Para mim, a chegada do
fim-de-semana foi sinónimo de fazer a mala e embarcar no avião que me levasse a
dois dias de trabalho, o que significava que rumaria ao destino da belíssima Paris…
Aquela que muitos proclamavam e distinguiam de todas as outras cidades do mundo,
como a cidade do amor. Irónico, não é? Nos tempos em que estive realmente feliz
ao lado da pessoa que amava, nunca tivera oportunidade de conhecer a cidade
padroeira dos amantes, e agora, mais sozinha do que nunca, ali estava eu,
singida a um contrato de trabalho que me prendia ali para dois dias que me iram
fazer relembrar da melancolia que é sentir nada mais do que o vazio ocupar o
meu peito, pela ausência do meu mais-que-tudo, incapaz de ser preenchida com a
chegada de outro alguém. Pelo menos nos próximos tempos iria ser assim, não
tinha coragem nem qualquer disposição para olhar para outro homem, tampouco já estava
preparada para começar um novo relacionamento, e por isso mesmo iria ficar
assim… Apenas comigo mesma a lamber as minhas feridas e rezar para que novos
ventos me trouxessem novas alegrias e felicidades.
Na manhã seguinte ao voo,
acordei cedo no quarto… Um enorme quarto de hotel enormemente refinado e enormemente
sozinho, tal como eu. A primeira coisa que fiz mal abri os olhos, foi esticar o
braço à mesinha de cabeceira e alcançar o meu telemóvel para verificar as
horas, e assim aprontar-me antes que Pedro entrasse num rompante pela porta
para me despertar. Como mantivera durante toda a noite o pequeno aparelho em
silêncio para conseguir dormir tranquilamente, não dei conta da chamada que
tinha recebido há poucos minutos de Adriana, e desde que a vi que não hesitei
sequer em ligar-lhe de volta.
A algum esforço pelas
cólicas incomodativas que sentia no fundo barriga, sentei-me à cabeceira da
cama e repuxei para as minhas mãos a garrafa de água que permanecia ao meu
alcance, dei dois goles para aclarar a voz e quando me senti bem disposta e de
cabeça leve para começar um novo dia, peguei no meu telefone, fiz a marcação
rápida para a chamada de Adriana e aguardei alguns segundos enquanto ouvi-a
chamar.
- Alô, alô, gatita! – a
doce voz da minha Adriana ressou ao meu ouvido depois de alguns segundos,
fazendo-me sorrir
- Olá, princesa! – saudei
também com um arrastar claro de voz que não escondia a fadiga pela agitação da
minha rotina, que fazia da minha vida tanto pessoal como social, andar em
constante roda viva pela voltas e reviravoltas que levava
- Então, amor… Essa vozinha
é de sono?
- É, mas tinha mesmo de
acordar… O Pedro deve estar aí a aparecer, portanto também não podia ficar a
mandriar por mais tempo. – embora fosse o que me apetecesse, pelo cansaço que
me aprisionava o corpo à cabeceira da cama, os meus ombros encolheram-se em
conformidade com a minha afirmação relutante – Liguei-te porque vi uma chamada
tua mas tinha o telemóvel em silêncio… Precisas de alguma coisa?
- Sim, tenho uma coisa
que te quero dizer… Era suposto dizer-te pessoalmente mas acho que não consigo
aguentar até te voltar a ver para te contar… - pela sua voz indiscutivelmente
intusiasta e energética, um porcel de véu foi levantado, suscitando no ar a
surpresa e para mim a curiosidade de uma possível novidade que a minha querida
Adriana pelos vistos queria partilhar comigo
- E o que tens para me
contar, amor? – perguntei no intervalo de tempo que ela me deu para reagir,
dando-lhe alguns segundos para receber o fôlego que precisava para continuar ao
que já tinha dado comêço
- Ok, então eu vou dizer
isto de uma forma muito simples e clara… - antecipou, revigorando a minha
curiosidade e indicando a evidência de
um comunicado que iria fazer – Eu estou
noiva do David!
- Tu o quê?! - a minha
boca formou um "o" irrepreensível em simultâneo com as minhas
sobrancelhas, que se arquearam num único acto reflexo
- É verdade, Joana… Ele
pediu-me em casamento!
- O David pediu-te em
casamento? – com um enorme sorriso nos lábios e impressionada pelo que ouvira,
não consegui evitar a pergunta mais óbvia e ao mesmo tempo redundante pela sua
anterior confirmação – Quando é que isso aconteceu?
- Antes de ontem… - disse
calmamente, mas foi fácil para mim notar-lhe a alegria e felicidade pura que
lhe inundava o coração apenas pelo jeito enaltecido como falava – Foi no nosso
aniversário de namoro, ele preparou um jantar romântico lá em casa e ao final
da noite mal dei por mim já tinha uma caixinha nas mãos com o anel e ele a
fazer-me o pedido.
- Oh Adriana, não
imaginas o quão contente fico pela notícia… Estou muito feliz por vocês, sabes
que só vos desejo o melhor!
- Eu sei, pequenina,
obrigada! – ela agradeceu meigamente e imaginei-lhe um sorriso terno preencher
a sua boca naquele momento
- E tenho a certeza que
vocês serão muito felizes, amam-se e vê-se que foram feitos um para o outro!
- O casamento só vem a
reforçar a nossa condição, é o impulso para mais tarde construírmos a nossa
família…
Enfim. Todos os meus
amigos se estavam a casar, pelo menos a maioria deles já tinha descoberto o seu
caminho e estava feliz com as escolhas idealizadas para uma vida futura ao lado
do respectivo parceiro. Bem, não sabia se podia chamar Inês e Ruben
propriamente de amigos, mas a verdade é que também eles se tinham aviado para
uma partilha mútua de um amor no
conformar dos laços matrimoniais, e agora também David e Adriana estavam
preparados para dar o mesmo passo.
