu o seu coraçãozinho mirrar ao
ouvir tais palavras, pois sabia tão bem quanto ele que eram as mais puras e
verdadeiras
-
Aposto que ela adorou o presente…
-
Sim, tanto adorou que depois começou a preferir dormir com o peluche, do que
com o namorado!
-
Isso é mentira! – refutou com audácia, alterando a voz para um falsete
perfeito, que mostrou a sua ofensa, levando Ruben a perder-se em gargalhadas –
Eu nunca te troquei pelo peluche!
-
Pois não, não trocaste porque eu não deixei!
-
Opá… Parvo! – replicou num insulto inofensivo, contraindo as sobrancelhas num
só movimento e ostentando nos lábios, um beicinho enternecedor, que amoleceu o
coração de Ruben por completo
Tenuemente
o seu corpo foi obedecendo às ordens administradas pela força do coração e pela
cumplicidade que aos poucos lhes voltara a pertencer. Então, ainda rodeada
pelas longas pernas dele, Joana deixou que as suas costas lhe embatessem contra
o peito, procurando um aconchego que sabia ele poder dar-lhe, naquele ninho
improvisado de… amor.
-
Desculpa, eu não queria… - tomando consciência da sua acção que pensara ser
demasiado abusada, ela desculpou-se sinceramente, voltando a tomar conta da
distância entre eles
-
Não, não… Deixa-te estar! – contrariando-a de boa vontade, não hesitou, e ainda
que a medo, puxou-a de volta para si pela cintura, fazendo com que tomasse a
mesma posição que ela mesmo tinha adoptado do contacto corporal entre ambos
Ali,
com o bem mais preciso deitado nos seus braços, Ruben tinha apenas uma dúvida:
voltara a apaixonar-se pela mesma mulher, ou nunca deixara realmente de a amar?
Sorriu, vendo-a ser vencida pela forte atracção que não deixava que se mantivessem
afastados por muito tempo… como tal, e rendida à fadiga desgastante de
continuar a impor barreiras entre eles, Joana fez tombar suavemente, a cabeça
sobre o ombro disponível dele. Ruben apreciou da melhor forma aquele gesto e
aconchegou-a no calor do seu corpo, apertando-a para si logo que os seus braços
recorreram ao instinto de lhe contornar o tronco e de ficarem amarrados junto
da barriga. Os músculos de ambos relaxaram então, naquele conforto de amor e
paz, encontrando eles o retorno, junto de quem sempre haviam pertencido.
-
Esta é uma das minhas preferidas… - expôs ela, referindo-se a uma fotografia
onde somente captara Ruben disposto em perfil, onde num flash que lhe passou
despercebido, foi capturado ao entardecer ao fim de um dia de praia
-
Eu gosto especialmente desta! – indagou, de face direita colada à esquerda de
Joana, apontando o retrato de um encaixe de lábios perfeito, que haviam flagrado num momento de visível felicidade do
ex-casal
Perante
aquele comentário, Joana encolheu-se ligeiramente naquele aperto de Ruben, que
tomava todo o controlo dos seus movimentos… As suas faces roborizaram o
encarnado ténue que sentira a aflorar-lhe as maçãs do rosto, por estar a
partilhar com ele, momentos tão íntimos que nenhum esquecera, mas que ao fim de
tanto tempo e agora expostos para os dois, a deixava de alguma maneira
embaraçada e nervosa. Era natural que, por vezes, ao reverem fotografias mais
comprometedoras como beijos ou simples amostras de carinho que fizeram questão
de deixar gravadas, os levasse a constranger aquando enlameados nos braços um
do outro. Felizmente que não foi o suficiente para colocarem termo à compilação
de recordações.
Levemente
ele desuniu as faces, que até então se encontravam passivamente fincadas uma à
outra e ficou simplesmente a observá-la, sem que mesmo ela desse por isso.