Senti uma nostalgia
profunda quando mentalmente revi os meus planos futuristas, nada mais que
vazios de emoções e incertos do rumo que eu já não sabia que lhes haveria de
dar. Tinha perdido o único homem que eu julguei ser capaz de me fazer mudar de
ideias opositoras que eu tinha contra o casamento e levar-me ao altar, tinha
deixado o grande amor da minha vida, e sejamos sinceros, esta perdera grande
significado sem ele.
- Então e para quando vai
ser o grande acontecimento do ano? – perguntei logo ao notar a repartição de um
momento de silêncio, que o meu âmago induzira à nossa conversa
- Ainda é cedo, não
sabemos bem… Disse ao David que queria acabar a minha licenciatura primeiro,
também só já me falta um ano, por isso… - ao mesmo tempo que a ouvi, senti uma
pontada acutilante um pouco abaixo da barriga, que me fez querer soltar um
pequeno queixume de dor que só não libertei porque o suprimi num contrair de lábios
- Adriana, dá-me dois
minutos e eu já te ligo, está bem? – notei o meu corpo húmido e quente,
principalmente entre as pernas e comecei a sentir-me ligeiramente
desconfortável
- Sim, amor, mas porquê?
Aconteceu alguma coisa? – talvez pelo meu tom de voz um tanto ou quanto
alarmista e reticente bem como pela minha interjeição, foi natural ela ter
estranhado, mas não queria sobressaltá-la
- Não, não é nada, não te
preocupes… Eu já te volto a ligar. Até já.
- Até já. – apercebi-me
que ela ficara realmente preocupada, senti-o, mas desliguei a chamada ainda
assim e sem voltar a dizer-lhe mais nada
Voltei a pousar o
telemóvel na mesinha de cabeceira e olhei para baixo no instante seguinte…
Quando a minha mão tocou na parte debaixo da langerie com que eu dormira
juntamente com um top de alças, a humidade de um líquido sujou os meus dedos. A
minha cabeça rodou automaticamente até o meu olhar estarrar sob a zona da cama
onde eu havia pernoitado nos lençóis de linho puramente brancos, e estes, pude
eu ver claramente, estavam manchados de sangue, que jorrei durante a noite.
Fiquei alarmada nos
primeiros segundos, por não ter dado conta e ainda para mais por ser tanto
sangue, mas depois tranquilizei logo um pouco por consciencializar que era o
meu período… Esteve atrasado dois dias, o que não era muito habitual visto que
eu tinha uma menstruação regular, mas (in)felizmente já tinha voltado.
Caso o Pedro resolvesse
invadir o meu quarto – como fazia sempre – a qualquer momento, cobri o lençol
manchado com o lençol do topo e segui para a casa de banho para ir cuidar da
minha higiene.
Tomei um banho que me
soube incrivelmente bem, o qual não resisti em prolongar, e voltei ao quarto
envolvida num roupão ricamente oferecido pelo hotel e com uma pequena toalha
enrolada no cabelo. Prescutei em todo o quarto por algo que me fosse capaz de
estarracer de traquilidade, mas nada ali me oferecia qualquer conforto, nenhum
canto de paz onde me pudesse sentir bem, não como a minha casa me oferecia, o
meu cantinho. Só lá me sentia minimamente bem, só lá sabia que iria estar
protegida das atrocidades da vida, isolada do resto do mundo. Era assim que
gostava de estar ultimamente: sozinha. Não sabia ao certo porque tinha
necessidade de o fazer, mas aos poucos ia-me isolando de tudo num canto só meu,
numa vida só minha… Talvez como uma barreira defensora dos desafogos pelos
quais eu já tinha passado, ganhara a tendência de afastar as pessoas que se
queriam aproximar de mim e protegia-me na minha conchinha onde ninguém podia
entrar. Por um lado sentir-me só, de certo que não era a melhor sensação do
mundo, mas por outro sabia que era a única maneira de não sair magoada de
alguma situação e iludir-me com expectativas que criava nos outros… Já me tinha
desiludido que chegasse.
- Estou apenas por minha
conta… - desabafei em voz alta, completando os meus pensamentos que se
encontravam mais búzios e turvos do que alguma vez e até então
Antes de mais nada,
liguei para o serviço de quartos a solicitar que logo que pudessem, viessem
trocar os lençóis da cama, e então em passos calmantes e brandos, os meus pés
levaram-me até onde os ordenei, à varanda que fazia o único e possível contacto
entre os quartos do hotel e o exterior. Sentei-me numa cadeira de verga que
decorava uma das extremidades, e de pernas cruzadas e recolhidas junto ao
corpo, permaneci ali por alguns momentos a deixar bater o sol na cara e queimar
levemente as pestanas e maçãs do meu rosto, já que o coração não se deixava ser
aquecido. E por falar em coração… Oh, era inevitável não pensar nele uma vez ou
outra. De vez enquanto lá tropeçava numa lembrança nossa e logo aí todo o meu
pensamento e mente se restituíam à fatalidade do que podia ser tudo mas que
agora não passava somente de recordações vagas e intocáveis, as únicas capazes
de garantir que a nossa história havia sido verdadeira. E naquele momento essas
mesmas recordações trouxeram-me a mais recente de todas elas, há apenas dois
dias atrás, nas garagens do Colombo.
"Pede-me para deixar a Inês e eu deixo… Basta que me peças." E se eu lhe tivesse pedido? E se em vez
de ter calado as vozes do coração, se não tivesse colocado os meus sentimentos
de lado e ter sido tão racional, se lhe tivesse realmente pedido aquilo, o que
seria feito de nós hoje?