Joana continuava ali, serena, sentindo-se incrivelmente segura nos seus braços,
fazendo-o recordar dos bons velhos tempos e de tudo o que mudara entre a
ausência que o destino impôs. Gostava do simples prazer que tinha em olhá-la, e
fascinado com o que via, observava-lhe cada gesto, cada pequeno sinal coligido,
cada traço demarcado na silhueta do seu corpo, que se alterara e amadurecera
nos últimos trinta e seis meses. Por detrás de um corpo perfeitamente
esculpido, de pele dourada pelo sol de Verão, das curvilíneas assentes nas
ancas e de um peito mais robusto e saliente, dos cabelos cacheados que tinham
dado lugar à forma modelarmente lisa, mais escuros do colorado natural, e da
maneira discretamente sedutora que descobrira em si, Ruben conseguiu ver mais
daquilo que ela escondia… Já não era mais uma menina de dezassete anos, agora
era uma mulher a aproximar-se da casa dos vinte, uma mulher que conseguira
atingir os seus objectivos em prol de todos os valores que defendia como seus,
totalmente independente e dona de si e, apesar de por vezes não saber bem como
demonstrar, Joana conhecia os seus sentimentos e sabia muito bem aquilo que
queria.
- Estás a ver? – perguntou-lhe, olhando-o acima
dos seus olhos e tentando sossegar as gargalhadas que ainda ameaçavam eclodir
na boca
-
Hum, hum! – não, na verdade não estava… omitiu-lhe o facto não de continuar a
ver as fotos, e sim continuar a olhá-la, tentando ler-lhe o pensamento e
perceber assim o que estava a achar de tudo aquilo, voltando depois a
concentrar-se única e exclusivamente nela
Começara
então a chuviscar, a cair uma chuva miudinha que no entanto, não incomodava em
nada, aquele momento de felicidade como há muito eles não sentiam, e isso era
notável nos risos, que embora distintos pelas diferentes razões, se podiam
escutar. Ela ria-se das fotografias mais desajeitadas que ia seleccionando com
o polegar, e ele ria-se daquele jeito de menina, que no fundo, Joana nunca
perdera.
-
Sabias, que… ah… - quando se sentiu suficientemente preparado, Ruben fez
suscitar um assunto, que poderia muito bem levá-los a novos temperamentos, em
proveito de mais um antecedente que o passado deixara - … há uns tempos, quando
andava a fazer umas pesquisas no computador, encontrei um vídeo nosso, que já
nem me lembrava que existia!
-
Um vídeo… nosso? – por achar estranha aquela interjeição vinda do nada, Joana
interrompeu a visualização das imagens,
ajeitando-se e rodando no resguardo que o corpo dele compunha, de
maneira a poder centrá-lo no seu panorama visivo – Que vídeo?
-
Aquele que, que gravámos na manhã do teu aniversário…
-
Ah, sim… Já sei! – relembrou, num sorriso curto e tristonho – E… e viste-o?
-Vi… Não consegui evitar a curiosidade e as saudades
também não deixaram que eu lhe ficasse indiferente!