Desde então que vivia
atormentada pela aquela incerteza, a pior de todas, de ter seguido ou não pelo
caminho certo, a incerteza do que podia ter sido e agora não era mais…
- Joana? – o chamamento
oriundo da presença de Pedro no meu quarto, fez-me voltar à realidade e detonar
das lágrimas que se deixavam vagar no meu rosto entristecido, causadas pela dor
do pensamento que persistia em maltratar-me
- Aqui fora… - respondi
numa voz atraiçoada pela fragilidade que me possuía na altura, e apressei-me a
remover das faces cada partícula das gotas de orvalho que a humedeciam, antes
que ele me visse
- Ah, estás aqui… Bom
dia! – Pedro saudou-me na primeira vista com um sorriso madrugador e veio ao
meu encontro para me dar um beijo na bochecha
- Bom dia, Pedro… - o
gesto foi retribuído e até o sorriso, que mais forçado que o dele, rematou os
alicerces dos meus lábios
- Eu vinha acordar-te,
mas pelos vistos hoje antecipaste-te a mim e madrugaste…
- Não me apeteceu ficar a
dormir mais…
- Alguma coisa a tirar-te
o sono?
- Ah… Não, nada. –
discordei de imediato, levantando-me da cadeira no mesmo segundo para voltar ao
quarto e começar a arranjar-me para descermos para o pequeno-almoço – Vou
arranjar-me num instante…
- Calma, não é preciso
teres pressa… Ainda temos tempo. – também ele saiu da varanda vindo atrás de
mim para os interiores, tranquilizando a prontidão e pressa a que em
circunstâncias como aquela eu já tinha sido habituada – E é verdade, já estás
melhor?
- Estou melhor…? -
inquiri não sabendo ao certo o ponto da questão a que ele se intencionava,
retirando ao mesmo tempo a toalha dos meus cabelos, secando-os levemente com a
mesma
- Sim, das enxaquecas…
Tens andado um bocado em baixo nestes dias…
- Sim, sim… Estou melhor.
– afirmei sinceramente, recordando as dores de cabeça infelizmente ainda demasiado
presentes que me têm oferecido algumas insónias – Tenho tomado uns comprimidos
para as dores. – por outras razões que não aquelas, e de um modo involuntário,
as lágrimas restantes que tinham ficado interrompidas na linha de água dos meus
olhos, traçaram as minhas faces sem ter feito qualquer esforço
- Estás melhor… mas estás
bem? – embora tivesse tentado disfarçá-las, ele bem que as viu percorrer a
vertical e perecerem em meus lábios antes de ter tempo de enxugá-las
- Desculpa, não percebi…
- tentando ignorar o óbvio, fiz a interjeição mais descabida para quem sabia ao
que Pedro se estava a querer referir, mas apenas queria desviar o assunto que
ele já conhecia de cor e que eu não queria voltar a remexer
- Está a doer-te outra
vez, não está? – ele aproximou-se em passo brando até chegar ao pé de mim e
deter totalmente o meu rosto no seu foco de visão… se se referia novamente às
enxaquecas, eu estava pronta para lhe dizer que não, mas surpreendeu-me quando continuou a falar e me
mostrou o verdadeiro significado da sua pergunta - Eu não estou a referir-me
aqui… - discordou ao tocar a minha têmpora – Estou a perguntar se te está a
doer aqui. – corrigiu a minha suposição fazendo voar a falange do seu indicador
agora até ao lado esquerdo do meu peito
Senti-lo compreender-me
mesmo sem eu ter que me pronunciar, reforçou a angustia e o sem-rumo que estava
a sentir dentro de mim e me fazia querer chorar. Encarei-o novamente com as
pernas a vacilar, com o queixo a tremer pela antecipação de novas lágrimas, e
numa questão de segundos quebrei completamente sob o meu próprio controlo que
eu não conseguia continuar a manter. A minha face procurou o seu peito onde
pouso tal como a minha mão, que em punho cerrado se prendeu à t-shirt ao lado do
meu rosto. Voltei a chorar, desta feita de uma maneira mais livre e desabafante
que denunciava os meus maiores medos, receios e tristezas a uma das pessoas em
que eu mais confiava.
- Shiu, tem calma… Vai
passar, vai passar… - os seus braços de irmão abraçaram o meu corpo cada vez
mais frágil e debilitado, deslizando repetidamente uma das suas mãos nas minhas
costas no intento de me sossegar um pouco
- Achas que eu fiz bem? –
iniciei uma pergunta que só depois de uma breve pausa forçada pelo soluçar que
se interpôs, a compus - Achas que fiz bem em não querer voltar para ele? – como
meu melhor amigo e confidente que era, Pedro já tinha sido posto a par da
conversa secreta que partilhei com Ruben à saída do Colombo
- Estavas disposta e
pronta a aceitá-lo de volta conforme ele te pediu?
- Eu… Eu queria, queria
muito, mas não consegui… Não acho que estivesse pronta para isso… - pronunciei
num murmúrio trémulo e derradeiro pelo choro que persistia – Ele pediu-me
demasiado, pediu-me o impossível…
- E o que é para ti o
impossível?
- Ficarmos juntos… Ambos
sabemos que isso nunca irá acontecer, sabem todos. Ele está com a Inês, fez uma
escolha e escolheu-a a ela, e por muito que eu continue a amá-lo, ele não me
podia pedir uma coisa daquelas!
- Se ele queria ouvir da
tua boca um pedido para deixar a Inês, por alguma razão foi…
- Uma razão que agora já
não faz qualquer sentido! – contradisse num suspiro magoado por ter sido
trocada por outra mulher – O Ruben está noivo, há muitas responsabilidades que
ele tem de cumprir… Um casamento não é brincadeira nenhuma, Pedro,
não é uma brincadeira que ele pode atestar apenas por ter assumido para mim estar
arrependido pelo que fez e querer o nosso amor de volta! As coisas não
funcionam assim…
- As coisas nunca
funcionam do jeito que queremos… - maior verdade que essa não havia, e pelo
menos no meu caso, esta condição adequava-se perfeitamente sem espaço para
comos nem porquês, apenas era assim e restava-me lidar com isso – Acho que só
fizeste o que sentiste ser o mais correcto… - sim, tinha feito o mais correcto, mas isso deixou-me feliz? claro que não.
- Bah, já chega! – rabujei
depois de algum tempo que passámos sem dizer mais o que quer que fosse, e num
único movimento incorporado, soltei-me dele - Já chega de Ruben… Já chega, já
chega! – voltei a repetir num ênfase impregnado na voz e no coração, como que a
obrigá-lo a sair da minha cabeça de uma vez por todas
- Precisas de alguma
coisa? – ainda perto do meu alcance, Pedro falou meigamente desviando uma
madeixa húmida do meu cabelo para trás da orelha
- Não, obrigada, eu só
preciso deixar de falar sobre isto, deixar de pensar sobre isto… O resto vai
com o tempo. – ansiei para que o que dizia se tornasse real, era o que de melhor eu
podia desejar… um novo ponto de partida – Podes deixar-me sozinha para me
vestir, por favor?
- Sim, claro… Desculpa,
eu saio já…
- Encontramo-nos lá em
baixo?
- Sim, o Alexandre
leva-te até à restauração… Está combinado tomar-mos o pequeno-almoço todos
juntos daqui a mais ou menos meia hora. – informou, confirmando o tempo do
compromisso com o seu relógio de pulso
- Está bem… Eu daqui a pouco já desço.
- Fico à tua espera,
pequenina… E quero ver um sorriso lindo nesses lábios, que eu sei que está
escondido aí algures! Até já… - o seu dedo tocou a covinha da minha bochecha o
que me fez libertar um sorriso espontâneo ali mesmo, para no segundo seguinte
sentir a minha testa ser beijada pelos lábios dele mesmo antes de o ver abrir a
porta e desaparecer do outro lado da mesma
Quando voltei a ficar
sozinha, limpei as últimas lágrimas e suspirei profundamente naquela imensidão…
Prometera a mim mesma não voltar a chorar por Ruben, e pelo tempo que correra
desde então tal como pelo que eu já tinha passado, não podia voltar a quebrar o
juramento. Pedro estava certo… Eu apenas fiz o que o meu coração soube ser o
mais correcto a fazer e não podia lamentar por isso, agira em conformidade com
os meus princípios e valores, a muito custo claro, e acho que só Deus sabe o
quanto me doeu, e apesar de estes meus princípios não se mostrarem em nada em
concordância com os meus sentimentos.
Quando finalmente a minha
cabeça se libertou daqueles pensamentos auto-destrutivos, embora que apenas por
uns instantes, tomei compasso de corrida para me arranjar visto que o tempo que
tinha para o fazer já não era muito. Optei por um visual mais clássico e
elegante, bem ao estilo de Paris… Deixei o meu cabelo modelarmente liso cair-me
pelos ombros, solto, coloquei uma maquilhagem simples e leve nos tons, e
perfumei-me antes de sair.
Ao segurar o telemóvel na
mão, lembrei-me que ainda devia um telefonema a Adriana, mas teria que deixá-lo
para mais tarde pois não estava com tempo e mandei-lhe meramente uma mensagem
para não a deixar preocupada.
- Bom dia, Alex! –
cumprimentei afavelmente o meu segurança, logo assim que fechei a porta do
quarto onde estava hospedada naquele fim-de-semana, vendo que ele se encontrava
fielmente à minha espera no corredor
- Bom dia, menina Joana. –
ele olhou-me pela primeira vez naquele dia e sorriu discretamente – O Pedro já desceu,
ordenou-me que a levasse…
- Sim, eu sei, ele
disse-me. – antecipei-me mesmo antes de Alexandre me repetir a ordem que o meu
agente lhe incutiu, e da qual eu já tinha sido posta a par – Vamos? – os meus
pés marcaram direcção a um dos elevadores que se encontrava ao fundo do
corredor da minha esquerda, pronta para me precipitar a este e descer ao
rés-do-chão
- Sim, claro… Vamos! –
ele deixou-me seguir na sua frente e tomar ordem da caminhada, para depois se
juntar a mim e seguir ao meu lado – Como está das suas dores de cabeça? –
perguntou-me amigavelmente quando me viu pressionar o botão de chamada do
elevador
- Estou melhor, obrigada…
Nada que uns bons comprimidos não resolvam…
- Andar constantemente a
tomar comprimidos também não é aconselhável e não lhe faz bem, menina…
- Não tive outra opção,
caso contrário passava as noites em claro… Mas o que importa é que as dores já
passaram, e por isso espero não vir a ter que tomar mais nada. – falei num
gesto coordenado e sucinto da cabeça, que antecedeu à abertura das portas do
elevador por onde acabámos por enveredar no mesmo instante
- Talvez o melhor seja
ser vista por um médico, Joana… - aconselhou calmamente, visando somente querer
salvaguardar a minha saúde física e mental
- Também tu com essa
conversa, Alexandre? – inquiri ligeiramente irritada por já ter sido pressionada
da mesma maneira por Pedro – São só umas dores de cabeça, é uma coisa
perfeitamente normal…
- Dores de cabeça,
mal-estar… A menina não tem andado com boa cara!
- É o stress, o cansaço…
Apenas isso! São as aulas, os exames, e no meio disso as viagens… É normal que
uma vez por outra o meu corpo se ressinta e tenha destas quebras.