-
Tinhas com cada ideia tu! – forçando um riso, que deu graças a Deus por ter
sido projectado com a maior das naturalidades, de maneira a fugir
propositadamente à insinuação dele, enquanto, não cessadas, pequenas gotículas
de água iam chapinhando cada vez com mais veemência nos seus rostos, cada vez
mais próximos
-
E sabes uma coisa estranha que senti, quando o acabei de ver? – num jeito muito
natural, como se o fizesse desde sempre, a sua mão voou até aos cabelos dela,
fazendo com que uma mecha se fosse enrolando distraidamente nos seus dedos
brincalhões
-
O quê? – perguntou num sopro fraquejado, vendo-o tomar uma proximidade dos
corpos demasiadamente comprometedora, de um momento antecedente há muito não
partilhado e há muito apetecido por ambos
-
Senti uma enorme vontade de fazer tudo aquilo de novo, tal como te prometi que
ia fazer, nos teus aniversários seguintes… - declarou sumidamente, fixando-lhe
os lábios com uma intensidade tal, que Joana conseguira desvendar-lhe naquele
mesmo instante o desejo que o consumia… no fundo, os consumia
Aquele
momento estava destinado a acontecer e tinha tudo para que fosse vivido em
pleno. Ruben tocou-lhe levemente nos lábios com as polpas nos dedos e ela sentiu-se
derrotada pelo ensejo que se acertava demasiado próspero. Os rostos avançaram
lentamente na mesma direcção por vontade própria, no entanto nenhum fechou os
olhos, os quais usaram para se observarem um ao outro enquanto se deixavam
levar pelos sentimentos e guardar a imagem perfeita que cada um tinha na sua
frente… Estavam ambos os corações dispostos a ultrapassar os desacertos de um
passado e darem uma nova oportunidade a um sentimento que depois de tudo, agora
se encontrava mais vivo e forte do que nunca. Mas assim que rendidos ao prazer
de unir os lábios, colmatando o desejo ainda inconcretizável, que caída
vertiginosamente das alturas, uma chuva mais enfurecida e altamente copiosa a
cada segundo corrido, quebrando de uma maneira irreversível aquele tão esperado
beijo, mas que, apesar de tudo, foi somente adiado.
-
É melhor sairmos daqui… - disse-lhe ela, deixando que a sua voz se
confundisse com o som estrondoso da chuva, a embater contra tudo aquilo que os
rodeava e afastando-se dele logo de seguida
Ele
assentiu compreensivamente. Joana protegeu a sua máquina fotografia na mochila,
que se apressou a colocar às costas, e no instante imediato em que ambos
acabaram de calçar os ténis, Ruben pegou-lhe na mão, dando então lugar a uma
corrida freneticamente desajeitada, debaixo da chuva.
-
Corre, corre, corre! – aconselhou-a, não deixando passar despercebido na voz, o
gozo que aquela situação lhe estava a dar
Mais
atrás de si, Joana corria também, sendo puxada pela força que ele impunha na
sua mão firmemente unida à dele, também ela não conseguindo disfarçar a
satisfação que aquela situação, proporcionada por uma eventualidade do momento,
lhe dava, rindo-se desalmadamente pela
figura tonta, mas necessária, que eles faziam para fugir à forte chuvada. Desceram
as escadas e só pararam quando se viram finalmente abrigados pela enorme
cobertura que o pontão improvisava abaixo dele.
-
Há imenso tempo que não me ria assim! – encostando o seu corpo cansado, à
coluna que servia de pilar ao pontão, assustadora pelo volume e altura
impetuosa com que fora construída, Joana tentava regularizar a respiração
acelerada, pela velocidade que fora obrigada a usar para chegar até ali
Parecendo
que não, tinha sido uma corrida longa para eles, e de roupas encharcadas e já
coladas ao corpo, pela chuva de que não tinham conseguido escapar, Ruben e
Joana encontravam-se então estafados, pelas ligeiras dificuldades climatéricas
com que se tinham deparado, mas com um enorme sorriso no rosto, pela satisfação
de um momento que tinha sido vivido pelos dois.
-
Sim, temos que admitir que teve a sua piada… - Ruben soltou mais umas
gargalhadas quando se atracou na frente dela, de mãos unidas, que ainda não se
haviam separado uma da outra por um mísero instante que fosse
-
Acho que estava a precisar de um momento destes na minha vida, para fugir um
pouco à rotina…
-
E não precisas de mais nada? – aproveitando-se do seu desabafou, Ruben usou-o
como arremesso, de forma a manipula-lo a seu favor e usá-lo numa leve
insinuação a Joana
-
Do que é que estás a falar? – já ela não percebeu onde ele queria chegar, ou
preferiu não perceber
-
Se não precisas de mais nada na tua vida para, sabes… fugir à rotina(?)! – numa
tentativa clara de amenizar o fôlego, que tal como o dela, ainda se mostrava
desconcertante pelo esforço de há momentos, Ruben aproximou-se de Joana o
bastante, até às roupas de ambos se fundirem uma na outra, mostrando apenas num
simples gesto, ao que se queria referir
-
Oh Ruben, não acho que devas dizer isso… - por sua vontade, as mãos
separaram-se pela primeira vez, levando-a a baixar o rosto e a esconder os seus
olhos dos de Ruben, onde numa fracção irracional de segundos o espaço no seu
peito que era ocupado por uma alegria repleta, dera lugar ao vazio que ameaçava
fazer soltar novas lágrimas no rosto onde a água da chuva ainda divergia
verticalmente
-
Não digo porquê? Não imaginas o quão feliz estou, por estar contigo aqui e
agora!