- Talvez seja, mas fiquei
preocupado consigo e estava a tentar ajudar... - o pobre do meu segurança
deixou claro a consternação que tinha por mim, lançando-me um olhar assoberbado
tanto de apoquentação como de misericórdia
- Oh Alex, eu sei… Mas
garanto que está tudo bem, não se preocupem tanto comigo, até porque não há
razão nenhuma para isso!
Aquele assunto ficou
arrumado ali mesmo, no qual eu não lhe dei mais hipótese de voltar a remexer e
insistir comigo em algo que não tinha cabimento nenhum em dar uma importância de
maior… Se houvesse algo de errado comigo eu mesma seria a primeira a notar e a
admiti-lo, portanto e até acontecer algo que viesse provar o contrário, não
fazia sentido estabelecerem aquela aliança de preocupação em meu redor.
Como depois daquele,
nenhum outro assunto surgiu a fim de manter a conversa entre nós, foi no
restante silêncio que prosseguimos a viagem de elevador que nos levou a outra
instância do hotel.
- Nossa, será que eu tô
vendo bem? – enquanto atravessava o átrio principal, uma voz que me soou
estranhamente familiar, tocou a minha atenção e ordenou ao meu olhar procurá-la
em qualquer recanto possível – Joana, é você…!
- Chico?! – junto à
entrada do restaurante para onde me dirigia, encontrei hirta e perfeitamente
composta, a figura de Francisco, o manequim com quem partilhei projecto em Punta Cana
Ficámos claramente
surpresos por nos ver-mos ali, depois de sensivelmente três meses dentro dos
quais não mantivéramos qualquer convivência pessoal, contudo foi nas redes
sociais que fomos uma vez por outra trocando dois dedos de conversa e retendo o
contacto.
Ele sorriu e vi-o começar
a caminhar na minha direcção, o que me fez fincar com mais precisão e autonomia,
os saltos altos contra o pavimento e ir também ao seu encontro.
- Nossa, moça… Que
saudade! Faz tempo, ein? – com um sorriso belíssimo e já característico a
adornar-lhe o semblante, quando nos juntámos a meio caminho, Francisco
beijou-me a face e cedeu-me um abraço curto porém apertadinho que foi
retribuído por mim a cem por cento
- Por aqui? Como estás? –
perquiri com um sorriso sincero a marcar a minha nova e teatral postura de
mulher feliz e realizada, resguardando o meu lado mais melancólico e solitário
só para mim
- Eu tô bem, graças a
Deus… E você como tem passado?
- Eu estou bem também… -
sem saber o que mais dizer, a minha cabeça vergou-se para o lado num gesto mudo
que veio a completar o silêncio que se abreviou – Não estava nada à espera de
te encontrar aqui… O mundo é mesmo um lugar pequeno…
- É, o mundo é pequeno
mesmo, mas nesse caso parece foi ele que nos juntou de novo…
- O quê? Como assim? – a
minha testa franziu-se pelo meu ar inquisidor, pois não compreendi no primeiro
relance o que ele queria dizer
- Cê não ficou sabendo,
ué? A gente vai fotografar junto na sessão… - esclareceu logo que teve
oportunidade – A gente com mais um cara que acabei de conhecer, o Louis e a
Sara Sampaio… Cê ela já deve conhecer!
- A sério? Não sabia… Isso
é óptimo! – ciciei com um entusiasmo e surpresa evidente pernoitando na minha
voz… a verdade é que eu sabia que aquela produção fotográfica ia contar quatro
caras na campanha, mas Pedro não entrara em grandes pormenores, razão pela qual
eu não estava a par da identidade dos outros três manequins
- É sim senhora, é sempre
óptimo poder trabalhar com gente bacana! – ele concordou logo comigo, fazendo
realçar a simpatia e bom carácter que já tinha tido o prazer de lhe conhecer –
E aí… Eu 'tava já indo pra dentro… Vamo' entrar?
- Sim, vamos. – a minha
cabeça acordou num pequeno aceno, e senti-o pousar educadamente a mão nas
minhas costas para nos encaminharmos aos interiores do restaurante, deixando os
nossos seguranças restringidos às portas de entrada
Uma mesa restrita do
restaurante na zona da esplanada, tinha sido propositadamente preparada para
nós, oferecendo-nos um pequeno-almoço que preencheu aproximadamente a hora
seguinte. Conheci o manequim de nacionalidade francesa, o bem-disposto e
animado Louis, e revi Sara, com quem ainda não tinha tido oportunidade de
trabalhar mas com quem já travava amizade desde que esta mudara a sua
residência para Nova Iorque.
No final da refeição
saímos do hotel e os quatro seguimos para estúdio, que ficava a uns oito
quarteirões da zona onde estávamos instalados, no mesmo jeep preto, tendo os
nossos agentes vindo no carro atrás.
A produção fotográfica
para a qual iríamos pousar, predestinava-se para um catálogo da nova colecção
de roupa do estilista Jean-Paul Gaultier, e já se podia
calcular um longo horário de trabalho pela frente bem como as horas tardias de
regresso ao hotel.
- Voice mes quatre
étoiles! – mal nos viu entrar em estúdio, o homem que julguei e bem, ser o produtor,
veio de imediato ter connosco, recebendo-nos e cumprimentando-nos
amigavelmente
- Bonjour! – saudámos
todos, praticamente em simultâneo
- Bonjour! Vous avez
afait un bon voyage? – inquiriu numa extrema simpatia e boa educação que nos
deixou à-vontade desde o primeiro instante
- Oui… C'était bien,
merci. – foi Sara que respondeu, acompanhada também pela minha concordância
gestual e de Francisco, composta por um sinal descomplexo das nossas cabeças e
sorrisos
- Toujours bien… Ne
perdons plus de temps et nous allons commencer, nous avons beaucoup de travail
devante! – ele olhou cada um de nós, e num gesto desprendido sacudiu as mãos no
ar, para nos dar a indicação de que dois dias de trabalho aguardavam por nós
- Allez! - num trejeito
de comicidade, Francisco mostrou-se mais do que disposto e entusiasmado para
começar logo nos dessem indicações para tal, fazendo-nos rir
- Vous venez avec moi. – pediu
o produtor para que o seguíssemos, com a intenção de nos mostrar as
instalações, recordar de cada passo que iria ser dado e de como tudo iria
funcionar e ser feito naquela sessão
- Isto vai ser divertido!
– murmurou Sara junto do meu ouvido, enquanto caminhávamos na direcção do
guarda-roupa
- Também tenho a
impressão que sim… - devolvi no mesmo sussurro um sorriso aprazível que
adivinhava claramente o bom clima que iria engrumar as horas seguintes,
reunindo todos os ingredientes que eram necessários: trabalho e alegria, com
amigos e colegas que prometiam divertimento e uma dose de boa disposição para
fazer daquele primeiro dia, um dia bem passado e quiçá promissor a ser recordado
mais tarde
E foi divertido, de
facto, entre brincadeiras e momentos de mais seriedade e profissionalismo,
passámos horas e horas no estúdio entre testes de imagem, uma série de vestir,
despir, e voltar a vestir diferentes roupas, e inúmeras fotografias que eram só
uma pequena parte daquelas que estavam esperadas serem tiradas.
A verdade é que me senti
bem durante a maior parte do dia, mas foi no final da manhã, um pouco antes de
fazermos uma pausa para o almoço, que a sensação de desconforto e mal-estar
regressou em mim, não permitindo que eu continuasse a fotografar por muito mais
tempo.
- Estás bem, Joana? –
depois dos rapazes, foi a minha vez e a de Sara de fotografar em conjunto,
tendo sido num desses momentos que ela me à notado diferente, penso eu, por
provavelmente me ter mostrado desconcentrada e apática quando senti o sangue
fugir-me das faces para descolorir o meu rosto com uma palidez adoentada –
Joana?
- Sim, estou… Está tudo
bem. – tranquilizei-a o melhor que consegui, aquando fazia um esforço acrescido
para continuar em pé, quando os meus sentidos começaram a trair-me fazendo a
minha cabeça andar ligeiramente à roda somente três segundos
- Tout va bien? –
perguntou também o fotografo ao notar em mim uma reacção diferente em relação à que estava a ter apenas há alguns momentos atrás, mais descontraída e bem
disposta diante da câmara
- Oui, oui… Nous pouvons
continuer. – aprecei-me a desmentir, e desvalorizei a minha condição
francamente mais debilitada e propícia a ser rompida, achando que esta iria
passar rapidamente… o que infelizmente para mim não chegou a acontecer
Lado a lado, eu e Sara
colocámo-nos em novas poses e a máquina voltou a disparar sobre nós, mas sem
saber porque, os meus olhos ficaram facilmente incomodados pelo flash que
incidiu, deixando-me novamente zonza.
- Parece que ela não 'tá
se sentindo muito bem… - ouvi Francisco comentar com Pedro, quando os dois se
encontravam ao lado um do outro, a assistir junto do fotografo
- Pouvons-nous nous
arrêter un instant? – apesar do ar condicionado estar ligado, senti um onda de
calor enorme invadir-me, e ainda para mais com um casaco vestido no corpo, não
estava a aguentar mais estar ali
- Bien sûr… Besoin de
quelque chose?
- Non, merci, juste aller
là-bas deux minutes… - agradeci educadamente enquanto despia o casaco e me
preparava para sair - Excusez-moi.
- Queres que eu vá
contigo? – a querida Sara, evidentemente consternada de preocupação, prestou-se
a auxiliar-me apoio no mesmo segundo, mas preferi ficar os dois minutos de
pausa que havia solicitado, sozinha
- Não é preciso, obrigada…
Eu fico bem. – pela veemência do meu estado, fui obrigada o forçar um sorriso
tranquilizante que foi unicamente dirigido aos olhos dela
- Il est préférable d'y
aller avec quelqu'un qu'elle… Peut besoin de quelque chose. – sugeriu o
produtor, vendo que eu não me encontrava bem e que poderia vir a precisar da
assistência de alguém
- Je vais voir ce qui
passe… - enquanto já caminhava para fora do estudo rumo ao exterior, ainda
consegui aperceber-me da interjeição de Pedro que acabou por vir atrás de mim
logo em seguida – Joana, espera… -
pediu-me, dando uma corridinha leve de maneira a conseguir alcançar-me e chegar
junto a mim – O que é que se passa?
- Não se passa nada,
Pedro… Vou só à rua apanhar um pouco de ar. – argumentei, derradeira a
esconder-lhe as evidências que no entanto estavam bem aos seus olhos, e quando
enxerguei as portadas duplas, pressionei o puxador e enveredei finalmente para
o exterior
- Joana, o que é que
aconteceu ali? – transpondo também ele a porta de acesso directo à rua, Pedro
procurou ali por uma explicação coerente da minha parte, que o pusesse a par de
tudo o que estava a acontecer comigo – Tu não estás bem…
- Estou… É claro que
estou bem! Estava apenas cheia de calor, ali, só isso…
- Cheia de calor? Mas
está tão fresco lá dentro! – a contestação no seu rosto foi evidente, levando-o
a aproximar-se a mim e olhar-me profundamente nos olhos – Tu não te sentes bem,
pois não? Estás doente? Dói-te alguma coisa?