-
Eu também estou muito feliz por estar aqui contigo, mas… - ele interrompeu-a
sem ter que pensar duas vezes, enquanto Joana continuava decidida a manter o
olhar longe do seu alcance, por uma só razão que adivinhava certeiramente vir a
suceder-se, e que apenas fora interrompida por um mero contratempo
-
Se estás feliz, não parece, Joana… Nem olhas mais para mim… - foi arrepiante
como a voz dele esmorecera tão rapidamente, levando-o a empregar uma tristeza
sofrida em todas as suas expressões faciais, que só serviu para ela sentir uma
pontada de dor acutilante no peito -
Porquê?
-
Porque se o fizer já sei o que vai acontecer a seguir, e tu sabes que nós não
podemos, Ruben, não é certo que…
Ele
não a deixou completar o raciocínio. Aquela falta de confiança, aquela falta de
segurança e aquele sofrimento que sabia ela cuidar em silêncio, levou a que
Ruben perdesse a cabeça e toda a razão de ser, que o impedira de ter feito até
ao momento, o que durante tantas oportunidades não tivera coragem suficiente
para fazer. Com a sua mão direita, arrepanhou suavemente um retalho de mechas
dos cabelos da nuca de Joana, ainda humedecidos pela chuva, e logo que ela
desprendeu o olhar que mantivera assente nas duas mãos e ergueu a cabeça num só
relance, ele colou os lábios aos dela, beijando-a. Ruben beijou-a… Beijou-a
simplesmente, como se mais nada existisse, como se mais nada importasse e como
se o amanhã não quisesse vir mais. Era impossível continuar a resguardar um
sentimento de tamanha grandiosidade e de puro fascínio, assim como o desejo que
crescia loucamente a cada segundo que passavam juntos e que não se podiam
pertencer um ao outro. Joana fora apanhada completamente desarmada, numa
emboscada que ela própria tinha previsto anteriormente, mas que no entanto não
esperava ver-se tão depressa ser surpreendida por aquele puro resgate de amor,
e os primeiros dois segundos que voltara a provar do toque abrasado dos lábios
dele, aos quais permanecera tensa e de pensamentos inconstantes, e que apesar
de ainda ter dado um sinal de resistência passiva, não conseguiu
contrariar aquele beijo, pois antes disso, com um leve tocamento, Ruben fê-la
descontrair e deixar-se levar. E o que começou por ser um mero choque de lábios
apenas, foi dado então como um pequeno impulsionador ao momento prazerosamente
exaustivo que se seguia. Foi ele a tomar o primeiro incentivo a uma busca
ardente pela língua dela, e ao sentir aquele toque tão quente e aveludado,
Joana mostrou-se desconcertante em milionésimas de segundo, para depois quase
se sentir a levitar. Aquele era um toque diferente, diferente de todos os outros
que já tinha partilhado com ele, era um toque mais atrevido, mais indiscreto e
sem dúvida mais profundo… estava melhor do que nunca antes, diria até. Ruben
fora desde sempre um homem muito meigo e atencioso e isso viera a provar-se uma
vez mais, em cada gesto de carinho que tomava agora para com ela. Quase sem se
aperceberem da rápida mudança, o beijo tomara então proporcionalidades mais
extremas e exaustivas, aquando ambas as línguas se fundiram freneticamente uma
na outra, guerreando-se sem darem qualquer prova de desistência, numa batalha
onde iriam sair claramente justas vencedoras, e dando assim lugar a um beijo
desmedido, um quanto selvagem e muito urgente. Era urgente sim, porque ambos
tinham a necessidade de demonstrarem que o sentimento forte que em tempos os
ensinara a viver, renascera para os voltar a unir. E antes que selasse aquele