- Não, Pedro, não me dói
nada… Já disse que estou bem! – argui a meu favor, mentindo-lhe descaradamente
quando ele só estava preocupado comigo e a tentar perceber o que me fazia ter
aquele comportamento que não era nada meu
- Joana, não mintas para
mim nem me escondas nada… Sabes que não tens necessidade nenhuma disso. Se se
está a passar alguma coisa contigo, eu quero saber o que é!
- Eu não te estou a
esconder nada… - apesar de lhe estar a omitir a verdade, não queria
alarmá-lo, só isso, o mal-estar que estava a sentir era coisa passageira,
mais tarde ou mais cedo iria passar e não seria preciso dramatizar por nada
daquilo
- Será que não estás
mesmo? – a voz dele moderou-se piedosamente e o seu olhar condescendente tocou
o meu, aquando a sua mão tomou a liberdade de se guiar no ar e abordar o meu
rosto – Estás super quente…
- Um pouco… - concordei
para senti-lo verificar depois a minha testa, provocando-me uma sensação
aconchegante pela frescura da palma da sua mão amainar o calor da minha pele
- Não sei dizer se estás
com febre… Mas que estás mesmo quente, lá isso estás!
- Oh, isso é porque sou
uma brasa… - tentei levar a situação para a brincadeira de forma a torná-la
menos pesada, retirando-lhe a carga formal, mas Pedro demarcou o momento com
seriedade
- Isto é sério, Joana…
- Isto passa.
- Pois não sei, não acho
que seja normal, e tu tens que concordar comigo… São muitos dias seguidos que
andas assim, tens que ir ver o que tens.
- Que paranóico, Pedro,
eu não tenho nada… Devo estar a chocar alguma gripe ou assim, nada demais.
- Não estejas sempre a
arranjar desculpas! Tens de aprender a preocupar-te mais contigo, a dar-te mais
valor... Vais ver um médico mal cheguemos a Portugal, e não há discussão
possível sobre este assunto! – Pedro colocou num rompante as suas condições e
exigências sobre a mesa, as quais eu não lhe podia negar… mostrava-me calma
perante a situação, mas a verdade é que também a mim me começava a preocupar e
sabia que se continuasse a sentir-me assim, teria de a resolver de alguma
maneira
- Emprestas-me o teu
telemóvel?
- Queres o meu
telemóvel?!
- Preciso de fazer uma
chamada e não tenho aqui o meu… - ele não fez mais perguntas e retirou o
pequeno aparelho do bolso das jeans, entregando-mo
- Ficas bem? Precisas que
te vá buscar alguma coisa? Um copo de água ou assim…
- Não, obrigada, eu estou
bem assim… - recusei, apesar de ainda sentir uma ligeira tontura, e comecei a
marcar o número da única pessoa com quem queria e precisava de falar naquele
momento: Adriana
- Então eu vou voltar
para dentro… Não demores muito. – como um gesto habitual que já esperava
ver-lhe, ele deu-me um beijo cuidadoso e protector na testa mesmo antes de
regressar aos interiores do estúdio
Sorri-lhe e continuei a
marcar o número que já tinha memorizado, no teclado qwerty. Quando o vi voltar
para dentro, coloquei o telemóvel junto do ouvido e deixei chamar, à espera que
ela não tardasse a atender.
- Estou sim? – Adriana
atendeu quando eu já pensava que a chamada ia parar ao voicemail, e usou-se de
um palavreado formal pois não conhecia o número de onde eu lhe estava a ligar
- Adriana? – pronunciei
em meia voz, encostando-me a um muro que
estava por perto e aí conseguir falar, para tentar controlar as ligeiras
tonturas que iam e vinham sem avisar
- Sim, a própria… Quem
fala?
- É a Joana…
- Joana? – não me
distinguiu no primeiro segundo, mas não tardou em conseguir fazê-lo – Ah…
Joana! Oh amor desculpa, não tenho este número e nem te estava a reconhecer
pela voz…
- Não tem mal, princesa,
estou a falar pelo telefone do Pedro… - expliquei sucintamente, antes de passar
ao ponto fulcral da questão que me levou a fazer-lhe aquele telefonema não
agendado – E estou a ligar-te em má altura ou…?
- Não, não, nada disso…
Estou a entrar no carro, vou agora sair da faculdade. – ela deixou-me à vontade
para falar e eu iria fazê-lo, havia uma coisa que tinha de lhe pedir – Mas
ainda bem que ligaste… Fiquei preocupada
contigo esta manhã…
- Eu mandei mensagem,
amor…
- E eu li, mas mesmo
assim… Tiveste que desligar de repente e nem soube o que aconteceu. – não pude
deixar de sorrir pela sua maneira carinhosa e dedica de ser em relação a mim,
um calorzinho de contentamento esquentou o meu peito por ter por perto uma
grande amiga que a vida me tinha generosamente oferecido – Aconteceu alguma
coisa?
- Oh, um imprevistozito,
uma situação com que não estava a contar mas nada demais.
- Que situação? – uma
lividez de curiosidade assaltou Adriana com um fecha certeira, e eu sabia que
enquanto não a esclarecesse devidamente, ela não iria descansar
- Foi o meu período…
Passei mal a noite com dores mas nem me apercebi do que estava a acontecer, e
esta manhã acordei com a cama manchada… Ainda por cima estava atrasado, algo
que é raríssimo de me acontecer…
- É raríssimo mas pode
acontecer… Deve ter acontecido alguma coisa que o atrasou, talvez. Esta semana
tens andado numa agitação tremenda… Deve ter sido o stress, a ansiedade…
- Sim, pode ter sido
isso, mas ainda assim não é normal atrasar-me desta maneira… - expus calmamente,
recorrendo a factos claros e verdadeiros – Foram quase três dias! Eu tomo a
pílula e a minha menstruação é super regular, e desta vez não foi…
- Pronto, não foi desta
vez, mas agora também já não tens mais de te preocupar com isso, não é? – sim,
ela tinha razão e eu tinha que concordar, agora já não valia a pena
preocupar-me, afinal meu período menstrual tinha voltado, o que descartava
qualquer macaquinho na cabeça que viesse a ter quanto a possíveis complicações de
saúde
- Sim, tens razão, mas
também não foi para falar sobre isto que eu te liguei… Precisava de te pedir um
grande favor…
- Um favor? Se estiver ao
meu alcance poder ajudar…
- Neste caso acho que
podes… - os meus lábios flectiram-se brevemente para o lado, aprisionando a pequena
dúvida que ela mesmo me iria elucidar – Logo que tivesses um tempinho
disponível, gostava que fosses ao centro de saúde e pedisses umas análises para
mim…
- Queres que te marque
umas análises gerais?