momento de entrega e rendição, pois as respirações encontravam-se já totalmente
descoordenadas, Joana surpreendeu-o ao apertá-lo contra si, não o deixando
terminar aquilo que nenhum dos dois queria que chegasse ao fim, o beijo que
recomeçara. Rendendo-se a tudo o que na verdade nunca deixara de sentir por
ele, elevou misericordiosamente os braços no ar e pousou-os nos ombros largos,
permitindo que os seus dedos lhe desembrenhassem o cabelo, completamente
molhado. Perante o seu gesto, sentiu-o sorrir por entre o beijo e esse facto
deliciou-a. Num movimento mais ousado e imensamente extasiante, Ruben fez com
que o seu corpo comprimisse o dela contra a coluna, tendo sempre em conta a
preocupação de nunca a magoar e aconchegou-a mais a si no momento em que as
suas mãos assentaram na cintura elegante dela, apertando-a ligeiramente. Aquele
ambiente húmido mas quente que os envolvia, e o resguardo daquele cantinho que
lhes pertencera desde sempre, abrilhantava ainda mais o momento enquanto o
burburinho dos lábios derreantes que se envolviam loucamente, se moldava com o
som abafado da chuva que continuava a precipitar-se dos céus com intensidade.
Aquela sensação característica do tão famoso ‘efeito borboleta’, voltara a
corromper-lhe a barriga, apesar de há já muito tempo Joana não desfrutar dessa
experiência, conhecia-a muito bem e ali, entregue aos braços do homem que
sempre fora e era ainda o grande amor da sua vida, essa mesma experiência
tornou-se única e indescritível, tal como a primeira vez que conheceram o sabor
do primeiro beijo. Redescobriram caminhos na boca um do outro e descobriram
outros novos, agora de uma maneira muito serena, desfrutando de cada segundo.
Aquela urgência que sentiram ao início foi trocada pela calma e espontaneidade,
que os levou a guiarem-se pelas emoções harmonizadas… e as línguas, essas, que
outrora guerreavam, prestaram as suas tréguas e agora simplesmente se
entrelaçavam, numa brincadeira de ingénua sedução. E eles beijaram-se…
Beijaram-se muito e durante um tempo demasiadamente longo e deleitante. Foi
apenas quando se sentiram reconfortados, que três leves toques de lábios colmataram no
remate àquele beijo, que contudo, pareceu não querer conhecer o seu fim.
Naquele momento eles tiveram a certeza de que as suas almas se voltaram a tocar
e os dois corações voltaram a bater como um só.
-
Sempre adorei olhar o teu rosto depois de te surpreender com um beijo! –
indagou ele, mantendo as testas coladas
e narizes acostados, enquanto a olhava de uma maneira irremediavelmente
apaixonada, deixando que o seu indicador
ganhasse vida e delineasse o rosto dela muito suavemente, contornando cada
ornamentado desde o topo, passando pela linha do maxilar e terminar o percurso
junto ao lábio inferior
Joana
amoleceu perante o conteúdo daquele rememorando mas não disse nada. As
respirações ainda se encontravam demasiadamente debilitadas, misturando-se uma
na outra pela proximidade a que as duas bocas se encontravam. Sorriram. Os seus
lábios acolheram em simultâneo o mais belo sorriso que até então tinham
oferecido um ao outro, e embora ainda se achassem em estado de ofegância e com
a adrenalina propiciada pelo momento anteriormente vivido, a percorrer-lhes
cada veia do corpo, eles estavam felizes… Muito.
De
modo a relaxarem um pouco, ela ressoou a pontinha do seu nariz na dele,
fazendo-os depois chocalhar, na expectativa de criar uma brincadeira à qual
Ruben deu seguimento e lhes oferecera risos deliciosos de se ouvir.