- Sim, por favor, e se
der era óptimo que fossem o mais rapidamente possível… Eu queria evitar isso,
mas parece que vai ter mesmo de ser.
- Mas então, passasse
alguma coisa contigo? – uma vez mais naquele dia, o desassossego da
minha doce Adriana recaiu sobre mim
- Isso é o que eu quero
saber… Tenho andado estranha nos últimos dias. São dores de cabeça atrás de
dores de cabeça, dores abdominais, no peito e algumas tonturas… O Pedro insiste
que procure um médico, e talvez o melhor mesmo seja fazer uns exames para saber
o tenho.
- E eu concordo com o
Pedro. Mas porque é que não me disseste isso mais cedo, amor? E ia contigo a
qualquer lado…
- Oh, pensei que fosse
uma coisa passageira e não quis dar muita importância. – os meus ombros
encolheram-se num jeito comprimido e despreocupado, enquanto ao mesmo tempo o
meu olhar se prendeu na figura de duas crianças que caminhavam alegremente no
passeio junto ao qual eu me encontrava
- Tens que dar sempre a
máxima importância à tua saúde, Joana… Ela tem de ser o teu factor principal! –
alertou-me ela perspicazmente, fazendo aludir à nossa conversa, uma reprimenda
não culposa mas prevenida, que eu tinha de interiorizar
- Eu sei, e é por isso
que quero saber o que se passa e fazer as análises. – não havia volta a dar,
teria mesmo de consultar um médico para poder tratar dos sintomas que me
acompanhavam ultimamente, sabendo que Adriana era paciente no mesmo o mesmo
centro de saúde que eu, o que tornava a tarefa mais fácil para ela – Dá-me
alguns minutos e já te envio as cópias dos meus documentos…
- Está bem. Faço um pequeno
desvio antes de ir para casa e passo lá pelo centro de saúde a tratar disso,
não te preocupes!
- Muito obrigada, a sério!
Eu podia passar por lá, mas só como na segunda posso lá ir, e quanto mais
rápido tratar disto melhor, agradeço-te a ajuda!
- Oh, não sejas tonta, os
amigos serem exactamente para isso, não é? Além disso não me custa nada!
- Eu fico-te agradecida
na mesma. – um sorriso sincero apareceu espontaneamente na tona dos meus
lábios, e numa lembrança reforçada ao pensamento, tomei a noção que tinha
deixado todos há minha espera, e por isso tinha que voltar rapidamente e dar
sem mais demoras nem interrupções, continuação ao trabalho – Mas bem, amor, eu
tenho que desligar e voltar para dentro que estou no meio da sessão…
- Claro, anda vai lá…
Mais tarde eu ligo-te e logo te digo como é que a situação das análises ficou.
- Sim, está bem… E mais
uma vez obrigada. Um beijinho grande!
- Outro também para ti,
Joaninha… E as melhoras. Até logo! – ela despediu-se amavelmente como em todas
as vezes, e eu fi-lo da mesma forma
- Obrigada, princesa, até
logo. – agradeci pela última vez, e com o coração mais leve desliguei a chamada
que fora forçada a terminar mais depressa do que queríamos
Segurei o telemóvel na
minha mão e tomei chefia até às portadas de vidro que revestiam os interiores
do estúdio nos subúrbios de Paris.
Não podia dizer que me
sentia melhor, porque não sentia… O calor excessivo ainda viandava pelo meu
corpo, a minha cabeça era por vezes vitimada por pequenas tonturas, e as pernas
tendiam a falhar-me. Fazer uma força adicionada para empurrar a porta e dar
somente os primeiros passos no piso azulejado, foi a última coisa que me lembro
de fazer conscientemente, para depois num ápice que não esteve em meu poder
controlar, numa tontura perdurada, perdi todas as forças que me sustentavam
deixando fugir o telemóvel e este cair ao chão. Senti uma dor forte e inabalada
no peito obrigando-me a abrandar o passo, senti um arrepio vaguear a minha
espinha e dissipar-se nas extremidades, senti as minhas pernas balancearam como
se já não tivessem a vontade própria de me suster… Por fim senti uma
dificuldade imensurável em continuar a manter os olhos abertos e depois… Depois
deixei de sentir.
Boa tarde, queridas leitoras! :)
Peço imensa desculpa pela demora, mas entretanto surgiram uns problemas
pessoais que me deixaram sem cabeça nem disposição para escrever,
daí não vos ter deixado com notícias mais cedo. :/
Às leitoras que me deixam incentivos, o meu muito obrigada, o vosso apoio
tem sido fundamental nesta fase, e agradeço também a todas que me acompanham, lêem e gostam da história que vos escrevo.
Posto isto vou então deixar-vos finalmente com o novo capítulo,
espero que gostem e não se esqueçam de comentar.
Um beijinho,
Joana
P.S.: Para quem quiser falar comigo, recordo que o e-mail continua disponível na lateral do blogue, ou simplesmente estejam à vontade para me fazerem as vossas perguntas por comentário que eu irei responder. :)