-
Tenho que ir embora… - ditou, acariciando-lhe delicadamente o rosto com a sua
mão macia, esperando não magoá-lo
-
Não, não vás já… - pediu-lhe num jeito mimado, apertando-a contra si, de
maneira a fazer com ela ficasse
-
Mas tenho mesmo de ir… Esqueci-me que tinha combinado encontrar-me com o meu
irmão e ele já deve estar à minha espera!
Embora
a mentira nunca fosse a melhor escolha para qualquer situação, naquele momento
sentiu que fosse o melhor que poderia fazer… Depois do que aconteceu entre
eles, Joana não sabia como iria conseguir lidar com tudo aquilo dali para a
frente, coisa que Ruben ira querer esclarecer o quanto antes, mas ela ainda não
estava preparada para isso, infelizmente.
-
Mas está a chover imenso, aproveitamos para continuar aqui assim, agarradinhos,
conversamos e quando a chuva abrandar vamos os dois para o hotel! – tentando
encontrar um meio termo que servisse de solução, ele foi suficientemente
expressivo para fazê-la perceber que não queria que se fosse embora
-
Conversamos depois… Eu agora apanho um táxi! – apesar de ver um brilho
tristinho arriar aqueles olhos cor-de-mel que fixavam os seus, ela mostrou-se
irredutível na sua decisão
Apesar
de querer muito continuar a partilhar daquela felicidade bem ali ao lado dela,
Ruben mostrou-se tão compreensivo quanto conseguiu, não voltando a insistir e
libertou-a passivamente, para que ela pudesse ir embora. Joana lançou-lhe mais
um sorriso, esperançosa que fosse o suficiente para que ele conseguisse olhar e
ler-lhe o coração, agora outra vez seu. Afastou-se sem mais olhar para trás,
dando início a uma corrida apressada debaixo da chuva.
-
Joana! Joana, espera! – sensivelmente pouco após ela ter saído junto de si,
Ruben correu atrás dela, conseguindo ainda agarrar-lhe a mão e puxá-la novamente,
no intento de obter uma réplica à questão que deixara em aberto
-
O que estás a fazer? Vais ficar outra vez todo encharcado… - assertivou
prudentemente, mas sendo agora demasiado tarde para isso… estavam ambos
desprotegidos e à mercê daquele temporal, novamente de roupas coladas ao corpo
e com a água da chuva a escorrer-lhes pelo rosto
-
Ficaste de me dar uma resposta à pergunta que te fiz esta manhã… Jantamos junt…
-
Sim, jantamos… Jantamos juntos esta noite! – respondeu prontamente logo que o
interrompeu, não sentindo a necessidade de ponderar
-
Prometes? – um sorriso perfeito formou-se nos seus lábios, gradualmente, onde ainda
padecia o doce sabor do beijo
-
Prometo!
-
A sério que prometes? – insistiu, formando uma pequena artimanha que lhe surgiu
no momento
-
Sim, Ruben, prometo! – voltou a assegurar, não dando quaisquer sinais de dúvida
-
Mas prometes mesmo?
-
Já disse que prometo, chato!
-
Tudo bem, já percebi… Mas então não te esqueças que prometeste três vezes! –
rematou, mostrando no seu corpo de homem, a acuidade de um miúdo, que iria
sempre mostrar ser
Joana
apercebeu-se que tinha sido desmantelada no meio da perspicácia dele, mas não
conseguiu disfarçar o sorriso que lhe aformoseava o rosto pueril. À medida que
se ia afastando, as mãos, até à altura unidas, iam escorregando uma na outra
até serem obrigadas a uma separação, que Ruben rezou interiormente para que
fosse breve. Ela afastou-se, decorando todo aquele cenário de deslumbre para
levar consigo durante todo o tempo de regresso, e ele deixou-se ali ficar,
vendo-a partir numa nova correria.
E
finalmente, Ruben, havia descoberto que o bom da saudade é a alegria do
reencontro, o reencontro de um amor que poderia chamar novamente de seu.
Queridas leitoras, antes demais quero pedir-vos imensas desculpas, pela demora de uma nova publicação, mas infelizmente não a consegui fazer mais cedo!
Contudo, deixo-vos com um novo capítulo grandito, que espero que gostem
Contudo, deixo-vos com um novo capítulo grandito, que espero que gostem
e não se esqueçam de deixar os vossos comentários, que como já sabem,
são muito importantes no insentivo à continuação da escrita, assim como também gostava muito de ter as vossas opiniões em relação ao rumo da história! :)
são muito importantes no insentivo à continuação da escrita, assim como também gostava muito de ter as vossas opiniões em relação ao rumo da história! :)
Beijinhos a todas,
Joana ♥
Esta perfeito! :D Adorei milhões, asério *.*... como adoro qalqer capitulo qe escrevas!
ResponderEliminarParabéns pela maravilhosa escrita e maravilhosa imaginação :)
E esse jantar vai mesmo acontecer ou a Joana não vai aparecer? Eu gostava qe ela aparecesse e o Ruben decerteza qe tambem ia gostar :p
Beijinhoos
Que lindo!
ResponderEliminarAmei!
Estou fascinada pela qualidade da tua escrita.
Parabéns!
Beijinhos
Nossa, como esperamos por isso. Esses dois são mesmo fofinhos juntos, não tem cabimento nenhum ficarem separados. Quero mais sim? Completamente apaixonada pela forma como escreves.
ResponderEliminarBeijos.
Juro, que se houvesse mais para ler continuava com o maior gosto, e não me cansava. Tá simplesmente fantástico, lindo, maravilhoso, amei. Eles já mereciam este momento, e nós também.
ResponderEliminarSó espero que a Joana não falte ao jantar, afinal ela prometeu, três vezes, e que ela tire de vez todos os macaquinhos que andam naquela cabecinha. Eles amam-se e merecem tudo de bom, mas precisam de conversar e esclarecer tudo, principalmente o motivo que levou a Joana a deixá-lo, para poderem ficar em paz um com o outro sem entraves nem segredos.
Adorei, mas vou ficar toda roidinha à espera do próximo, continua.
Beijocas
Fernanda
Está tão lindo e tão perfeito, meu anjo!
ResponderEliminarCada capítulo no avançar desta história mostra-se sempre mais e mais maravilhoso, mais e mais chamativo para as leitoras.
Amo a forma como escreves e estou certa de que não existe outro nome para tal sem ser TALENTO!
Continua sempre a brindar-nos com este teu dom, princesa.
Beijo grande, love you <3
Minha linda desculpa só comentar agora mas estive uns dias sem acesso à net e no tlm n dá grande jeito p comentar lool
ResponderEliminarO capítulo está lindo, adorei o "momento" deles a recordar o passado só espero que agora não haja nada a separá-los LOL quero-os juntinhos :P
Beijocas
Olá!
ResponderEliminarNem sei muito bem o que te dizer, está tão brilhante este capitulo, tão romântico, tão cheio de sentimento e emoção...
Para mim, este é sem duvida um dos melhores, senão o melhor capitulo que já escreveste!!
Continua com este magnifico trabalho e nunca deixes de escrever.
Ah, deixa a Joana ir ao jantar, ela prometeu :)
Beijinhos
Também não sei o que dizer, teus capítulos me deixam sempre sem palavras. PERFEITO, sem mais. Mas espero mesmo que ela cumpra o prometido - 3 vezes - e vá ao encontro do seu amado *-*
ResponderEliminarBeijos.
P E R F E I T O ! ! ! ! :P
ResponderEliminarCapítulo Fantástico, muitos PARABÉNS! o melhor ,sem qualquer dúvida, até agora.
ResponderEliminarComecei a ler a tua fanfic à uns dias, e a escrita foi tão cativante que me levou a querer ler mais e mais. Acho que caracterizas muito bem a personagem do Ruben, que eu admiro imenso, e isso faz com que tudo saia muito mais verídico e fantástico. Continua !